A prioridade é o povo. Resta saber qual povo.

Entrevista com o governador do RS, Eduardo Leite. Em determinado momento, o repórter pergunta a respeito da privatização da Corsan, a estatal de saneamento do Estado. Leite justifica a privatização dizendo o óbvio: nem a empresa e nem o Estado dispunham de recursos suficientes para os investimentos requeridos pelo novo marco do saneamento. Então, a única alternativa era vender a empresa para algum grupo capitalizado e disposto a realizar os investimentos.

Foi exatamente para isso que foi aprovado o novo marco do saneamento: aumentar os investimentos no setor por meio da exigência de capacidade mínima de investimento por parte das empresas do setor.

O que está acontecendo agora? O governo do PT busca fazer mudanças no marco, de modo a acomodar mais de 500 contratos entre governos e empresas estatais, que já deveriam estar extintos por falta de capacidade de investimento. O resultado, se a iniciativa tiver sucesso, será o atraso no cronograma de universalização da cobertura de saneamento básico no País. No mínimo estranho, para quem se diz tão preocupado com as condições de vida do povo.

A morte da galinha do saneamento

Este post é uma continuação do anterior, trazendo um exemplo concreto de como se mata a galinha dos ovos de ouro.

O marco do saneamento permitiu a assinatura de contratos com empresas privadas, que vão gerar investimentos da ordem de centenas de bilhões de reais nos próximos anos, em uma área que necessita de investimentos mais do que qualquer outra.

Bem, o que está acontecendo? Mais de 500 contratos de estatais encontram-se irregulares segundo o marco do saneamento. Como os políticos que vivem pendurados nessas estatais não querem largar o osso, o governo do PT está “negociando” para chegar a um “acordo” que seja “bom para todos”. Enquanto isso, investimentos privados encontram-se paralisados. Aliás, já no dia 02/01, um dos primeiros decretos do governo Lula mudou atribuições da Agência Nacional de Águas, trazendo incertezas para os investimentos no setor.

Os governos do PT têm esse cacoete, de preferir o investimento estatal ao privado. Quando se trata da Petrobras, o máximo que vamos ter é um combustível mais caro do que o necessário. No saneamento, no entanto, o que temos são crianças doentes por falta de saneamento. Um crime, antes até do que uma sabotagem da produtividade do país. Toda vez que o PT põe a mão em alguma coisa, morre uma galinha dos ovos de ouro.

A galinha dos ovos de ouro vai morrer novamente

É conhecida a fábula da galinha dos ovos de ouro. Em um vilarejo, um granjeiro cuidava de suas galinhas, quando descobriu que uma delas botou um ovo de ouro. Todo contente, foi contar à sua esposa, que também ficou muito feliz com a grande descoberta. Pegaram aquele ovo e foram até o vilarejo, onde venderam o ovo por uma grande quantia em dinheiro. “Ficamos ricos!”, pensaram.

O problema é que a galinha botava um ovo de ouro somente de tempos em tempos. O dinheiro acabou, e o casal começou a impacientar-se com aquela demora. Decidiram, então, acelerar o processo. Pensaram assim: por que se satisfazer com um ovo de ouro de quando em vez, quando poderiam obtê-los todos de uma vez? Bastaria abrir a barriga da galinha e arrancar os ovos de ouro todos de suas entranhas. E assim o fizeram, para descobrirem, horrorizados, que não havia nenhum ovo de ouro, apenas vísceras comuns. Por causa de sua ganância, ficaram com uma galinha morta, e sem os ovos de ouro.

Esta fábula é sobre fazer a coisa certa e esperar pelos resultados. Se os granjeiros tivessem continuado a alimentar a galinha e esperassem o resultado, continuariam ricos. A economia é uma especie de galinha dos ovos de ouro. É preciso fazer a coisa certa e aguardar os resultados. Ao longo do tempo, os ovos de ouro do crescimento econômico vêm.

O crescimento econômico é um processo lento, que se dá nas entranhas da economia sem sabermos muito bem como acontece. Só sabemos que é preciso alimentar a economia com aumento de produtividade. O PIB é a soma de todo o valor agregado na economia. Por isso, de nada adianta gastar por gastar. É preciso que esses gastos agreguem valor à economia. Um exemplo simples: uma estrada feita pelo governo somente agregará valor à economia se houver tráfego suficiente para compensar o dinheiro gasto. E por “tráfego suficiente” quero dizer valor agregado adicional por causa da existência daquela estrada. Obviamente, estradas inacabadas ou que servem ao haras de ministro não cumprem essa condição.

Há uma espécie de sofreguidão por gastar, como se isso, por si só, fosse fazer aumentar o PIB. Gastar por gastar é o equivalente a matar a galinha dos ovos de ouro, esperando conseguir todos os ovos de uma vez. Os desenvolvimentistas dirão que não se trata de “gastar por gastar”, mas de investir nos “projetos certos”, aqueles que vão agregar valor. Como se anos de gastos em projetos furados durante a era PT (não só da era PT, mas eles levaram a coisa ao estado da arte) não tivessem sido suficientes para demonstrar que escolher o “projeto certo” não é exatamente a especialidade de governos.

E lá vamos nós de novo, pegar dinheiro gerado por atividades produtivas e queimar em projetos para “fazer o país crescer”. A galinha dos ovos de ouro vai morrer novamente.

Só falta o “sistema”

O senso de urgência desse governo me anima. O “desenho” do programa Desenrola, uma das promessas de campanha, foi levado ao presidente Lula ontem, apenas 65 dias após o início do mandato.

Para demonstrar que há muita urgência, o ministro da Fazenda nos informa que o secretário de Política Econômica até saiu no meio da reunião para dar uma previsão de quando um tal “sistema” ficaria pronto. Não, não dava para esperar o fim da reunião. É tanta pressa em resolver o problema dos endividados, que o secretário saiu antes de a reunião terminar para tratar do assunto do “sistema”. E o ministro da Fazenda fez questão de estressar esse ponto, para demonstrar a urgência que o assunto está merecendo por parte do governo.

Pelo visto, o secretário não voltou à reunião com a informação de quando o “sistema” ficará pronto. Pelo menos, a reportagem não traz essa informação. Ficamos todos ansiosos.

Lula já fez saber aos seus auxiliares que sem o tal “sistema”, nada feito. Ele não vai lançar um programa sem um “sistema”, só pra fazer marketing. Mas fiquem tranquilos os endividados do país. O secretário até saiu no meio da reunião para tratar do “sistema” e verificar a sua data de entrega. A coisa é urgente. Só falta o “sistema”.

O representante do centro mostra porque o centro não existe

Entrevista com o ex-senador Tasso Jereissati. Reproduzo abaixo o início e o fim, o resto é tão irrelevante quanto a figura entrevistada.

Comecemos pelo fim. Tasso afirma que “não queremos” ocupar o lugar do bolsonarismo, mas sim, “queremos” ocupar o lugar do centro. “Queremos” quem, cara pálida? Quais forças políticas Tasso Jereissati está representando? Esta é só uma pergunta retórica, claro. O ex-senador representa um partido com passado glorioso, mas completamente irrelevante para o futuro do país. E essa entrevista só atesta essa triste realidade.

Um político que quer fazer oposição ao petismo não pode se dizer “muito surpreso” com a agenda econômica de Lula. Em que planeta estava o senhor senador enquanto o PT destruía a economia entre 2006 e 2015? “Ah, mas era legítimo esperar o Lula que governou entre 2003 e 2005”. Sim, era, para quem tem 18 anos de idade. Alguém que tem cabelos brancos e, em tese, é um político experimentado, não tinha esse direito. Na minha série “A Economia na Era PT”, demonstro que a semente do desastroso governo Dilma encontrava-se já no 2o mandato do governo Lula. De onde tiraram a ideia de que Lula voltaria 20 anos no tempo? “Ah, mas Lula teria aprendido com os erros do governo Dilma”. Que erros? O PT por acaso erra? Foi tudo culpa da queda dos preços das commodities, da Lava-Jato e do Eduardo Cunha.

O início da entrevista orna com o fim. Expressar “muita surpresa” no campo econômico encaixa-se perfeitamente com a babação de ovo a respeito da politica externa e da vacinação. Se fosse um governo responsável no campo econômico, seria nada menos que perfeito. É esse tipo de “oposição” que espera ganhar do PT em 2026?

O ex-senador tece loas à política externa do governo Lula, por conta do discurso na área ambiental. Adivinha qual o único político de expressão que condenou o atracamento de navios de guerra do Irã em porto brasileiro? Pois é. E ainda ficam espantados com o fato de Bolsonaro ter conseguido 49% dos votos.

O presidente do diálogo

Lula é, sem dúvida, o presidente do diálogo. Na guerra da Ucrânia, por exemplo, ele propõe o diálogo como forma de encerrar o conflito. Pouco importa se há um agressor e um agredido na história, ou se houve trangrsssão de leis internacionais. O que vai “solucionar” o problema é colocar as partes em uma mesa de negociações “sem pré-condições”.

O padrão se repete com a invasão de uma fazenda de eucaliptos da Suzano por parte do MST. Pouco importa se existe um agressor e um agredido, se houve transgressão de leis. O que vai “solucionar” o conflito é colocar as partes em uma mesa de negociações ”sem pré-condições”.

Esse modus operandi, digamos, construtivo, poderia ser adotado em outras situações de “conflito”. Por exemplo, em um assalto, a polícia deveria servir como mediadora, promovendo o diálogo entre as partes, “sem pré-condições”. E assim por diante, todos os “conflitos” seriam resolvidos na base do “diálogo”. Quem seria contra essa abordagem de “paz”?

A Suzano, assim como a Ucrânia, não aceita qualquer diálogo antes que suas terras sejam devolvidas. Lula certamente acha que intransigências desse tipo são obstáculos para uma resolução pacífica dos conflitos. Da próxima vez em que você for assaltado, não seja intransigente: sente-se à mesa com o assaltante e com um árbitro acima de qualquer suspeita, como um petista, por exemplo. E o mais importante: sem pré-condições.

A propaganda fraudulenta é a alma do negócio inexistente

Os governos petistas são imbatíveis em termos de propaganda. Fazem do limão uma limonada, é preciso reconhecer. Para isso, contam com a pronta ajuda da preguiçosa imprensa tupiniquim, sempre disposta a servir de assessoria de imprensa para o governo. Já vimos acontecer no caso da “ofensiva diplomática na Ucrânia”. Agora, trata-se da “reabertura da fábrica da Ford em Camaçari”.

Tudo começou com um tuíte do ministro do trabalho, Luís Marinho, sobre quem apostei que seria uma dos mais folclóricos da esplanada de Lula. Acho que vou ganhar a aposta. Seu tuíte diz o seguinte: “Governo @lulaoficial negocia a retomada da FORD na Bahia, com isto, reaquecendo importantes polos industriais do Nordeste”, seguido de um link para uma matéria da Veja. O tuíte teve respostas entusiasmadas, inclusive de um tuiteiro pedindo a volta da fabricação do Ka e do Ecosport.

A matéria da Veja, no entanto, fala de uma “negociação com chineses” para a compra da fábrica. Convenhamos, MUITO diferente de uma “retomada da FORD na Bahia”, como tuitado.

Alguns veículos de imprensa, no entanto, nem se deram ao trabalho de clicar no link.

O Antagonista, por exemplo, repercute a fala de Luiz Marinho: “O ministro do trabalho, Luiz Marinho, afirmou nas redes sociais que o governo Lula negocia a retomada das atividades da fábrica da Ford na Bahia”. Ilustrando a nota, um grande símbolo da Ford.

O UOL, idem: “Ministro diz que governo negocia retomada da fábrica da Ford na Bahia”. Há uma “errata” na matéria, que corrige a chamada, afirmando que se trata da montadora chinesa BYD, em negociação com o governo da Bahia.

Mas a coisa não para por aí. Na verdade, essa montadora chinesa, BYD, já estava em negociação com o governo da Bahia desde, pelo menos, outubro do ano passado, como atesta matéria de um site especializado em veículos elétricos, InsideEVs: “BYD prepara instalação de fábrica de carros elétricos e baterias na Bahia”.

Em novembro, matéria do Estadão confirma: “BYD, marca chinesa de veículos elétricos e baterias, vai produzir no Brasil”.

Ou seja, toda essa festa do ministro é notícia amanhecida.

Você acha que a coisa para por aí? Não!

Em janeiro de 2022, uma outra montadora chinesa de veículos elétricos, a GWM, anunciou a aquisição da planta da Mercedes na cidade paulista de Iracemápolis, segundo matéria do Poder360.

A Infomoney informa, agora em fevereiro, que a fábrica deve lançar o primeiro carro no mercado brasileiro, ainda importado, em março.

Pois bem. Matéria da TV Cultura informa que a GWM “chega” ao Brasil agora em fevereiro de 2023! E liga a notícia com a viagem de Lula à China!

Não foi preciso muito para que tuiteiros petistas repercutissem a matéria, como se a fábrica da GWM (que nem está produzindo nada ainda, vai começar a produzir só em 2024) fosse uma grande conquista do governo Lula.

Dei uma googlada para ver se alguém do governo Bolsonaro, ou o próprio, havia feito alguma festa com o anúncio da compra da fábrica da Mercedes pela GWM, em janeiro do ano passado. Não encontrei nada. Bolsonaro era bem ruim de marketing, como sabemos.

Então, ficamos assim: uma montadora chinesa que já havia comprado uma fábrica no Brasil no ano passado, e outra fábrica chinesa que já estava em tratativas com o governo da Bahia também no ano passado, ambas são conquistas do governo Lula. Assim é se assim lhe parece.

A diplomacia de Lula: propaganda e realidade

A máquina de propaganda do PT está a todo vapor, com a prestimosa ajuda de jornalistas dispostos a servir de assessoria de imprensa, ao invés de apurar os fatos.

Hoje, duas páginas do Estadão movem para frente a história de que o Brasil de Lula está se tornando um ator relevante no cenário diplomático global. Na primeira, uma notinha diz que o Brasil fez duas contribuições relevantes para a resolução da ONU que condena, pela enésima vez, a invasão da Ucrânia pela Rússia. A primeira teria sido a inclusão de um pedido de que “os dois lados cessem ações hostis” (mais à frente comento o absurdo dessa proposta). A segunda seria a inclusão da “necessidade de esforços diplomáticos para alcançar a paz”.

Na segunda página, Eliane Cantanhêde afirma que tanto a Rússia quanto a Ucrânia mandaram “leves sinais” de que estariam aceitando as propostas de Lula. No caso da Rússia, o vice-ministro das relações exteriores “agradeceu ao Brasil por não enviar munições à Ucrânia e afirmou que Putin estuda a proposta de paz de Lula”.

Dá vontade de gargalhar, não fosse algo trágico. Essa posição da Rússia é muito clara sobre a quem interessa a posição do governo brasileiro. Em seguida, Cantanhêde afirma que o “cessar-fogo imediato” foi um elemento da resolução pedido pela própria Ucrânia, em linha com o que Lula defende, e que isso seria um sinal de aceitação da mediação do presidente brasileiro. Veremos que a informação está factualmente incorreta, mas mesmo que estivesse certa, ligar isso com Lula é muita vontade de babar ovo.

Vamos por partes. Em primeiro lugar, fui às fontes, como os jornalistas deveriam ter feito. A ONU publica não somente as resoluções, como também os debates que deram origem às resoluções. No caso da última resolução, foram dois dias de debates, na quarta (22) e quinta (23). Fui dar uma busca nas atas desses debates (aqui e aqui) pelas intervenções do Brasil. No primeiro dia não há nenhuma. A intervenção no 2o dia foi a seguinte:

O representante do Brasil disse que sua delegação votará a favor da resolução, pois a Assembleia Geral deve respeitar os princípios fundamentais da Carta das Nações Unidas e do direito internacional. Enfatizando que o elemento mais importante do texto é o apelo à comunidade internacional para redobrar os esforços para alcançar uma paz justa e duradoura na Ucrânia, ele disse que seu país considera o pedido de cessação das hostilidades no parágrafo dispositivo 5 um apelo a ambos os lados para deter a violência sem pré-condições“.

Estão aí os dois elementos levantados pelos jornalistas: esforços diplomáticos e cessar-fogo. O problema é que nem um e nem o outro ponto são o que os jornalistas dizem ser, os pontos devem ter sido soprados pelo governo. Vejamos.

No caso dos esforços diplomáticos, este é um ponto que já tinha sido mencionado, por exemplo, na resolução votada em outubro do ano passado. Em seu parágrafo 7, podemos ler, entre outras coisas: “… uma resolução pacífica do conflito através diálogo político, negociação, mediação e outros meios pacíficos, …”. Então, os tais “esforços diplomáticos” não foram uma ideia do Genial Guia dos Povos, mas algo que faz parte da própria natureza da ONU. Isso é tão óbvio que dá até vergonha de ter que explicar.

Mas é no segundo ponto que se encontra o ponto chave da posição brasileira. A intervenção brasileira nos debates fala de “deter a violência sem pré-condições”. Este “sem pré-condições” não está na resolução. Podemos ler no tal parágrafo 5:

Reitera a sua exigência de que a Federação Russa retire imediata, completa e incondicionalmente todas as suas forças militares do território da Ucrânia, segundo suas fronteiras reconhecidas internacionalmente, e apela à cessação das hostilidades“.

Note 1) toda a frase anterior ao pedido de fim das hostilidades, que claramente coloca a responsabilidade sobre a Rússia em relação a este movimento e 2) a ausência do “sem pré-condições” pedido pela delegação brasileira nos debates.

Ou seja, a resolução nem mostrou uma novidade em relação aos esforços diplomáticos e nem acolheu a sugestão brasileira de um cessar-fogo incondicional. E, obviamente, não foi a Ucrânia que pediu a inclusão dessa última cláusula, como sugere Cantanhêde, basta ler a intervenção da Ucrânia nos debates. Portanto, a festinha dos jornalistas em torno da diplomacia de Lula parece mais um trabalho de assessoria de imprensa do que jornalismo.

Até aqui, uma crítica ao jornalismo. A partir daqui, uma crítica (ou um lamento) sobre a posição brasileira em relação ao conflito.

A delegação brasileira pede um “cessar-fogo sem pré-condições”. Procurei, nas atas dos debates, os países que pediram um cessar-fogo ou o fim das hostilidades. Além do Brasil, Peru, Tunísia, Costa Rica, México e China pediram um cessar-fogo. Mas o Brasil foi o único que pediu um cessar-fogo a ambos os lados sem pré-condições. Desculpem-me a crueza, mas às vezes uma imagem xucra transmite melhor a mensagem: o pedido do Brasil é equivalente a pedir para que estuprador e estuprada parem de se machucar mutuamente sem pré-condições, ou seja, o estuprador pode manter o pênis dentro da vagina da estuprada, desde que parem de brigar. É ultrajante.

Encerro com a posição do Japão nos debates, um exemplo de como uma nação civilizada deveria se posicionar sobre este conflito:

HAYASHI YOSHIMASA, Ministro das Relações Exteriores do Japão, enfatizou que o projeto de resolução é sobre a paz. A paz deve ser baseada em princípios, apontou, acrescentando que, embora as hostilidades devam cessar imediatamente, isso não produziria necessariamente uma paz abrangente, justa e duradoura. “E se um membro permanente do Conselho de Segurança lançasse uma agressão contra sua pátria, tomasse seu território e então cessasse as hostilidades, pedindo paz?” ele perguntou, chamando tal paz de injusta. Seria uma vitória para o agressor se tais ações fossem toleradas e abririam um terrível precedente para o resto do planeta, disse ele, acrescentando que o mundo voltaria à selva, seja em terra ou no mar. Conclamando a Federação Russa a retirar suas tropas imediata e incondicionalmente da Ucrânia, ele observou que a Assembleia Geral exigiu isso, assim como o Secretário-Geral e a Corte Internacional de Justiça. Infelizmente, acrescentou, “a Rússia aparentemente não se importa com as resoluções da Assembleia Geral e as ordens da Corte Internacional de Justiça, como se fossem apenas pedaços de papel inútil”, disse ele, destacando também seu abuso do poder de veto e sua retórica irresponsável como um Estado com armas nucleares.

A loteria da casa própria

O editorial do Estadão saúda a volta do Minha Casa Minha Vida, Faixa 1 (90% de subsídio). Mas alerta: as casas precisam ser de “boa qualidade” e “próximas de serviços urbanos”. E, a pedido de Lula, precisam ter varanda, segundo matéria de alguns dias atrás.

Quanto custaria uma casa com esses requisitos? Entre comprar terrenos que não estejam em periferias sem serviços e materiais de boa qualidade, posso chutar uns R$ 3 mil o m2? Para uma casa decente, com varanda como o pobre merece, tem que ter uns 50 m2 no mínimo. Então, cada casa com esses requisitos custaria R$ 150 mil.

Segundo o editorial, a fundação João Pinheiro estima em 6,9 milhões de residências o déficit habitacional no país. A um custo unitário de R$ 150 mil, precisaríamos de nada menos que R$ 1 trilhão para acabar com o problema da moradia no Brasil. O governo Lula separou R$ 9 bilhões para o programa esse ano. Se esse mesmo montante fosse aplicado todo ano, o déficit habitacional estaria resolvido em 115 anos.

Isso, falando só da entrega. Não consideramos a manutenção dos imóveis, que, obviamente, está acima da capacidade de renda de seus moradores. O resultado é a deterioração, o que faz com que, depois de alguns anos, essas famílias estejam engrossando novamente as estatísticas da fundação João Pinheiro de sub-moradias. Quando não vendem suas unidades para poderem comer, o que as joga novamente nas estatísticas da fundação.

Alguns dirão que é melhor isso do que nada. Sim, é o chamado “efeito loteria”. Diz uma teoria que as loterias têm uma função social: manter a esperança do povo, nem que seja com uma probabilidade muito pequena, probabilidade esta, via de regra, superdimensionada pela população. O mesmo com o programa habitacional do governo Lula: poucos sabem que seriam necessários mais de 100 anos para atender a todos, portanto o programa cumpre a sua função de manter a chama da esperança do povo acesa.

Na década de 90, Paulo Maluf, então prefeito de São Paulo, lançou um programa habitacional chamado “projeto Cingapura”, supostamente inspirado em algo semelhante feito na ilha asiática. A diferença, claro, é que a renda per capita lá era algumas vezes maior do que a brasileira, e o déficit habitacional local era imensamente maior. Assim, o projeto de Maluf, cujo maior símbolo foi um Cingapura que serviu de “tapume” para uma favela que dava de frente para o eixo de escritórios de alto padrão na Berrini, foi intensamente criticado por ser “cosmético” e não endereçar o problema de maneira séria. Eram os tempos em que a opinião pública exercia um ceticismo saudável.

Hoje, quaisquer R$ 9 bilhões, que servem somente para montar um palanque para Lula, são aclamados como a redenção da população pobre. Que os mais necessitados continuem tendo esperança de que serão sorteados na loteria estatal é compreensível. O que foge à compreensão é como pessoas esclarecidas, que sabem fazer conta, continuam a acreditar nesse engodo.

PS.: na minha série sobre a economia na era PT, escrevo um artigo que desmonta o Minha Casa Minha Vida, que, apesar de todas as suas promessas grandiloquentes, não mexeu a agulha no déficit habitacional brasileiro. Link aqui.

Boas e más notícias

“Tenho boas e más notícias. A boa é que você não vai precisar trabalhar a partir da semana que vem.

– E a má?

– Você está demitido”.

Essa piada, com suas inúmeras variações, ilustra uma forma pretensamente suave de dar notícias ruins, mas que, na verdade, é bastante cruel.

uma grande notícia ruim a dar ao povo brasileiro: o Estado de Bem-Estar Social com que todos sonham não cabe no orçamento público. Então, há que diminuir as benesses ou aumentar o orçamento ou uma combinação das duas coisas. Mas o governo Lula inovou: ao invés de anunciar notícias boas e más, só vem anunciando as boas: aumento do salário-mínimo, aumento da faixa de isenção do IR, novo Minha Casa Minha Vida, aumento das bolsas da Capes, e uma longa lista de etceteras, como se o dinheiro tivesse aparecido por obra e graça da mudança de governo.

E quem está dando a má notícia? O Banco Central, personificado em seu presidente. É o BC que mantém a taxa de juros na lua, lembrando-nos a todos que há um forte desequilíbrio na economia brasileira. O portador das más notícias vem sendo tratado a pontapés pelo governo Lula e seu partido. Este é um governo que quer varrer as más notícias para debaixo do tapete, para que vivamos o aqui e o agora idílico vendido na propaganda do PT.

A piada das “boas e más notícias” é cruel. Mas, mais cruel ainda, é fingir que não existem más notícias.