Alea jacta est

Da página de Eduardo Affonso

Amanhã vou tirar um sábado sabático e não falar nem pensar em política.

A menos que vaze a delação do Marcos Valério, o Haddad adquira vida própria ou o Mourão dê mais um tiro no pé, nada haverá a dizer, e tudo já terá sido dito por quem entende melhor de pesquisas e tendências ou tem trânsito nos bastidores (o FB comprovou que deixamos de ser 200 milhões de técnicos de futebol para nos tornar 200 milhões de analistas políticos).

Mas lembra quando a professora mandava, ao término da leitura de um livro, fazer o “fichamento”? Vamulá.

1.

“Nem quem ganhar nem quem perder vai ganhar nem perder.” Sábias palavras. O grande vencedor desta eleição, mesmo perdendo, será o Lula.

Trancafiado na carceragem da Polícia Federal, ele fez (impunemente) propaganda irregular no rádio e na televisão, campanha no New York Times, comício no Le Monde, e só não ligou o megafone na Folha de São Paulo porque o Fux puxou o fio da tomada.

Cravou dois postes, um no PT e outro no PSOL; furou o olho do ex-atual-futuro aliado do PDT; escolheu (e conseguiu, com o PSL) o adversário dos seus sonhos para levar ao (possível) segundo turno.

Se seu avatar vencer, Lula vai obsedar a política brasileira pelos próximos quatro – ou quarenta – anos, cravar uma estaca no coração da Lava-Jato e terminar o serviço do petrolão. Se perder, seu partido voltará a ser a baliza ética na nação, o bastião da moralidade pública, o bote salva-vidas dos valores mais puros – além da vanguarda na luta contra o “fascismo”.

2.

Bolsonaro corre o risco de ser eleito não pela direita, mas pelo avesso. Mais que pelo voto útil ou ideológico, pelo voto vingança.

É o sujeito errado, na hora errada, com as concepções de mundo erradas, mas o universo parece conspirar a seu favor.

Se parar de defender torturador e de bater boca com as minorias, pode ser que tenhamos a chance de ver que o conservadorismo não é nenhum bicho papão, e, sim, um contraponto necessário. E que (clichê dos clichês) a alternância no poder é saudável à democracia.

3.

O grande derrotado (além do bom senso) é o PSDB. Alckmin tinha todo o tempo do mundo no horário eleitoral e o maior arco de alianças. De bônus, a melhor vice disponível no mercado. Faltou combinar com os russos.

4.

Ciro foi o bronco de sempre.

E ainda vai se prestar ao papel da noiva abandonada no altar que engole o choro e topa ser a amante.

5.

O Troféu Abacaxi vai para Marina, que largou bem e depois foi ladeira abaixo.

Pena.

Teria sido (sem trocadilho) uma alternativa.

6. O melhor desempenho foi o do João Amoêdo. Num partido novo (com trocadilho), sem verba pública e sem poder participar dos debates na televisão, conseguiu superar Meirelles (MDB) e Álvaro Dias (Podemos), e encostar em Marina (Rede).

Em 2022 (toc toc toc), tudo vai ser diferente.

7.

Cabo Daciolo foi a revelação (divina), e a nação repreendida sentirá falta do alívio cômico que ele proporcionou nesta novela de suspenses, traições, facadas e notícias falsas.#gloriaadeuxxx

8.

Por fim, esta foi uma eleição que ignorou (à exceção de um) todos os ex-presidentes vivos (ou mortos-vivos).

Ninguém deu a menor pelota para Sarney, Collor, FHC, Dilma ou Temer (que já é ex-presidente há algum tempo, e não sabe).

Se isso é bom ou ruim, não faço ideia. Só é um consolo imaginar que daqui a quatro anos talvez olhemos para trás e vejamos que este apocalipse de domingo que vem não foi o fim do mundo.

Bom fim de semana, boa eleição e “alea jacta est” (“agora Inês é morta”, em latim).

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