Convicção liberal se testa na prática

A Câmara dos Deputados do RJ aprovou um projeto de lei que concede aumento de 5% aos servidores do Tribunal de Justiça – RJ.

O governador Pezão vetou o projeto, por burlar o Regime de Recuperação Fiscal, acordo que permitiu aporte da União.

A Câmara derrubou o veto do governador. Por unanimidade. No trecho abaixo, as justificativas de três deputados para a derrubada do veto.

22 partidos estão representados na Câmara do RJ. Desde o sedizente liberal DEM, passando pelo cristão novo liberal PSL até o falso liberal PSDB. Nem um mísero voto pela responsabilidade fiscal.

Não tenho dúvida de que, tivesse o Novo representação na Câmara, a votação não teria sido unânime.

Responsabilidade fiscal é palavra que está na boca de todos os candidatos. Mas as convicções das pessoas são testadas na vida real.

Arrasa quarteirão

Aqui está o jingle da campanha de Jânio Quadros à presidência da República, o varre varre vassourinha:

Aqui está a propaganda eleitoral de Fernando Collor, prometendo caçar os marajás e corruptos do serviço público:

Aqui está a peça publicitária dos ratos, da propaganda eleitoral de Lula em 2002:

https://youtu.be/Kx7-6TPz9VU

Uma das poucas vantagens de ser mais sênior é ter passado por mais coisas na vida. Essas campanhas eleitorais me vieram à mente depois de ter visto um vídeo de uma pessoa que não conheço, defendendo o voto em Bolsonaro e não em Amoêdo.

O raciocínio do rapaz era de uma simplicidade cristalina: Amoêdo é um excelente candidato, apto a construir um edifício high-tech maravilhoso. Mas, antes, precisamos de alguém que drene o pântano, limpe o esgoto da política nacional. Para isso, precisamos de um cara de coragem, firme nas suas posições, que não vai se dobrar aos conchavos. E esse cara, claro, só pode ser o Bolsonaro.

Assim, e essa é a conclusão, Bolsonaro é o cara que vai liderar a limpeza que precisamos fazer na política, antes que possamos construir um novo Brasil. O paralelo com as campanhas acima é irresistível.

Jânio, Collor e Lula também prometiam moralizar os costumes políticos e acabar com a corrupção.

Jânio renunciou, Collor foi impichado, Lula está preso.

Nem vou entrar no mérito se cada um deles era sincero ou não em suas promessas. Jânio talvez, Collor e Lula certamente não. Mas isso é o de menos. Bolsonaro pode ter o coração mais reto, a alma mais pura da política brasileira. Ele pode realmente estar bem intencionado. Não importa.

O que realmente faz uma sociedade avançar não é um “salvador da pátria”, aquele que vai “prender e arrebentar”. O avanço da sociedade é fruto de instituições sólidas, construídas no ir e vir, nos acertos e erros da sociedade civil. Imprensa, Governo (em todos os níveis e dimensões), Opinião Pública, cada qual fazendo a sua parte.

Claro, o Presidente da República pode ser um indutor. No entanto, a experiência mostra que induzir não significa “política de terra arrasada”. E é este tipo de política que, aparentemente, vários bolsonaristas defendem e esperam. A História mostra que, na política de terra arrasada, o único que acaba arrasado é o próprio presidente.

Guardadas as devidas diferenças, a promessa de “sanear a política” é tão demagógica quanto a promessa de “dar educação, saúde e dinheiro para todos”. O avanço tanto da política quanto da economia demanda a construção de instituições sólidas, que não se fazem da noite para o dia. Dizer que basta a presença de um cara macho e honesto no Palácio para que os políticos se comportem é, para dizer o mínimo, ingenuidade.

Claro, o voto em Bolsonaro pode ser justificado como um primeiro passo para mexer com as estruturas na direção correta. Mas, neste caso, a eleição de Amoêdo também significaria este passo. Se eu não espero por um “salvador da pátria”, Amoêdo passa a ser um bom nome.

Esta é uma eleição com muitas nuances. São vários os cenários possíveis, e vou somente decidir o meu voto na véspera da eleição. Posso votar útil sim ainda no 1o turno, se isto significar diminuir as chances do PT voltar ao governo. Mas, em princípio, meu voto continua sendo do Amoêdo.

Por que os venezuelanos não conseguem ajuda?

O Alto Comissariado da ONU para Refugiados (não consigo ler esse nome sem pensar nos comissariados da Nomenklatura) está preocupado. Afinal, não consegue arrecadar dinheiro para ajudar os refugiados venezuelanos, apesar de, dizem, já serem em maior número do que os refugiados sírios.

Talvez o Alto Comissariado devesse rever o seu conceito de “refugiado” para entender o que está acontecendo.

Refugiado é alguém que escapa de uma tragédia infligida por terceiros. Uma guerra ou uma catástrofe natural são os típicos exemplos de tragédia.

No caso da Síria, a guerra civil tomou proporções muito maiores do que simplesmente a luta entre facções internas. O que começou como um levante inspirado pela chamada “primavera árabe” em 2011, se transformou em um campo de batalha que envolve curdos, sunitas, xiitas, Estado Islâmico, Turquia, Hesbollah, Rússia, EUA, OTAN, Irã, Arábia Saudita, Qatar,… esqueci alguém? Várias guerras sendo travadas ao mesmo tempo por atores que se entrelaçam em um balé insano. No meio disso tudo, a população não engajada, que se torna refugiada.

E a Venezuela? Bem, a Venezuela não está em guerra civil. Há protestos como em qualquer lugar do mundo, mas longe de uma guerra civil. Também não houve uma catástrofe natural.

O que está acontecendo na Venezuela são simplesmente as consequências de uma gestão econômica patética, realizada por um governo democraticamente eleito. Ok, a essa altura do campeonato, não podemos mais chamar aquilo de democracia. Mas Chávez, e depois Maduro, chegaram aonde chegaram porque o povo assim o quis. Ainda hoje, há forte apoio popular ao governo, algo quase messiânico.

Então, por que alguém doaria dinheiro para um “refugiado” venezuelano? Poder-se-ia dizer que a situação dos venezuelanos é a mesma das crianças em uma família cujo pai é viciado em jogo e a mãe bebe. Essas crianças estão desamparadas e fogem de casa. Neste caso, as crianças não têm culpa, e devem ser ajudadas.

Mesmo que esse paralelo fosse verdadeiro, a primeira exigência de quem fosse ajudar seria retirar o pátrio poder do pai que joga e da mãe que bebe. Caso contrário, o fluxo de crianças desamparadas seria interminável. Qualquer ajuda seria como enxugar gelo. Sem a substituição do governo venezuelano, qualquer ajuda significa desperdício de recursos.

Além disso, os venezuelanos não são crianças. O povo venezuelano construiu sua própria sorte, por ação, conivência ou omissão. Hoje estão colhendo os frutos de suas próprias escolhas, não há ninguém externo a se culpar, ao contrário da Síria. No Brasil, os cidadãos, ao notarem que estavam indo pelo mesmo caminho, derrubaram do governo o partido amigo de Chávez e Maduro.

Mas talvez o Alto Comissariado da ONU não esteja preparado para admitir que a crise venezuelana seja fruto do socialismo bolivariano do século XXI. E vai continuar procurando os motivos para as baixas doações nos lugares errados.

Quem será o verdadeiro presidente

Gilberto Carvalho revela o esquema:

1. Haddad é eleito.

2. O presidente Haddad indulta Lula.

3. Lula é nomeado ministro da Casa Civil.

4. Lula governa como o presidente “de facto”. Haddad passa a ser apenas um “presidente-fantoche”.

Se, em um hipotético 2o turno entre Haddad e Bolsonaro, eu ouvir alguém defendendo o voto em Haddad em nome da “governabilidade”, da “moderação”, da “modernidade”, da “preservação da democracia”, sou capaz de partir para as vias de fato.

Um estilo difícil

Assisti ao monólogo de Paulo Guedes na Globo News.

Sim, porque aquilo não foi uma entrevista, foi um monólogo. Os jornalistas mal conseguiram fazer cinco perguntas em um programa de uma hora de duração. Guedes dava a volta pela China para chegar na Penha, mesmo em perguntas em que ele tinha boas respostas. Ou seja, não foi enrolação, trata-se de um estilo. O estilo de alguém que não ouve, o que é muito ruim para um administrador público, que precisa chegar a consensos.

Na iniciativa privada, o empresário tem uma visão, e seus empregados obedecem. É o consumidor que, no fim do dia, vai definir se o empresário está correto ou não.

Na administração pública é um pouco diferente. O político deve chegar a consensos. Guedes reconhece isso, ao afirmar que mira o céu para chegar a um meio-termo. Mas, a julgar pelo monólogo, será difícil a conversa.

As ideias do economista treinado em Chicago são já conhecidas. São todas muito boas. A sua postura, no entanto, me preocupou. Quando jornalistas tarimbados mal conseguem balbuciar uma questão, fico imaginando a conversa com gente sem muita paciência, a começar do próprio presidente.

O bode expiatório perfeito para governos incompetentes

“Temos que enfrentar os bancos. Bancos foram feitos para serem enfrentados. Nós não temos mais paciência com esses caras.”

Esse é Fernando Haddad, na Paraíba, ontem.

Banco é um troço muito simples: trata-se de um lugar que faz a intermediação entre pessoas com excesso de dinheiro e pessoas que precisam de dinheiro. A isso chamamos de crédito.

O crédito, segundo o programa do PT, deve ser a mola propulsora do novo ciclo de desenvolvimento do país.

Assim, ligando uma coisa à outra, o que Haddad disse foi: “vamos obrigar os bancos a fornecerem crédito barato”.

Lembro como se fosse hoje. Corria o ano de 2004 e, certo dia, meu finado pai me contou, todo contente, que tinha aberto uma conta no Citibank. Além do status, o banco lhe havia garantido uma linha de crédito no cheque especial de R$10 mil.

“Tenho conta no Bradesco há 30 anos, e o meu cheque especial tem mil reais de limite”, contou, não sem uma ponta de mágoa.

Pensei cá com meus botões: se o Bradesco, com 30 anos de histórico, deu só mil reais de limite, motivo deve ter.

Não deu outra. Pouco mais de 10 anos depois, coube a mim renegociar as dívidas de meu pai na esteira da maior recessão da história (isso foi anos antes do programa Limpa Nome do Ciro que o PT roubou). Adivinha quem era, de longe, o maior credor? Exato, o banco americano que achou que sabia dar crédito no Brasil. O resto é história: poucos anos depois, o Citi encerraria suas operações de varejo no país, ajudando a concentrar, ainda mais, o mercado bancário.

Intermediar crédito é uma arte. Significa antecipar a inadimplência esperada, e cobrar um spread suficientemente alto para compensá-la. Para isso, o histórico do cliente e uma certa previsão sobre o ciclo econômico são as únicas bases sobre as quais o banco se apoia.

Quando, em 2012, Dilma “perdeu a paciência” com os bancos e forçou a redução dos spreads por parte dos bancos públicos, os bancos privados recuaram e perderam market share. Pensei cá com meus botões: se os bancos privados não acompanharam a redução dos spreads, aí tem.

Foi só uma questão de tempo para que a inadimplência aumentasse, na esteira da maior recessão do País.

O curioso é que, no raciocínio do PT, tanto na época quanto hoje, o crédito mais barato faria “a roda da economia girar”, o que, por si só, garantiria o pagamento desses empréstimos. Faltou combinar com os russos, ou melhor, com os agentes econômicos, que se retraíram diante da crescente intervenção do Estado no domínio econômico. Se ontem foi o setor elétrico e hoje são os bancos, amanhã poderei ser eu a sofrer nas mãos de um governo discricionário. Ninguém investe em um ambiente desses e, sem investimento, a demanda criada pelo crédito fica pendurada na broxa.

Mas Haddad, claro, é diferente de Dilma. Ele sabe que não se reduz spread por decreto. Por isso, ele propõe um imposto sobre o spread. Alexandre Schwartsman, em recente artigo na Folha, demonstra que esse imposto aumentaria o spread justamente para os que mais precisam de crédito, pois o custo seria repassado pelos bancos.

No limite, os bancos saem do mercado, deixando de dar crédito. Talvez seja esse mesmo o sonho de Haddad e dos economistas do PT: um mercado de crédito dominado pelos bancos públicos, que teriam, ao mesmo tempo, sensibilidade social e sentido de missão. Sensibilidade e sentido que seriam pagos, no final do dia, pelo contribuinte, quando o Tesouro fosse chamado a capitalizar esses bancos para cobrir a inadimplência de empréstimos mal dados.

Bancos são o bode expiatório perfeito para governos incompetentes.

Não há como Bolsonaro vencer um debate

Segundo reportagem do Estadão, estima-se que o debate entre Collor e Lula, em 1989, tenha sido assistido por 100 milhões de pessoas. Já a audiência do último debate entre Dilma e Aécio em 2014 foi de 1,5 milhão de domicílios, ou 6 milhões de pessoas.

As regras rígidas e o crescente cansaço com a política podem explicar essa brutal queda de audiência.

Os debates, portanto, valem pela sua repercussão na imprensa nos dias seguintes mais do que pela audiência em si.

Segundo essa repercussão, Marina foi a grande ganhadora do debate na Rede TV, e Bolsonaro o grande perdedor.

Eu assisti e não vi nada disso. Vi, repito, um embate equilibrado nas ideias e uma vantagem de Bolsonaro na postura, pois Marina mostrou desequilíbrio ao tentar interrompê-lo fora das regras. Fosse uma luta de boxe, eu daria vitória por pontos para Bolsonaro, mas poderia discutir um empate. A imprensa deu vitória de Marina por nocaute.

Bolsonaro sacou que não tem como ser vencedor de nenhum debate. O resultado já está dado.

Ele considerou que é melhor perder de W.O. do que de goleada. Talvez seja uma boa tática para o 1o turno, aliás, tática usada com frequência pelos líderes isolados no 1o turno. Vamos ver.

O Instagram não vai derrubar a página do PT

Começou a circular no WhatsApp um banner (foto 1) de campanha do PT com o mesmo programa do Ciro (foto 2).

Elena Landau, que postou o banner no seu Twitter, mostra o print do Instagram de onde tirou o banner, pois foi questionada (foto 3).

Fui procurar no Instagram nessas hashtags e não encontrei nada.

O fato é que alguém gastou tempo para fazer uma arte profissional que, no mínimo, semeia a dúvida no eleitorado.

O jogo sujo já começou.

Mas não, o Instagram não vai derrubar a página do PT.

O Brasil continua o mesmo

Publiquei o post abaixo há um ano.

Não, a Eletrobrás não foi privatizada.

Sim, o Brasil continua o mesmo.


O anúncio da privatização da Eletrobrás, além de todos os méritos óbvios, tem mais um ainda pouco percebido, mas muito importante: começa a tornar plausível, imaginável, um cenário em que a Petrobras possa ser privatizada.

Antes do anúncio da privatização da Eletrobrás, a privatização das vacas sagradas do Estado brasileiro (Petro, Eletro, Banco do Brasil e Caixa) era apenas um delírio de liberais insanos, que não tinha a mínima, a mais remota chance de acontecer.

Sem querer comparar a Eletro com a Petro (são empresas que estão em patamares diferentes no imaginário do perfeito idiota latino-americano), somente o fato de a privatização da Eletrobrás ter sido anunciada move a privatização da Petrobras do campo dos unicórnios e duendes para o campo da viagem para a Lua. Muito difícil, mas possível, afinal.

Não é nada, mas é muito, em um país ainda preso a fetiches do século XX.

Fale com a ex-presidente Dilma

Da coluna de Maria Cristina Fernandes, hoje, no Valor:

“[…] resposta de um integrante do Centrão à indagação sobre como fariam para lidar com um Haddad presidente: ‘Vamos dar para ele um cartão com o telefone da ex-presidente Dilma’”.

O mesmo vale para Bolsonaro e Marina.