Em meu último artigo sobre a guerra, desenvolvi a hipótese de que os países do leste europeu poderiam ter o mesmo destino da Ucrânia se não tivessem se aliado à OTAN. A evidência, para mim, foi justamente o fato de esses países QUEREREM se aliar à OTAN, mesmo conhecendo o risco de serem mal-entendidos pela Rússia. Supus que ninguém conhece melhor a “alma russa” do que os seus vizinhos.
Pois bem, fui inundado de artigos de respeitados especialistas afirmando o contrário (como se eu já não tivesse lido todos eles): que a Rússia estava quieta no seu canto, e foi provocada pela OTAN. Hoje, o Estadão traz uma entrevista com um especialista em Rússia, que nao não é um zé mané palpiteiro como eu, e que tem o mesmo ponto de vista do meu artigo.
Significa que ele está certo? Não. Significa apenas que essa é uma discussão em aberto. A história é uma ciência em que o contrafactual é impossível. Portanto, quem afirma com certeza que “teria acontecido isso se aquilo”, ou “não teria acontecido isso se não aquilo” está apenas chutando, por mais especialista que seja.
Historiador é como economista: é muito bom para explicar o passado, mas péssimo para desenhar o futuro. Existe um viés bem conhecido em investimentos chamado “hindsight”. Esse viés nos leva a acreditar que eventos que ocorreram eram óbvios, dava para prever com relativa facilidade. Como sempre vai haver um historiador ou um economista que “previu” aquele cenário (tem sempre um monte de gente falando um monte de coisa), o que foi dito é recuperado e toma ares de profecia, com a ilusão da previsibilidade se estabelecendo. Falta, obviamente, o contrafactual: o que teria acontecido se as premissas da previsão não tivessem se concretizado.
Portanto, é preciso tomar cuidado ao concluir rapidamente sobre a direção da causalidade em eventos históricos. É possível que Putin estivesse agora em seu canto se a OTAN limitasse a sua presença às fronteiras da Alemanha? Sim. Assim como é possível que estivesse agora bombardeando Varsóvia, como está fazendo em Kiev. Tudo é possível. E, como tudo é possível, os países do leste europeu não quiseram jogar com a sorte. Não acho uma atitude condenável.