O motivo da irrelevância do PSDB

Semana passada, comentei aqui entrevista de Sérgio Fausto, diretor executivo da fundação FHC e uma das principais vozes da intelligentsia pe-esse-de-beiana. Em uma entrevista, o entrevistado pode ser pego de surpresa e não conseguir expressar exatamente o que queria dizer. Hoje, Sérgio Fausto escreve um artigo, o que permite entender de maneira mais fidedigna o seu pensamento. E a coisa, acreditem, piorou.

Depois de discorrer sobre o caráter democrático do PT, apesar de seus pecadilhos, como apoiar ditaduras como as de Cuba e Venezuela, e de colocar as diferenças entre PT e PSDB no campo das políticas econômicas, Fausto chega ao núcleo de seu artigo, destacado abaixo. Não consegui encontrar, até o momento, melhor demonstração, a um só tempo, de porque o PSDB se tornou um partido irrelevante no nível nacional e de porque Bolsonaro foi eleito presidente da República.

O articulista defende uma oposição ao PT, mas sem um “antipetismo furibundo e preconceituoso”. Ou seja, uma oposição do jeito que o PT gosta, de modo que o partido de Lula possa fazer, sozinho, uma oposição furibunda e preconceituosa a tudo o que se opõe ao partido. O trecho mais inacreditável do artigo é a atribuição a uma suposta “polarização autodestrutiva” entre PT e PSDB o fato de Bolsonaro ter chegado ao poder. É justo o oposto: o fato de o PSDB não ter feito polarização durante 15 anos fez com que os eleitores caíssem no colo do primeiro antipetista “furibundo e preconceituoso” que apareceu na praça. Bolsonaro é, antes de mais nada, cria desse PSDB civilizado que Sérgio Fausto tão bem representa.

Não é de se admirar, portanto, que, partindo de um diagnóstico falho, a tática eleitoral sugerida seja mais um furo n’água: Fausto sugere que o candidato do PSDB ataque Bolsonaro para chegar ao 2o turno, como se os anti-Bolsonaro já não tivessem o seu candidato de coração, Lula. Para deslocar Bolsonaro, é preciso convencer o eleitorado antipetista de que não se está votando em uma quinta-coluna do PT. O discurso de Sérgio Fausto mostra que o PSDB não é este partido.

É sintomático que, em um artigo de 5.000 caracteres, o articulista não tenha encontrado espaço para condenar o PT pela roubalheira da Petrobras. O máximo foi uma menção à “estigmatização da Lava-Jato” pelo PT, mas em um contexto de condenação do PT como um partido populista. O grosso do antagonismo foi descrito no campo econômico, o que, convenhamos, está longe de levantar as massas.

Vivemos em um país polarizado por causa do PT. Bolsonaro foi apenas a reação natural em um vácuo que se criou pela inapetência do PSDB. O final do artigo demonstra, com excelência, este ponto: “A terceira via […] perdendo ou ganhando, é importante que tenha força política para participar da construção do futuro do país”. Perdendo ou ganhando. É isso. Ao PT não interessa nada que não seja a vitória, enquanto o PSDB quer “participar da construção do futuro”. Não consigo pensar em nada melhor para explicar porque o PSDB se tornou um partido nanico nas eleições presidenciais.

Satélite do lulopetismo

O que vai abaixo são trechos de uma entrevista de Sérgio Fausto, diretor executivo do Instituto FHC e uma das principais cabeças pensantes do PSDB. Talvez seja a evidência mais evidente de porque o PSDB tornou-se um partido nanico na última eleição presidencial e, tudo indica, continuará assim. Basta lembrar que a votação de Alckmin foi, de longe, a menor que o partido recebeu desde a redemocratização.

Sérgio Fausto coloca Lula no “centro democrático” e defende o apoio a Lula em um eventual 2o turno contra Bolsonaro. Na parte cômica da entrevista, o diretor do Instituto FHC diz que espera o apoio de Lula a um eventual candidato do PSDB no 2o turno contra Bolsonaro. O mundo do humor definitivamente está perdendo um grande talento.

Mas é para a última pergunta que eu gostaria de chamar a atenção. Não pela resposta, mas pela pergunta em si. O entrevistador questiona se seria o caso de o PSDB “voltar ao antipetismo”.

A pergunta é curiosa em dois sentidos. Primeiro, só se volta a algo quando este algo esteve presente antes. Com exceção das poucas semanas das campanhas eleitorais, o “antipetismo” do PSDB se resumiu a um silêncio obsequioso, mesmo vendo o legado do governo FHC sendo sistematicamente destruído e a máquina do Estado sendo transformada em apêndice do partido. Para o jornalista, o simples fato de estar do outro lado no 2o turno em seis eleições torna o PSDB automaticamente antipetista. Não, não torna.

Bolsonaro conseguiu encarnar o antipetismo, e por isso foi eleito. Confesso que errei, na ocasião, o meu prognóstico. Achei que as eleições seriam marcadas pela luta contra o establishment político e, portanto, apostei que Bolsonaro iria enfrentar, no 2o turno, um candidato do establishment, no caso, Alckmin. Descartei a priori um candidato do PT no 2o turno como representante do establishment porque, afinal, Lula estava preso. Qual a chance? Quebrei a cara ao subestimar a força eleitoral de Lula.

Aprendi, naquelas eleições, que Lula e o PT têm lugar garantido no 2o turno de qualquer eleição presidencial, faça chuva, faça sol. Portanto, o discurso antipetista é o único que, com sorte, tem alguma chance de vingar. Digo com sorte porque é preciso que o eleitorado seja majoritariamente antipetista, como foi em 2018. Isso está longe de estar garantido.

Que me perdoem os fãs do capitão, mas Bolsonaro é uma figura irrelevante. Passará, como passaram Collor e Dilma. O que realmente importa é Lula e o PT. É nesse eixo que gira a política brasileira. Ser antipetista é a única forma de se posicionar com sucesso no tabuleiro político. Ou se está com eles, ou se está contra eles. E este é o segundo aspecto interessante da pergunta do entrevistador. A pergunta é boa porque capta justamente esse ponto: o candidato da terceira via precisa ser antipetista para ter alguma chance de sucesso. Fausto reconhece o ponto em sua resposta, dizendo tratar-se de um recurso eleitoral. É óbvio, estamos falando de ganhar eleições.

FHC, Sérgio Fausto e a ala que eles representam do PSDB já fizeram a sua escolha: preferem ser satélites do lulopetismo. Não é à toa que o partido foi dominado por João Doria.

O centro e os polos na política

É realmente curioso como este debate sobre a “polarização” e a busca desesperada por uma solução “de centro” surgiu.

Até o aparecimento do “fenômeno Bolsonaro”, o país encontrava-se dividido fazia 25 anos entre PT e PSDB. Foram nada menos que 6 eleições presidenciais em que os dois partidos se enfrentaram, sendo os outros partidos meros coadjuvantes.

Nestes 25 anos, ninguém falava de “polarização”. PT e PSDB eram considerados partidos “moderados”, um mais à esquerda, o outro mais centro-esquerda, mas ambos muito civilizados e coisa e tal. Tratava-se de uma rivalidade fake.

Aí então, no vácuo de uma inexistente direita conservadora, surge Bolsonaro, para se contrapor à esquerda (PT) e à centro-esquerda (PSDB). Com isso, aparece a tal da “polarização” com o PT, que, não custa lembrar, foi considerado um partido “moderado” nos últimos 25 anos.

Vou repetir então: foi necessário o surgimento do movimento bolsonarista para que ficasse claro que o PT é um partido radical, tão radical como o seu antípoda. Antes disso, o PT sentava-se à mesa dos partidos civilizados, como qualquer outro.

Interessante como tudo é uma questão de perspectiva.

As cores da social-democracia

Entrevista de João Doria hoje.

O PSDB não é mais social-democrata.

Mas vai manter “social-democrata” no nome porque PSDB é uma sigla bacana.

Para mostrar que não é mais social-democrata, ao invés de trocar o nome, trocou as cores. Fica claro para todos que verde-amarelo não é social-democrata.

Desse jeito, PT e Bolsonaro vão se alternar no poder ainda durante muitos anos.

Vai, FHC!

Além de elogiar um charlatão como o Eduardo Moreira, FHC, pra não variar, não coloca na reta. Afinal, ele é contra ou favor da reforma que está no Congresso? Muro, ninguém sabe. Só sabemos que FHC se tornou o rei das platitudes.

E ainda tem gente perplexa com a motoniveladora que passou por cima do PSDB nas eleições.

Vai, PSDB!

Aécio Neves perdeu em MG para Dilma Rousseff em 2014. Foi eleito deputado federal em 2018 com a 19a votação do Estado.

O PSDB foi o partido que mais realizou privatizações na história do País. Qual a lógica de retirar o partido da base de apoio do Novo, que tem basicamente a mesma agenda? Existem duas explicações.

Primeiro, a explicação programática. O PSDB foi empurrado pelo PT para a direita do espectro político, contra a vontade de seus caciques tradicionais. É notório o esforço para disputar o eleitor do PT com um discurso “social”, razão pela qual perdeu 4 eleições seguidas. A vitória da direita é a oportunidade para vincar as diferenças e colocar-se no conforto do campo da esquerda. Doria, por outro lado, vislumbra a avenida de oportunidade à direita do espectro político, representado por não-partidos como o PSL, partidos nanicos como o Novo ou partidos ligados ao Centrão, como o DEM. Na visão de Doria, o PSDB pode fazer o contraponto ao PT, agregando a direita em um partido verdadeiramente nacional.

A segunda explicação é fisiológica: Aécio é um cacique em busca de sobrevivência política. O discurso de não “atrelar-se” a um partido nanico vai na linha de manter a “história” do PSDB, onde os velhos caciques ainda mandam e desmandam. O que Aécio e os outros caciques da velha guarda ainda não perceberam (ou fingem não perceber) é que o “velho” PSDB foi dizimado nas urnas. Apegar-se ao passado só interessa a essas velhas figurinhas carimbadas.

Salvando o discurso

Alckmin embarca nas críticas populistas à proposta de reforma da Previdência. Claro, porque como diz Aécio, o PSDB precisa salvar o Brasil, mas também precisa salvar seu discurso.

E que discurso é esse? Se for este populista do Alckmin, que iguala o PSDB ao PSOL, mostra que o PSDB não aprendeu nada com a surra que tomou nas últimas eleições.

Enfim, é o PSDB sendo PSDB.