Estatais são para sempre

Na empresa onde trabalho, o descanso de tela do computador lembra aos funcionários diariamente um fato muito importante de segurança digital: “Pense antes de mandar um e-mail. E-mails são para sempre”.

Aviso de mesma natureza deveria aparecer diariamente na tela dos computadores e dos celulares dos políticos: “Pense antes de criar uma estatal. Estatais são para sempre”.

Saúde não é mercadoria, mas custa caro

Em artigo de hoje no Valor, o pesquisador da Fiocruz, Nilson do Rosário Costa, defende uma maior presença do Estado na assistência à saúde. O título do artigo já diz tudo: “Saúde não é mercadoria”, reverberando a presidente do STF, Carmen Lucia.

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Segundo o autor, a saúde não pode ser tratada como uma mercadoria como outra qualquer. A sua falta pode ter efeitos devastadores na vida das pessoas, e a sua necessidade pode chegar sem aviso prévio, acabando com as finanças familiares. Além disso, quem manda no tratamento são os médicos; ou seja, o consumidor não tem muita escolha sobre o que vai precisar comprar.

O autor, no entanto, reconhece que o SUS não tem sido uma boa resposta a essa demanda. Para ele, os gastos estatais com saúde deveriam aumentar substancialmente, para diminuir a dependência dos planos privados, “que são mais caros para os grupos de maior risco”, que seriam justamente os que mais precisam de assistência.

Vejamos.

O gastos da União com saúde devem totalizar algo como R$ 125 bilhões em 2018. Dividindo-se este valor por 205 milhões (população brasileira), temos o montante aproximado de R$50/mês/habitante.

Ou seja, o SUS equivale a um plano de saúde que cobrasse, na média, R$50 de mensalidade. Quanto teria que ser investido adicionalmente para que o sistema público pudesse oferecer serviços minimamente aceitáveis?

Qualquer plano mequetrefe cobra, no mínimo, R$200/mês. Estou aqui fazendo uma média entre os mais jovens e os mais velhos. Quem paga plano de saúde sabe que um plano de R$200/mês deve ser uma josta, mas é só para fazer o exercício.

Digamos, então, que aumentássemos os gastos em saúde para R$200/mês/habitante. Isso significaria quase R$400 bilhões a mais em gastos nessa rubrica. Sem cortar nada de outras rubricas, isso significaria um aumento da carga tributária de aproximadamente 6% do PIB. Obviamente, inviável. E isso, para ter um plano de saúde, repito, beeeeem mequetrefe.

Qual a solução? Não tem solução. O Brasil é um país pobre. Qualquer gasto com saúde sempre ficará muito aquém das necessidades. Enriquecer é a solução.

Uma forma de mitigar o problema é deixar que o mercado distribua os riscos através do oferecimento de seguros, e deixar aos consumidores a escolha de que tipo de risco querem correr. E garantir que, uma vez que o consumidor tenha assumido um determinado tipo de risco, a operadora não seja obrigada judicialmente a cobrir aquele risco a posteriori. Dessa forma, com os riscos devidamente precificados, o sistema seria mais eficiente, maximizando a utilização dos parcos recursos existentes.

A outra alternativa, em que papai Estado paga tudo para todos, só existe na cabeça de quem acha que o governo cria o seu próprio dinheiro.

Extrema-direita

Até mais do que no mundo físico, também na política tudo é relativo.

É o que observamos quando tentamos definir os conceitos de “esquerda” e “direita”.

Além de serem conceitos multifacetados, que envolvem tanto aspectos de moral e costumes quanto aspectos econômicos, definir alguém como “de esquerda” ou “de direita” parece depender da posição daquele que define.

Assim, por exemplo, o PSDB é um partido “de direita” para os petistas e “de esquerda” para os bolsonaristas. Isto o faz ser um partido “de centro” para quem não é nem petista e nem bolsonarista. Então, o PSDB é “de direita”, “de esquerda” ou “de centro”? Depende do ponto de vista de quem define.

Este raciocínio me veio à mente quando eu tentava entender os ataques dos bolsonaristas a Amoêdo. Para os apoiadores do ex-capitão, Amoêdo não é “suficientemente de direita”. Algumas posições ambíguas sobre alguns temas já o fizeram mais vermelho do que carro de bombeiro.

Bolsonaro seria a encarnação da “direita perfeita”, aquela sem mácula. Qualquer impureza já torna a pessoa “de esquerda”. Desconfio que, para piorar a situação, os bolsonaristas não perdoam Amoêdo por ter ousado não abrir mão da sua candidatura em favor do deputado do PSL, em uma “frente de direita”. Esta seria a prova final de seu “esquerdismo”.

Confesso que, não faz muito tempo, quando lia na imprensa que Bolsonaro representava a “extrema direita”, aquilo me incomodava. Como assim? Finalmente aparece alguém que não tem medo de se posicionar firmemente à direita do espectro político, e é apodado pejorativamente de “extrema-direita”? E o que faria de um Boulos simplesmente “esquerda” e de Bolsonaro um “extrema-direita”? Parecia-me tremendamente incorreto e injusto.

E outra questão se colocava: quem seria, então, “direita” no país? Teríamos “esquerda”, “centro” e “extrema-direita”. Do centro para a extrema-direita, sem escalas. Parecia algo sem sentido algum.

Parecia. Até que os apoiadores mais exaltados de Bolsonaro mostrassem a que vieram. Para estes, Amoêdo é “esquerda”. Como Amoêdo claramente está à direita do PSDB, então só tenho como concluir que Bolsonaro é “extrema-direita”, enquanto Amoêdo é “direita”. É uma questão de lógica. Repito, lógica a que me levaram as últimas reações de alguns apoiadores de Bolsonaro.

Não gosto de generalizações. Sempre são injustas. Tenho certeza que a maior parte dos apoiadores do Bolsonaro não apoia esses ataques ridículos a Amoêdo. Seria bom que aparecessem. Mesmo porque, desconfio, este é um modo contraproducente de ganhar votos.

Amoêdo em terceiro

Claro, essas pesquisas todas têm margem de erro, então dizer que Amoêdo está em terceiro lugar na espontânea não quer dizer muita coisa.

O que sim quer dizer muita coisa é que Amoêdo tem na espontânea provavelmente o mesmo nível de lembrança de políticos com quilômetros de rodagem como Alckmin e Marina. O que não deixa de ser um feito.

As consequências vêm depois

Exemplo prático dos efeitos de políticas populistas.

A Caixa tinha mais ou menos o dobro do estoque de imóveis retomados por inadimplência no final de 2012, em relação à média dos bancos privados. Hoje tem 6 vezes.

Ao forçar os bancos públicos a baixarem os juros e rebaixar os critérios para conceder crédito, Dilma contratou uma crise que somente está sendo sentida anos depois.

Como diria o conselheiro Acácio, as consequências vêm depois.

PS.: o BB não aparece nessa estatística porque financiamento imobiliário nunca foi o seu forte. O problema do BB está em outros tipos de financiamento.

Abraço dos afogados

Ainda sobre Bolsonaro e Amoêdo.

Tenho visto com mais frequência defensores da candidatura de Bolsonaro defendendo o voto útil por parte dos eleitores de Amoêdo, ainda no 1o turno, no candidato do PSL. Inclusive, mostram-se ressentidos pelo fato do candidato do Novo não ter aberto mão da própria candidatura, e cerrado fileiras em torno do ex-capitão.

A lógica parece ser a seguinte: se não houver uma união entre os candidatos anti-establishment de direita, este campo corre o risco de ficar de fora do 2o turno. Então, vale desde apelos à “racionalidade” do voto útil no 1o turno até ataques ao candidato do Novo pela sua falta de “credenciais de direita”. Sério, tem post que só falta dizer que Amoêdo tem um pôster do Che no escritório.

Vejamos.

Creio que o objetivo número zero de todos nós do lado de cá é evitar que o PT volte ao poder. Este risco parecia remoto dado tudo o que aconteceu nos últimos anos. Mas sabe como é, o eleitor brasileiro tem uma capacidade infinita de fazer zerda, então essa possibilidade vem crescendo a olhos vistos.

Para os eleitores do Bolsonaro que não concordam com a premissa acima, que ficariam mais contentes com Bolsonaro presidente do que tristes com o PT de volta ao poder, nada do que vai adiante vai fazer sentido. Eu, por exemplo, voto em Amoêdo. Mas abriria mão já do meu voto se alguém me garantisse que, com isso, o PT não ganharia a eleição. É disso que se trata.

Então, tendo esse objetivo principal em mente, podemos ter outro subordinado. Alguns querem o Bolsonaro, outros o Amoêdo, outros o Alckmin, outros a Marina. Para que o meu raciocínio daqui para frente funcione, é preciso concordar que Alckmin e Marina são menos piores que um governo do PT.

Alckmin e o PSDB podem ser “frouxos”, “ladrões”, “esquerdistas”. Mas não fazem sombra à ameaça que um novo governo do PT representaria, tanto em termos de diretrizes econômicas quanto à preservação das instituições. Basta ver o que os petistas têm feito com o judiciário brasileiro, achincalhando a imagem do país aqui e lá fora. Sem contar a promessa de “controle da mídia”, que não é brincadeira. Não dá para imaginar o PSDB fazendo isso.

Já Marina pode até ter “coração de petista”, mas está longe de representar essa máquina de moer instituições em que se tornou o PT. Podemos detestar seu programa de governo, mas nada se compara à mistificação em torno do Dom Sebastião de Curitiba.

Sendo assim, os eleitores de Amoêdo precisam verificar, para decidir sobre o seu voto útil no 1o turno, se: 1) é possível eleger Bolsonaro já no 1o turno ou 2) havendo 2o turno, se o PT tem reais chances de chegar lá, e 3) chegando o PT ao 2o turno, qual o candidato com maiores chances de derrotá-lo.

A hipótese 1 parece mais do que remota. Nem Lula, no auge de sua popularidade, conseguiu eleger-se (ou eleger o seu poste) no 1o turno. Ainda mais em uma eleição tão pulverizada quanto a atual. Esta pulverização parece garantir a existência de um 2o turno, o que nos leva à hipótese número 2.

A hipótese 2 parece cada vez mais provável, dado o incrível nível de intenções de voto do presidiário. Por menor que seja a capacidade de transferência de votos, a base para esta transferência parece estar aumentando. Mas isso só vai ficar mais claro ao longo de setembro. Trata-se de uma questão em aberto.

Se a hipótese 2 der pinta de que vai se confirmar, então o eleitor que quer votar útil deve buscar o candidato que demonstrar mais chances de derrotar o candidato do PT no 2o turno, qualquer que seja ele. Este candidato deve ser o que apresentar menor índice de rejeição.

Em todas as pesquisas, Bolsonaro aparece atrás de qualquer oponente no 2o turno, justamente por conta da sua rejeição. Contra Haddad, Bolsonaro teoricamente aparece na frente, mas este não é um resultado definitivo, dado que Haddad sequer é o candidato do PT ainda. Claro, nenhum resultado é definitivo a essa altura do campeonato, e ao longo de setembro teremos mais elementos para decidir sobre quem tem mais chance de, se for o caso, derrotar o PT no 2o turno.

Em resumo, se eu votar útil no 1o turno, meu voto irá para aquele candidato que tenha mais chance de evitar o abraço dos afogados, com o PT voltando ao poder.