Uma das grandes incógnitas desta eleição é o poder de transferência de votos de Lula para o seu poste.
Lula conseguiu fazer isto em 2010. Dilma, uma completa desconhecida até um ano antes das eleições, foi ungida e levada à vitória por seu padrinho. Convém relembrar como foi esse processo.
– Em junho/2005 (portanto, mais de 5 anos antes da eleição de 2010), Dilma assume a cadeira de ministra da Casa Civil, que pertencia a José Dirceu. A partir de então, começa a ganhar visibilidade no mundo político.
– Em março/2008 (2 anos e meio antes das eleições), Lula lança Dilma como a “mãe do PAC”, o mote que usará na campanha.
– Em setembro/2008, mais de dois anos antes das eleições, em pesquisa CNT/Sensus, Dilma já aparece com 8% das intenções de voto, contra 38% de Serra.
– Em maio/2010, 5 meses antes das eleições, Dilma empata com Serra nas intenções de voto.
– Em outubro/2010, Dilma vence as eleições no 2o turno, contra Serra, por 56% a 44%.
Então, vejamos:
– Dilma foi preparada como o “poste” de Lula durante mais de 5 anos, em uma construção lapidada dia a dia.
– o governo Lula chegou, no final de 2010, a 89% de aprovação, recorde mundial de popularidade de todos os tempos- a economia crescia a 7,5%- e, last but not least, Lula tinha a caneta na mão.
Hoje, temos um quadro um pouco diferente:
– Faltando pouco mais de um mês para as eleições, Haddad ainda não foi lançado candidato.
– Na pesquisa mais recente, Haddad aparece com 4% das intenções de voto.
– O último cargo público de Haddad, que lhe deu alguma visibilidade, foi o de prefeito de São Paulo, há pouco menos de 2 anos. Vale lembrar que perdeu a reeleição ainda no 1o turno.
– Haddad foi ministro da educação de Lula há longínquos 8 anos. A única coisa de que consigo lembrar foram as lambanças no ENEM (convenhamos, menos glamouroso que o PAC).
– o PT não tem a máquina federal na mão.
– o PT conta com 256 prefeituras. Em 2010, eram 558 prefeituras.
– o vice de Dilma era Michel Temer, com toda a máquina do PMDB. O vice de Haddad é Manuela D’Ávila.
– Em 2010, Lula era presidente do Brasil. Hoje, Lula está preso e incomunicável.
Claro, tudo sempre pode acontecer. Mas vamos convir que essa transferência de votos parece muito, mas muito mais complicada agora. O fantasma do Lula todo-poderoso, aquela entidade que domina a política brasileira com sua popularidade à prova de bala, parece turvar o discernimento dos analistas. Fala-se de transferência de votos como uma varinha mágica, em que Lula-Midas transforma em ouro até um monte de josta.
Lula gastou muita sola de sapato, planejou muito bem cada passo, para transformar seu poste em presidenta da república. Claramente não é o caso de Haddad, um tapa-buraco de última hora, apenas para marcar a posição do partido. Repito: tudo pode acontecer. Mas uma eventual ida de Haddad ao 2o turno seria uma grande surpresa, inclusive para Lula.