Esperando o Lula pragmático

A Folha está publicando, durante esta semana, artigos dos assessores econômicos dos principais candidatos à presidência nas próximas eleições. Nelson Marconi, Henrique Meirelles e Affonso Celso Pastore já haviam sido anunciados pelos respectivos candidatos. A surpresa ficou por conta do nome escolhido pelo PT para representar Lula: o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, que ainda não foi apontado oficialmente como assessor econômico do candidato do PT.

Notinha de hoje da coluna do Estadão faz chegar a informação de que o nome de Guido Mantega “pegou mal” junto a empresários e o mercado, pois teria sido ele um dos artificies da derrocada do desgoverno Dilma.

O “entorno do presidente” (o que quer que isso signifique) já correu para dizer que “ainda não há definição de quem será o porta-voz econômico de Lula”. Compreensível. Afinal, Mantega, assim como Dilma, é um nome tóxico.

O ex-presidiário protagoniza um fenômeno realmente curioso. Enquanto qualquer candidato normal precisa suar a camisa para provar que vai cumprir suas promessas de campanha, os “empresários e o mercado” querem que Lula prove que NÃO vai cumprir suas promessas na área econômica.

Lula já falou várias vezes, para quem quis ouvir, que vai acabar com o teto de gastos, não vai privatizar nada, vai usar a máquina do governo (leia-se BNDES e as estatais) para impulsionar o crescimento do país e vai estimular o consumo porque é isso que faz “girar a roda da economia”. Não coincidentemente, a mesma fórmula que terminou no desastre dos anos Dilma. É este modelo que os “empresários e o mercado”, por algum processo incompreensível de self denial, se recusam a acreditar que será implementado.

Os “empresários e o mercado” sonham com o Lula pragmático que assumiu em 2003, com uma bela equipe econômica liderada por um Antônio Palocci de ideias ortodoxas. Alguns têm a ilusão de que aquele governo acabou quando Dilma assumiu em 2010, colocando a perder o legado de Lula. Outros colocam o “caso Francenildo” como o ponto de virada heterodoxo do governo do PT, pois Lula foi obrigado a trocar Palocci por Mantega, em março de 2006. Mas, na verdade, o início do verdadeiro governo Lula foi marcado pelo dia do “gasto é vida”.

Em novembro de 2005, Palocci começou a discutir no governo um plano de ajuste fiscal que reduziria a dívida pública de maneira relevante, o que levaria a uma queda estrutural das taxas de juros e permitiria ao país mudar de patamar. Dilma, à época ministra da Casa Civil, classificou o plano como “rudimentar” e deu o brado que marcaria os governos do PT dali em diante: “gasto é vida!”

A entrada de Guido Mantega no governo 5 meses depois foi somente o corolário natural dessa virada. Economias como a brasileira são como grandes transatlânticos: para mudar o rumo é preciso virar o leme muitos quilômetros antes. O debacle dos anos Dilma começou com a virada de leme que ela própria havia protagonizado vários anos antes. E, o mais importante, COM O AVAL DE LULA.

Essas brigas palacianas têm sempre um arbitrador: o presidente. Ainda mais um presidente que tem gosto pelo poder, como Lula. Na briga entre Palocci e Dilma, Lula arbitrou em favor da futura presidenta. A escolha de Mantega foi somente uma consequência necessária dessa decisão.

E cá estamos em 2022, com o “entorno do presidente” jurando que o assessor econômico de Lula ainda não foi definido e os “empresários e o mercado” fazendo força para acreditar no Lula pragmático. Cada um acredita no que quer. Mantega é só um detalhe, o que importa é o que Lula pensa. E ele já deixou claro o que pensa, tanto em suas falas recentes como em seu governo no passado.

Claro, podemos ser surpreendidos com a escolha de um nome ortodoxo como o de Marcos Lisboa, best friend de Fernando Haddad e de inequívocas credenciais ortodoxas. Neste caso, Lisboa faria o papel de Levy no segundo governo Dilma ou de Guedes no governo Bolsonaro. Caberá aos “empresários e ao mercado” decidirem se topam cair novamente no conto do “Posto Ipiranga”.

Teste psicotécnico

1. Alberto Fernandez foi eleito presidente da Argentina, sucedendo a um presidente de direita.

2. Biden foi eleito presidente dos EUA, sucedendo a um presidente de direita.

3. Pedro Castillo foi eleito presidente do Peru, sucedendo a um presidente de direita.

4. Gabriel Boric foi eleito presidente do Chile, sucedendo a um presidente de direita.

5. xxxx será eleito presidente do Brasil, sucedendo a um presidente de direita.

A arte de ser feliz está em esperar o melhor e se preparar para o pior.

Agora sabemos porquê

Nas eleições municipais de 2008, Geraldo Alckmin decidiu concorrer pelo PSDB para a prefeitura de São Paulo. Havia apenas um problema: não tinha como o ex-governador se posicionar naquela eleição. Em qualquer eleição, ou o candidato é situação ou é oposição. O candidato da situação era Gilberto Kassab, vice do ex-prefeito José Serra, do mesmo PSDB de Alckmin. Portanto, não dava para ser oposição. Esse posto foi ocupado pela então candidata do PT, Marta Suplicy. Sem um discurso consistente, Geraldo Alckmin chegou em um vexatório terceiro lugar naquela eleição.

Esse foi o segundo grande erro político de Alckmin. O primeiro havia sido aquela jaqueta com símbolos das estatais, que fez com que tivesse menos votos no 2o turno do que no 1o da eleição presidencial de 2006. Um feito provavelmente inédito em escala global.

Depois daquilo, Geraldo Alckmin logrou vencer as eleições para governador de SP em 2010 e 2014. Seu grande capital eleitoral está no interior do estado, onde sempre obteve votos suficientes para compensar performances sofríveis na capital. Apenas como referência, o interior do estado de SP tem mais ou menos 55% da população do estado, ficando os 39 municípios da região metropolitana com 45%.

Chegamos, então, em 2022. Depois do fiasco da eleição presidencial de 2018, quando o PSDB teve a sua pior votação desde a redemocratização, Alckmin tinha duas escolhas: sair para senador pelo PSDB, ou sair do PSDB para concorrer a governador por outra legenda. Mas então, o inesperado acontece: o garanhão de Garanhuns dá uma piscada para a donzela moça abandonada no baile. A racionalidade política vai para o espaço, e o ex-governador joga pela janela uma vaga certa no senado ou uma candidatura competitiva para o governo de SP, para se jogar nos braços daquele homem com coxas torneadas.

Notem que, mesmo que o namoro não dê em nada, Alckmin já carbonizou as suas chances para as outras possíveis candidaturas. Qual será a percepção do seu eleitorado do interior de SP em relação a essa aproximação? O PT foi dizimado no interior do estado nas eleições de 2018, e a única cidade importante que elegeu um prefeito petista em 2020 foi Araraquara. O interior de SP talvez seja a região mais anti-petista do Brasil. Com essa “jogada de mestre”, a terceira em sua longa carreira política, Alckmin simplesmente jogou pela janela seu único capital político.

Quando Doria escanteou Alckmin dentro do PSDB, muitos o chamaram de traíra. Observando esse movimento do ex-governador, concluímos que, na verdade, Doria agiu pela sobrevivência política, sua e do partido. Ninguém faz o que Doria fez sozinho. Ele foi só a cara do movimento que deve ter ganhado força dentro do partido desde 2018. Era preciso retirar Geraldo Alckmin do palco. Agora sabemos porquê.

Talvez seja melhor rever seus conceitos

Entrevista com Marcello Brito, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag). Principais pontos:

– A Abag patrocinou um manifesto condenando as manifestações de 7 de setembro. O pedido de desculpas do presidente após o evento demonstra que estávamos corretos.

– Nunca houve unidade política no agronegócio, portanto não houve racha. Essa unidade é criação da imprensa.

– Há muitos agronegócios no Brasil, não é só plantador de soja e criador de boi.

– Bolsonaro hoje deve ter apoio de 30% dos empresários de agronegócios, mais ou menos o apoio que tem na sociedade.

– Alguns dirigentes de associações de agronegócios que apoiam Bolsonaro às vezes o fazem também por serem políticos e terem interesses partidários.

– A política externa do governo Bolsonaro foi um desastre para os exportadores ao demonizar a China. Perdemos a confiança de nosso principal parceiro. O antigo chanceler era amador, melhorou muito com o novo.

– Foi salutar a não ida de Bolsonaro para a Cop26, pois o presidente não une, divide. A equipe brasileira que está na conferência é de altíssimo nível e vai dar conta do recado.

– Um candidato de 3a via tem chance, não precisa ter pressa em encontrá-lo. (Essa foi a manchete escolhida pelo jornal. Na minha opinião, a coisa mais desinteressante que ele disse)

Minha leitura: a visão do presidente da Abag representa uma parcela do PIB brasileiro. Se essa parcela é relevante ou não, cada um vai ter a sua opinião. O que não adianta é criticar essa visão sem entender como a ela se chegou. Escutar é o primeiro passo para corrigir rumos, se é que há interesse em corrigi-los.

Posso adiantar que uma parte do mercado financeiro compartilha dessa visão dentro do seu próprio contexto. Se Bolsonaro pensa que o PIB brasileiro vai com ele “no matter what” e basta conquistar os votos dos miseráveis com o novo bolsa família, talvez seja melhor rever os seus conceitos.

Boa sorte, magistrados!

O TSE determinou que “disparo em massa de mensagens contendo desinformação e inverdades” constitui abuso de poder econômico. De onde se conclui que 1) disparo de mensagens contendo informação e verdades, ou 2) a disseminação de desinformação e inverdades por outros meios que não o disparo de mensagens em massa, estão liberados.

Essa diretriz do TSE vem em reposta à “denúncia” feita pela Folha na reta final da campanha de 2018, de que empresários estariam por trás do disparo de mensagens de WhatsApp em favor do então candidato Bolsonaro. A decisão do TSE é um monumento ao contorcionismo, ao afirmar que “isso aí” que vocês fizeram não pode, mas não dá pra afirmar que “isso aí” tenha tido, de fato, influência nas eleições. Tanto foi assim, que os partidos agora estão atrás do TSE para entender o que pode e o que não pode fazer.

É natural que os partidos estejam perdidos. Abuso de poder econômico sempre foi o coronel comprar votos com lanches, transporte de eleitores ou ameaça de punição. Propaganda nunca foi abuso de poder. O TSE fez uma nova tese, em que certos tipos de propaganda configuram abuso de poder econômico.

Por que mesmo disparo de mensagens no WhatsApp configuraria abuso? Eu canso de receber mensagens de corretores de imóveis via WhatsApp. Recebo também mensagens de telemarketing e malas-diretas em casa. Por fim, ao abrir o jornal ou ligar o rádio e a TV, ouço e vejo anúncios que foram “disparados em massa”. Afinal, propaganda é, por definição, comunicação em massa. Por que um poderia e o outro não? É o que os partidos querem saber.

Para piorar a situação, o TSE entra no pantanoso campo do conteúdo. O disparo em massa não pode conter “desinformação e inverdades”. Quer dizer, de agora em diante, o TSE vai se tornar uma agência de “fact checking”, julgando se o que é dito sobre os candidatos é verdade ou mentira. Por exemplo, em 2014, teriam que julgar se a propaganda do PT, acusando a então candidata Marina Silva de querer tirar a comida da mesa do brasileiro ao defender a independência do BC, era uma desinformação. Boa sorte, magistrados!

Tudo isso reflete apenas o inconformismo pelo fato de Bolsonaro ter vencido as eleições de 2018 gastando uma fração do dinheiro usado pelos seus adversários no pleito. As “armas” eram as mesmas para todos, mas o que se viu foi que Bolsonaro, além das armas, tinha uma militância não paga que fez a diferença. O resto é teoria da conspiração.

A única mensagem inequívoca do julgamento do TSE, e que não tem nada a ver com “disparos em massa”, foi a cassação do deputado Fernando Fransischini por divulgação de vídeo denunciando uma suposta fraude da urna eletrônica. Fraude foi o vídeo em si, o que foi punido com a cassação. Essa foi a única parte do julgamento que prestou para alguma coisa.

A esquerda não está rachada

“A esquerda está rachada”.

Não, meus amigos. A esquerda não está rachada. A esquerda está bem unida em torno de Lula. Até o PSOL, que sempre tem candidato à presidência, deve abrir mão de candidatura própria para apoiar o ex-presidiário.

Ciro, com o apoio inestimável do mago das eleições João Santana, sabe que a única via possível para chegar ao 2o turno é a via do anti-petismo. Até o momento, esse lugar era ocupado soberanamente por Bolsonaro. O pessoal precisa pegar senha para entrar na fila para bater em Bolsonaro. Mas, para bater em Lula, tratado como um estadista por todos os candidatos da “terceira via”, Bolsonaro estava sozinho. Estava.

A bem da verdade, esse posicionamento já vinha sendo construído desde o “Lula está preso, babaca!” de Cid Gomes na eleição de 2018. Foi reforçado pela “fuga para Paris” de Ciro no 2o turno e, desde então, vem num crescendo. Mas o que antes parecia ser uma vingança pessoal, agora toma ares de estratégia eleitoral.

Ciro não está batendo em Lula para tomar os votos dos petistas. Estes estão fechados com Lula. Ciro está batendo em Lula para tomar o voto dos anti-petistas, que hoje estão com Bolsonaro em um eventual 2o turno. Existe uma massa de eleitores arrependidos de Bolsonaro, mas que não deixaram de ser antipetistas. É essa massa que está sendo desprezada por todos os outros candidatos e que Ciro quer conquistar.

Last but not least, bastou Lula abrir a boca pra tropeçar na língua, chamando todos os que pegaram Covid de lesados do cérebro. Ciro teve a virtude de tirar Lula da toca, e seus pontos fracos começam a aparecer. Os outros candidatos da “terceira via” vão esperar quanto tempo para fazer o mesmo?

Acredita quem quiser

Mailson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda e respeitado consultor do mercado financeiro, bem longe de ser um petista comunista, aposta que o mercado vai preferir Lula a Bolsonaro, caso sejam essas as duas opções que restarem em 2022.

Lembro das eleições de 2006. Lula vinha de um primeiro mandato que, do ponto de vista econômico, havia sido um sucesso. Apesar de marcado pelo mensalão, o primeiro termo de Lula é sempre lembrado pelas suas medidas ortodoxas e pelo timaço de craques na Fazenda e no BC. Claro, teve a ajuda da China, mas o governo petista se ajudou, fazendo a coisa certa. Foi apenas no segundo mandato que o governo Lula mostrou a sua verdadeira cara, inchando o Estado, intervindo cada vez mais na atividade econômica e cevando o desastre que o governo Dilma iria colher.

Pois bem. Mesmo tendo sido um sucesso do ponto de vista econômico, a ida de Alckmin para o 2o turno, em uma eleição que, tudo indicava, seria vencida por Lula no 1o turno, fez com que o mercado, no dizer de um consultor político, ficasse alegre como “pinto no lixo”. Entre o Lula ortodoxo e Geraldo Alckmin, não havia dúvida sobre quem o mercado preferia.

Passaram-se 15 anos desde então. O mercado viu o 2o mandato de Lula, o Petrolão, as lambanças no BNDES e na Petrobras e, sobretudo, o desastre do governo Dilma, onde a agenda econômica do PT foi aplicada em sua plenitude. O mercado aprendeu nesses anos todos.

Pode ser que o mercado se deixe enganar pelos “sinais” enviados por Lula, e dê um voto de confiança no início de seu hipotético terceiro mandato. Além disso, o governo Bolsonaro pode estar sendo ruim para a atividade econômica, pela instabilidade institucional constante. Mas daí a tirar que o mercado preferirá, durante as eleições, um novo mandato petista, vai uma distância cósmica. Neste ponto, discordo de Mailson.

Para a economia, nada pode ser pior do que o programa de governo do PT. Cabe ao mercado acreditar que Lula jogará o programa do seu próprio partido no lixo, como fez provisoriamente no seu primeiro mandato. Acredita quem quiser.

O motivo da irrelevância do PSDB

Semana passada, comentei aqui entrevista de Sérgio Fausto, diretor executivo da fundação FHC e uma das principais vozes da intelligentsia pe-esse-de-beiana. Em uma entrevista, o entrevistado pode ser pego de surpresa e não conseguir expressar exatamente o que queria dizer. Hoje, Sérgio Fausto escreve um artigo, o que permite entender de maneira mais fidedigna o seu pensamento. E a coisa, acreditem, piorou.

Depois de discorrer sobre o caráter democrático do PT, apesar de seus pecadilhos, como apoiar ditaduras como as de Cuba e Venezuela, e de colocar as diferenças entre PT e PSDB no campo das políticas econômicas, Fausto chega ao núcleo de seu artigo, destacado abaixo. Não consegui encontrar, até o momento, melhor demonstração, a um só tempo, de porque o PSDB se tornou um partido irrelevante no nível nacional e de porque Bolsonaro foi eleito presidente da República.

O articulista defende uma oposição ao PT, mas sem um “antipetismo furibundo e preconceituoso”. Ou seja, uma oposição do jeito que o PT gosta, de modo que o partido de Lula possa fazer, sozinho, uma oposição furibunda e preconceituosa a tudo o que se opõe ao partido. O trecho mais inacreditável do artigo é a atribuição a uma suposta “polarização autodestrutiva” entre PT e PSDB o fato de Bolsonaro ter chegado ao poder. É justo o oposto: o fato de o PSDB não ter feito polarização durante 15 anos fez com que os eleitores caíssem no colo do primeiro antipetista “furibundo e preconceituoso” que apareceu na praça. Bolsonaro é, antes de mais nada, cria desse PSDB civilizado que Sérgio Fausto tão bem representa.

Não é de se admirar, portanto, que, partindo de um diagnóstico falho, a tática eleitoral sugerida seja mais um furo n’água: Fausto sugere que o candidato do PSDB ataque Bolsonaro para chegar ao 2o turno, como se os anti-Bolsonaro já não tivessem o seu candidato de coração, Lula. Para deslocar Bolsonaro, é preciso convencer o eleitorado antipetista de que não se está votando em uma quinta-coluna do PT. O discurso de Sérgio Fausto mostra que o PSDB não é este partido.

É sintomático que, em um artigo de 5.000 caracteres, o articulista não tenha encontrado espaço para condenar o PT pela roubalheira da Petrobras. O máximo foi uma menção à “estigmatização da Lava-Jato” pelo PT, mas em um contexto de condenação do PT como um partido populista. O grosso do antagonismo foi descrito no campo econômico, o que, convenhamos, está longe de levantar as massas.

Vivemos em um país polarizado por causa do PT. Bolsonaro foi apenas a reação natural em um vácuo que se criou pela inapetência do PSDB. O final do artigo demonstra, com excelência, este ponto: “A terceira via […] perdendo ou ganhando, é importante que tenha força política para participar da construção do futuro do país”. Perdendo ou ganhando. É isso. Ao PT não interessa nada que não seja a vitória, enquanto o PSDB quer “participar da construção do futuro”. Não consigo pensar em nada melhor para explicar porque o PSDB se tornou um partido nanico nas eleições presidenciais.

Ideia genial

Eliane Catanhêde teve uma ideia genial: Lula abriria mão da cabeça de chapa e, do posto de candidato a vice-presidente da República, costuraria um grande entendimento pacificador nacional.

Bem, não sei direito por onde começar. São vários erros diversos e combinados em uma única “ideia”. Mas vamos tentar.

O primeiro erro é achar que Lula e o PT vão abrir mão da cabeça-de-chapa. Mesmo em situações em que o PT não tem a mínima chance eleitoral, o partido não abre mão de ter os cordões do poder em suas mãos. A composição ocorre somente com os outros partidos sendo vassalos de seu projeto de poder. Imagine em uma situação como a que se coloca, com Lula tendo efetivas chances de eleição.

O segundo erro é supor que Lula e o PT estão dispostos a “pacificar” o cenário político nacional. Como se não tivesse sido Lula a apontar a “herança maldita” de FHC e ter inventado o “nós contra eles”. Não, Lula e o PT são sectários, a única paz que lhes interessa é o da submissão.

Por fim, causa espécie que um político que esteve preso com prova provada de seus crimes, com sentença confirmada por 3 instâncias da justiça brasileira, e que só está solto com base em “provas” obtidas ilegalmente, ainda seja tratado como um contendor legítimo na arena política, e não como um pária.

Esse tipo de “raciocínio” da jornalista nos diz algo muito importante: Lula não está solto porque alguns ministros do STF resolveram assim. O STF é apenas o operador político de uma vontade da inteligentzia brasileira, que nunca engoliu o fato de que Lula é um larápio como outro qualquer, e não o herói de seus sonhos juvenis de justiça social. Nada é por acaso: Lula está de volta porque assim quiseram pessoas como Catanhêde, que sonham com um Brasil pacificado, próspero e livre de arreganhos autoritários.

São essas mesmas pessoas que não conseguem entender como uma figura como Bolsonaro conseguiu se eleger presidente.