O PT com boas intenções

José Serra escreve hoje artigo no Estadão defendendo a concessão de subsídios por parte do governo.

Mas não qualquer subsídio. Somente aqueles que “propiciam benefícios diretos e indiretos”, que “passem com critérios de mérito”, que “sejam para projetos eficientes”.

Claro, José Serra seria um governante do bem. Em seu governo não haveria subsídios para projetos que não propiciassem benefícios, que não tivessem mérito e que não fossem eficientes. Dilma Rousseff assinaria embaixo.

Duas são as desculpas para o uso de subsídios, segundo Serra.

A primeira seria a alta “concentração bancária”. Meia dúzia de bancos dominam o crédito no Brasil e praticam spreads altíssimos, inviabilizando projetos de longo prazo. Não lhe ocorre que, quando entra um banco público praticando taxas mais baixas, os bancos privados, se pudessem, também baixariam as suas taxas, para competir com o novo concorrente. Não o fazem por dois motivos: 1) a taxa praticada pelo BNDES, via de regra, não paga o risco desses projetos e 2) é muito mais confortável para os bancos comprarem títulos públicos que pagam taxas maiores que as taxas subsidiadas, títulos esses que VÃO FINANCIAR OS SUBSÍDIOS! Ou seja, os bancos ganham dinheiro na maciota financiando o déficit público criado pelos subsídios.

Dilma levou esse raciocínio ao extremo, ao obrigar os bancos públicos a baixarem os spreads na marra também para as pessoas física, esperando que os bancos privados fizessem o mesmo. Esperou sentada. Os bancos públicos ganharam market share, e agora estamos discutindo uma capitalização da Caixa para cobrir o rombo dessa política irresponsável, que acaba sempre estourando no colo do contribuinte. Mas claro, Serra faria isso da “maneira certa”. Afinal, ele é um tucano, não um brucutu petista.

A segunda desculpa são as tais “externalidades positivas” criadas por projetos de infraestrutura. Um exemplo (não usado no artigo): uma estrada beneficia não somente quem passa por ela, mas todo o seu entorno. Seria injusto então cobrar pela obra somente de quem usa diretamente a estrada. Ok. Então, ao invés de cobrar somente do usuário, vamos cobrar de todo brasileiro, inclusive do favelado que mora a milhares de quilômetros da estrada. Haveria formas mais inteligentes de focar essa cobrança naqueles que se beneficiam mais de perto com aquela obra.

Mas Serra não usa esse exemplo, que até seria razoável. No artigo, ele usa o caso dos subsídios aos caminhoneiros como uma externalidade positiva! Ou seja, fomos feitos de reféns de uma determinada categoria profissional, e o preço do resgate (subsídios de R$10 bilhões) é saudado como um bom gasto do governo! É o fim da picada!

Serra vê o Estado como indutor do crescimento econômico, aquele que vai aonde a iniciativa privada não quer ir. Não lhe ocorre que a iniciativa privada não vai porque não vale o custo Brasil. Custo Brasil que só aumenta com os subsídios. Ao invés de investir em uma agenda para diminuir o Custo Brasil e, assim, baixar a régua para atrair a iniciativa privada, Serra prefere ignorar o Custo Brasil e colocar dinheiro do contribuinte em projetos que, ao final do dia, não se pagam, justamente porque os ganhos não compensam os riscos.

José Serra é o tucano típico, aquele que vai fazer as mesmas políticas econômicas equivocadas propostas pelas esquerdas, mas “da maneira certa”. Como se o problema fossem os ingredientes e não a receita.

Esta é a faceta econômica de um problema mais abrangente dos tucanos: a população vem descobrindo que não passam de petistas com os “ingredientes certos”. Ora, metade da população, se é para escolher políticas econômicas de esquerda, prefere a esquerda original. A outra metade não quer mais essa receita, mesmo que os ingredientes venham das mais puras e bem-intencionadas origens.

Alckmin deveria começar por aí sua análise de porque perdeu patrimônio político de maneira tão rápida em seu próprio Estado.

As estratégias dos candidatos

Reportagem hoje no Estadão traça o perfil dos “irmãos Weintraub”, Arthur e Abraham, assessores de Bolsonaro há mais de um ano.

Professores universitários, os irmãos Weintraub têm larga experiência na iniciativa privada e na academia, e são especialistas em Previdência.

Mas o que me chamou a atenção foi a migração de suas preferências políticas. Em 2014 apoiaram Marina Silva, contra “o roubo epidérmico, o patrulhamento ideológico, o narcotráfico, a ameaça do totalitarismo bolivariano”.

Ora, a migração de Marina para Bolsonaro não se encaixa em uma clivagem “esquerda x direita”. Nada indica que, em 2014, Marina fosse uma alternativa melhor ao “patrulhamento ideológico” ou ao “totalitarismo bolivariano” do que Aécio. Aparentemente, tínhamos uma clivagem “establishment x anti-establishment”, que se acentuou muito nos últimos 4 anos. Somente isso justifica a migração Marina —> Bolsonaro, opostos no campo ideológico.

Se a posição dos irmãos Weintraub indicar uma tendência importante, está clara a estratégia dos candidatos para chegar ao 2o turno:

– Alckmin, estando praticamente sozinho no campo do establishment, deve investir na clivagem “esquerda x direita”, procurando tirar votos da direita que iriam para Bolsonaro. Ana Amélia se encaixa nessa tática, assim como o discurso liberal e de segurança pública.

– Bolsonaro não está sozinho no campo anti-establishment, mas está praticamente sozinho no campo “direita”. Então, deve investir sobre outros candidatos “anti-establishment”, como Marina, atraindo votos como os dos irmãos Weintraub.

– Ciro e o candidato do PT estão no campo congestionado da esquerda, onde também estão Marina e, para os bolsonaristas, Alckmin. Portanto, devem procurar unificar os votos da “esquerda” em torno dos seus respectivos nomes. Ciro especificamente não conseguirá tirar a bandeira de “anti-establishment” de Bolsonaro ou Marina. O candidato do PT, por sua vez, é establishment e, portanto, só lhe resta apostar na clivagem “esquerda x direita”.

Análise da pesquisa Ibope em São Paulo

Interessante a pesquisa Ibope em São Paulo divulgada ontem.

No cenário com Lula, o presidiário recebe 23% dos votos, enquanto Bolsonaro recebe 18% e Alckmin 15%.

Sem Lula, o quadro se inverte: Alckmin recebe 19% e Bolsonaro, 16%.

Alckmin herda 4 pontos percentuais de Lula. Mas o curioso é o que acontece com Bolsonaro, que PERDE 2 pontos sem Lula.

Seria como se, na lista com Lula, uma parcela dos eleitores escolhesse Bolsonaro porque o Lula está lá. Seria uma espécie de “voto útil” em alguém com teoricamente mais chances, hoje, de vencer Lula no 2o turno. A mesma pesquisa mostra que Lula lidera a rejeição no Estado (45%).

Excluído Lula da lista, Bolsonaro perde essa fatia de eleitores, que se veem livres para escolherem seu candidato de predileção.

Existem analistas que defendem que a candidatura Bolsonaro nasceu como um “anti-petismo”, e só mais recentemente adquiriu características de “anti-establishment”. Esses analistas defendem que a saída de Lula do jogo eleitoral prejudicaria também Bolsonaro, pois tiraria a sua razão de existir. Essa pesquisa do Ibope pode estar sinalizando isso.

(Aos bolsonaristas: pesquisa de intenção de voto não vale só quando Bolsonaro está na frente, talkei?)

Os limpinhos da política

Acho realmente curioso como Ana Amélia está sendo atacada pelos “limpinhos da política”.

Ela tem reputação, e se notabilizou por ser algoz do discursinho do PT no Senado, tendo tido papel de destaque no impeachment.

E tudo isso sendo filiada ao PP.

Ao P E P Ê.

Sim, o PP do Petrolão e de Ciro Nogueira. O PP, quintessência do Centrão.

Enquanto Ana Amélia estava bem acompanhada dos impolutos pepistas, os “limpinhos da política” babavam ovo.

Mas agora não. Agora se aliou a Alckmin, o representante do coisa ruim no Brasil. Aliou-se ao Centrão! Como se o PP, partido da senadora (repito: partido da senadora), não pertencesse ao Centrão.

Se Ana Amélia tivesse se aliado a Bolsonaro ou a Amoêdo, estariam agora os “limpinhos da política” festejando. O fato de a senadora pertencer ao PP do Petrolão e de Ciro Nogueira seria um mero detalhe.

Quando Bolsonaro cortejava Magno Malta, não vi nenhum bolsonarista fazer reparos ao chefe do partido do senador, o notório Valdemar da Costa Neto.

“Ah, mas ele iria na cota pessoal, não traria o Centrão junto.”

Sim, e Ana Amélia irá na cota pessoal de Alckmin. A senadora não compactua com as práticas pouco republicanas do Centrão, assim como Magno Malta. A senadora Ana Amélia tem uma respeitabilidade acima de qualquer suspeita. A sua escolha me diz mais sobre o caráter de Alckmin do que sobre o dela.

Establishment vs. Anti-Establishment

Hoje, o repórter Cristian Klein, no Valor, levanta mais um fator que poderia levar a um segundo turno entre Alckmin e Bolsonaro.

Como sabem, tenho defendido que esta é uma hipótese mais provável do que tem admitido a média dos analistas, ainda presos ao esquema “PT x PSDB”, “esquerda x direita”. Em minha modesta opinião, a clivagem que vai prevalecer não é esta, mas sim “establishment x anti-establishment”.

Pelo establishment, com estrutura, apoios e tempo de TV, Alckmin está praticamente sozinho. O candidato do PT, que poderia lhe fazer sombra, está na cadeia, enquanto Ciro está sendo devidamente desidratado.

Pelo anti-establishment, ninguém veste melhor o figurino do que Bolsonaro. Marina, uma potencial competidora nesse campo, perde em termos de “novidade”.

Mas mesmo para os que ainda dão peso à clivagem “direita x esquerda” (que continua existindo, sem dúvida), Cristian Klein chama a atenção para um outro fator que vem se desenhando: a fragmentação das candidaturas da esquerda.

Em todas as eleições desde 1994, as esquerdas (com exceção do PSOL) se uniram em torno de Lula. Hoje, sem o presidiário de Curitiba, PC do B e PDT ensaiam carreiras solo, além da eterna candidata Marina Silva. Assim, a dispersão dos votos da esquerda, a não ser que ocorra um voto útil ainda no primeiro turno, pode sim viabilizar um segundo turno entre candidatos do centro-direita.

Claro, tudo pode mudar, Lula pode conseguir unir as esquerdas em torno do seu poste ainda no 1o turno, e aí então o quadro muda. Mas, do jeito que está desenhado hoje, o 2o turno pode ver sim um embate entre establishment x anti-establishment.

A última princesa do baile

A última princesa do baile saiu da festa sem se casar com ninguém.

Com a definição do PSB pela neutralidade, temos apenas um candidato à presidência com uma coligação para chamar de sua: Alckmin.

A neutralidade do PSB tem sido apontada como uma vitória de Lula sobre Ciro, o que é verdade. Sozinho no PDT, diminuem as chances do coronel de Sobral passar para o 2o turno representando “a esquerda”.

Mas o outro ganhador, reforçando a fama de jogar parado, foi Alckmin. Garantiu a máquina do governo de São Paulo para a sua campanha, pois Marcio França, sua quinta-coluna dentro do PSB, poderá trabalhar livremente por sua candidatura no maior colégio eleitoral do Brasil, sem as amarras de uma aliança nacional.

Alckmin está juntando dezenas de exércitos em pontos estratégicos do tabuleiro para atingir seu objetivo. Resta saber se jogará bem os dados quando começarem as batalhas.