Não precisamos de outra seita

Alguns eleitores do Bolsonaro surtaram em relação ao Amoêdo e seus eleitores. A coisa passou muito da crítica política, chegou à ofensa pessoal mesmo. E com argumentos que fariam o orgulho de qualquer petista, pelo seu descolamento da realidade.

Se o objetivo é virar votos para Bolsonaro, receio que seja um tiro no pé. Eu mesmo, que não tinha rejeição ao ex-capitão, estou começando a pensar duas vezes: se este é o tipo de reação que Bolsonaro gera em seus eleitores, então só mudaremos a seita empossada no Palácio do Planalto. E, definitivamente, não precisamos de outra seita.

O culpado não foi a Lei Rouanet

Vejo muita revolta com o fato de que dinheiro da Lei Rouanet foi utilizado para eventos comerciais e nada foi para o finado Museu Nacional. A lista inclui shows da Claudia Leitte, Cirque du Soleil, filme sobre José Dirceu, poesias de Maria Betânia, Queermuseu, turnês de Luan Santana, Detonautas, Peppa Pig e por aí vai.

Quem me acompanha sabe que sou crítico feroz da Lei Rouanet. Subsidiar o Cirque du Soleil ou a Peppa Pig com o dinheiro dos desdentados é daquelas coisas que vão garantir aos seus responsáveis um círculo bastante apertado no inferno. Mas é preciso entender como funciona a Lei Rouanet para que se compreenda porque a Peppa Pig recebeu dinheiro e o Museu Nacional, não.

Grosso modo, a Lei Rouanet funciona da seguinte maneira: o dono do projeto precisa montar um case, preencher certos requisitos de um comitê do Ministério da Cultura, colocar o projeto debaixo do braço e sair na rua tentando convencer empresas a patrocinar o seu projeto em troca dos subsídios fiscais garantidos pela Lei Rouanet.

Note que, por mais que não custe nada para a empresa, ninguém quer associar seu nome a um projeto ruim. Analisar um projeto custa tempo dos responsáveis pelas áreas de Marketing e Finanças da empresa, que devem lidar com uma burocracia razoável. Então, os projetos são muito bem selecionados.

Agora, imaginem a cúpula da UFRJ desenvolvendo um projeto desse porte, com o grau de exigência das empresas privadas. Consta que, no projeto submetido ao BNDES, não havia sequer previsão de recursos para medidas de prevenção a incêndios! Tiveram os próprios técnicos do BNDES que completar o projeto com medida tão óbvia.

Mas a falta de competência técnica é o menor dos problemas. A grande questão, como já disse aqui, é a mentalidade. O PSOL tem ojeriza à iniciativa privada. Há uma desconfiança profunda em relação ao capital. E a Lei Rouanet tem como pressuposto básico a parceria entre artistas e empresas (usando o seu dinheiro, mas esse é só um detalhe que não vem ao caso aqui).

Como bons psolistas, provavelmente a cúpula da UFRJ não via com bons olhos submeter um projeto de renovação do Museu Nacional a empresas privadas. E, pior, mendigando patrocínio ao grande capital! Heresia das heresias! A saída via BNDES era mais aceitável, e foi a opção escolhida.

Portanto, não cabem as comparações entre os projetos da Lei Rouanet e o Museu Nacional, como se o comitê do Ministério da Cultura preferisse a Peppa Pig em relação a Luzia. Quem preferiu a destruição do Museu a pedir dinheiro a empresas foi a cúpula da UFRJ. Essa ojeriza ao capital privado custou 200 anos de história.

Descobriram a restrição orçamentária

23:59 Porque esse teto de gastos é um crime, não vai ter dinheiro pra saúde, pra educação

00:00 Porque vocês precisam entender como funciona um orçamento. A UFRJ não tinha dinheiro pra manutenção do Museu porque tinha outras despesas obrigatórias, como salários.

Bastou a batata do reitor do PSOL começar a assar, o pessoal começou a dar lição de restrição orçamentária.

Isso é tudo o que precisamos saber

Os recursos repassados para a UFRJ pelo governo Temer cresceram de 2015 para cá.

Os recursos repassados para o Museu Nacional pela cúpula da UFRJ, formada por filiados do PSOL, diminuíram de 2015 para cá.

Isso é tudo o que sabemos até o momento.

Haddad não será o próximo presidente da República

Hoje participei de uma reunião com conhecida e respeitada consultoria política.

A análise foi mais ou menos a seguinte: Haddad está praticamente no 2o turno porque a identidade partidária do PT (pessoas que se identificam com o partido) está em 24%, e as intenções de voto em Lula somam 39%.

Alguém então perguntou, em um misto de melancolia e revolta: “então, o impeachment ajudou o PT?”

A resposta foi a seguinte: “o impeachment e a prisão de Lula foram a melhor coisa que poderia ter acontecido ao PT”.

Reportagem do Globo lembra que, 10 dias após a condução coercitiva de Lula, o chefão do PT tinha 17% das intenções de voto, contra 23% de Marina Silva, segundo pesquisa DataFolha. Dois anos e meio depois e uma campanha sem precedentes contra as instituições, Lula atingiu 39% das intenções de voto, o que parece dar razão à consultoria.

No entanto, imaginemos que o impeachment não tivesse ocorrido e Lula estivesse livre, leve e solto. A teoria dessa consultoria é que o governo Dilma chegaria a essas eleições na lona, sem competitvidade nenhuma. Seria presa fácil de seus próprios erros.

Essa análise, com todo respeito, é de botequim. Tem como premissa que o PT joga a regra do jogo democrático. O exemplo de como as instituições poderiam ser manipuladas para manter o partido no poder é a Venezuela. A economia está na lona não é de hoje, mas Chávez, e agora Maduro, “ganham” eleição após eleição. E, quando não ganham, mudam as regras do jogo sem nenhum pudor.

Lula e o PT já mostraram seu “amor” pelas instituições nesses últimos dois anos. Isso, longe dos instrumentos de poder. Imagine essa patota com a caneta na mão. Lula estaria eleito no 1o turno, independentemente do estado da economia.

FHC teve a brilhante ideia de deixar Lula “sangrar” após o mensalão, quando um impeachment teria sido possível, na esperança de que seu governo chegasse na lona nas eleições de 2006. O resultado foram mais três mandatos do PT.

É sempre muito difícil qualquer análise das possibilidades históricas, pois não existe o contra factual. Dizer que o impeachment e a prisão de Lula ajudaram o PT é uma análise rasa, que parte simplesmente dos números. Desconsidera a incrível capacidade de mistificação de Lula e seus asseclas do PT. Capacidade esta que seria multiplicada se ainda tivessem acesso aos instrumentos de poder.

Sim, o impeachment foi a coisa certa a se fazer.

E não, Haddad não será o próximo presidente da república.

Como um plano para salvar o Museu Nacional fracassou

Dando continuidade ao assunto, leia a história de Israel Klabin e sua tentativa de arrumar um empréstimo de US$80 milhões do Banco Mundial para o Museu Nacional, e que esbarrou na negativa da então diretoria da UFRJ de abrir mão da governança do Museu:

Como já dissemos, ninguém é louco de dar dinheiro na mão dessa patota.

Nomenklatura

Ainda a Globo News.

Um dos “analistas” pergunta, indignado: “onde estão os mecenas brasileiros? Tantos museus lá fora são sustentados por milionários. Aqui preferem mandar o dinheiro para paraísos fiscais”.

Quero saber quem é o louco que vai entregar dinheiro na mão dessa nomenklatura que dirige a UFRJ.

A Globo merece essa homenagem

Take ao vivo do Museu na Globo News.

“Manifestantes” se aproximam do cordão de isolamento formado pela Guarda Municipal. Mais cedo, tinham tentado invadir e foram dispersos com gás lacrimogêneo.

A repórter da Globo News descreve assim o momento: “vemos agora os manifestantes se aproximando para prestar sua homenagem ao Museu. Foi tudo combinado, trata-se de uma manifestação pacífica”.

Ao fundo, o coro bastante audível: “Globo golpista! Globo golpista!”

A Globo merece essa homenagem.

Vítima de uma mentalidade

O Museu Nacional é de responsabilidade da UFRJ.

Meu amigo Marcelo Gerbassi mandou-me a lista dos responsáveis atuais pala UFRJ:

Reitor: ROBERTO LEHER – filiado ao PSOL;

Vice-reitora: DENISE FERNANDES LOPEZ – filiada ao PSOL;

Pró-reitor de graduação: EDUARDO GONCALVES – filiado ao PCB;

Pró-Reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças: ROBERTO ANTONIO GAMBINE MOREIRA – filiado ao PC DO B;

Pró-Reitora de Extensão: MARIA MELLO DE MALTA – filiada ao PSOL;

Pró-Reitor de Pessoal: AGNALDO FERNANDES – filiado ao PSOL;

Decano do CCJE: VITOR MARIO IORIO – filiado ao PSOL

Provavelmente, essas filiações partidárias não mudaram ao longo dos anos.

A mentalidade dessas pessoas é a seguinte: Cultura não é mercadoria. Portanto, é obrigação do Estado financiar a Cultura, através da arrecadação de impostos. Parcerias com a iniciativa privada estão fora de cogitação, para “manter a independência de interesses mercantilistas”.

Em 2010, a mesma UFRJ retomou o Canecão. Finalmente, a mais famosa casa de espetáculos do RJ estaria livre dos tais “interesses mercantilistas”. Hoje, o Canecão está em petição de miséria.

O Museu Nacional não foi vítima apenas da falta de dinheiro. Foi vítima, antes de tudo, de uma mentalidade. A mesma mentalidade que mantém o país refém da pobreza.