Falsa dicotomia

Muitos candidatos, refletindo o que pensa a maioria dos brasileiros, demonizam o “mercado”. Dizem que não vão deixar o “mercado” pilotar o país, que sua preocupação é o povo e não o “mercado”, e por aí vai.

E o que esse famigerado “mercado” quer? Austeridade fiscal e reformas liberalizantes. Ambas com um só objetivo: aumentar as chances de que o Brasil pague sua dívida, uma vez que o “mercado” é o credor do Brasil.

Se é bom para o “mercado” é ruim para o Brasil?

Esta é uma falsa dicotomia. Austeridade fiscal não é “tirar dinheiro do pobre para dar ao rentista”. Isso quem fez foi o governo, ao se endividar para patrocinar políticas populistas. Os juros de hoje são somente a consequência da falta de austeridade fiscal de ontem.

A falsa dicotomia está em contrapor “austeridade fiscal” a “bem-estar do povo”. Nada mais falso. A austeridade fiscal é o alicerce da casa. Ninguém no “mercado” seria louco de afirmar que a casa é formada somente pelo alicerce. Mas os críticos da austeridade são loucos ao afirmarem que é possível construir uma casa sem alicerces.

O Brasil é um país que avança aos trancos e barrancos. O fio condutor de sua história econômica nos séculos 20 e 21 é o desequilíbrio fiscal causado por um Estado mastodôntico sustentado por governos populistas. Constrói castelos no ar, sem alicerces, que se desmancham no ar, deixando um rastro de destruição e desperdício de recursos. Quando vamos acordar para a realidade?

O povo sabe a diferença

“Enquanto o brasileiro se diverte com a Copa, o STF…”

“O Brasil ainda está na Copa, mas a Alemanha continua com a melhor saúde, educação…”

“Enquanto você se preocupa com as canelas do milionário Neymar, zilhões de brasileiros não tem segurança, saneamento básico…”

Frases dessa natureza e suas infinitas variações costumam invadir minha timeline no FB e no Twitter em época de Copa do Mundo. E me irritam.

Irritam-me, em primeiro lugar, porque representam uma visão infantilizada do povo, como se este confundisse as coisas: “Ah! Se o Brasil ganhar, político pode roubar à vontade!”, “Ah! Quando o Brasil joga esqueço que vivo na zerda!” Ora, menos. O povo sabe direitinho que uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Só quer se divertir um pouco de vez em quando. É pecado?

Em segundo lugar, tem esse complexo de vira-lata que insistentemente nos lembra que o Brasil é um país medíocre em tantos quesitos. Sim, o povo sabe disso também, não precisa lembrar justamente quando brilha um dos poucos quesitos em que o país se destaca. Como se o povo não pudesse se orgulhar de nada enquanto o país não for perfeito. A seleção é uma das poucas instituições nacionais que fazem o povo se sentir “importante”, “melhor que os gringos”, “vencedor”.

“Ah, mas é só futebol”. Como assim, “é só futebol”???? O futebol é uma indústria de entretenimento que movimenta seguramente algumas centenas de bilhões de dólares anualmente. É o único esporte em que o dinheiro faz diferença, mas não toda a diferença. Fosse como outro esporte qualquer, os EUA seriam campeões mundiais há muito tempo. Então, conseguimos estar entre os melhores em algo importante na economia global, e tratamos isso com desprezo.

Por fim, a questão dos jogadores. Outro dia vi uma frase que dizia mais ou menos o seguinte: “enquanto você assiste 11 milionários correndo atrás de uma bola, o país continua com 12% de desempregados”. É a tradução perfeita do culto à mediocridade.

Cada um desses 11 milionários chegou lá por seus méritos. Não há atividade em que menos se possa esconder a falta de talento do que o futebol. A marcação a mercado é imediata. Jogou 3, 4 jogos mal, já começa a cobrança. O posto que Neymar conquistou é almejado por milhões de garotos no mundo inteiro. Lembro quando começou no Santos ao lado de Ganso. Eu achava Ganso melhor, mas foi Neymar que decolou. Quantas promessas não naufragam diante da pressão? Quem chega lá, chega porque foi mais competente em lidar com a pressão. Se são milionários é porque geram lucros para quem os financia. Seu sucesso vende produtos, suas imagens passam credibilidade. Os 11 milionários chutadores de bola são a imagem do sucesso, e o sucesso no Brasil, como já disse Tom Jobim, é ofensa pessoal.

Encerro com a antológica resposta que Joãozinho Trinta, carnavalesco da Beija-Flor por muitos anos e ganhador de vários carnavais, deu certa vez em uma entrevista. Questionado sobre o luxo de seus desfiles em contraste com a pobreza dos favelados que desfilavam, Joãozinho sapecou: “O povo gosta de luxo, quem gosta de pobreza é intelectual”. Gente, vamos parar de querer ser os “intelectuais” do futebol, aqueles que querem “abrir os olhos do povo” para as suas mazelas. O povo sabe muito bem o que sofre no dia a dia. Só quer se divertir um pouco e se sentir importante de 4 em 4 anos.

O Brasil nunca sairá do lugar

Esta é uma pesquisa da XP junto a eleitores. O resultado não é muito diferentes de outras de mesma natureza: diante de questões de natureza Estado vs. Iniciativa Privada, o brasileiro prefere o Estado.

No caso específico dessa pesquisa, foram três perguntas: você é a favor das privatizações? Da intervenção do Estado nos preços e nas relações econômicas? Da reforma da Previdência? As respostas, na média, indicam que mais ou menos 2/3 do eleitorado se inclina para as teses da esquerda: contra as privatizações, a favor da intervenção e contra a reforma da Previdência. Mesmo no caso de Alckmin, o candidato que tem menos eleitores que se inclinam à esquerda, quase metade é simpática a essas teses.

Nos três casos, o brasileiro vê o Estado como o Pai que sabe o que é melhor para os seus filhos, e é o provedor da casa. Mostra uma sociedade infantilizada, que precisa da proteção que somente o Estado pode dar.

Quando você se perguntar porque o país não sai do lugar, não coloque a culpa em Brasília. Brasília é somente o reflexo do Brasil. E o Brasil é isso que está aí nessa pesquisa. Nunca sairemos do lugar.

Correndo atrás do rabo

Chegou-me às mãos um estudo do Santander sobre o potencial impacto da melhoria da educação na produtividade do país. A principal conclusão é a seguinte:

“Se o Brasil conseguisse sair das últimas posições (onde se localiza atualmente, junto com Peru e Indonésia) no ranking do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes em um período de 10 anos e conseguisse alcançar o mesmo patamar de Chile e Bulgária (que estão em uma situação melhor, porém entre os 25% piores), poderia aumentar a produtividade do trabalho em 50%. Isso significaria, no período de 10 anos, uma expansão da produtividade a um ritmo de 4% por ano, o que poderia elevar o crescimento potencial dos atuais 2%-2,5% para um nível próximo de 5%.”

Repetindo: atingir o nível da Bulgária no PISA nos faria dobrar o crescimento potencial do PIB.

Sim, combate à corrupção é importante.

Sim, equilíbrio fiscal é importante.

Sim, combate à criminalidade é importante.

Mas enquanto não fizermos um esforço sério, não ideológico, para incluir uma fatia importante da população brasileira nesta cidadania chamada “alfabetização funcional”, continuaremos correndo atrás do rabo.

Manja tudo

Manja tudo esse Perillo. Comparar a situação do Lula em 2002 com a de Alckmin em 2018 tem tudo a ver mesmo. Alckmin é visto pelo mercado como um radical de esquerda e precisa de um “avalista” para passar por moderado. Meirelles agrega mesmo muito à campanha do PSDB, inclusive o inestimável apoio do Temer.

Com um coordenador desses, Alckmin não precisa de adversários.