Cenários

Cenário 1: Bolsonaro consegue impor a sua agenda com a força das ruas. 308 deputados votam a reforma da Previdência sem qualquer tipo de negociação. O pacote passa inteiro. A economia deslancha e Bolsonaro é reeleito em 2022.

Cenário 2: Bolsonaro cede e negocia cargos e pontos da reforma. A reforma passa com alguns descontos. A economia deslancha e Bolsonaro é reeleito em 2022.

Cenário 3: Bolsonaro, fiel à sua agenda, não negocia, e a reforma da Previdência não é aprovada. A economia vai para o buraco e Bolsonaro até tenta colocar a culpa no Congresso. Mas, como no Brasil, tudo é sempre culpa do presidente, Bolsonaro é derrotado em 2022. Se conseguir chegar até lá, claro.

Qual desses cenários é o mais provável?

Não vai ser nada bonito

Na sexta-feira, o mercado começou a precificar dificuldades maiores para a aprovação da reforma. Mas ainda assim, uma aprovação.

Com declarações dessa natureza, o mercado logo vai começar a precificar a NÃO aprovação. Não vai ser nada bonito, garanto.

A refundação do Brasil

Este é o outro lado da moeda da entrevista de Rodrigo Maia. Filipe Martins representa o “núcleo duro” do bolsonarismo, um movimento que tem a pretensão de refundar o Brasil sobre novas bases éticas.

Para tanto, prega a ligação direta do “povo” com o presidente, levando o Congresso, com a força “das ruas”, a votar o que o Executivo quer. No limite, “as ruas” governariam.

Bem, isso é tudo, menos democracia representativa. No regime político em que vivemos, o povo elege seus representantes, e estes se entendem sobre quais leis serão aprovadas e rejeitadas. Ao propor a “ligação direta” do povo com o presidente, Filipe propõe um outro sistema político.

– Ah, mas Filipe Martins não está propondo o fechamento do Congresso. O que ele propõe é que o “povo”, “aquecido” pelo governo, force, nas ruas, os seus deputados a votarem o que é bom para o Brasil. Bem entendido, tudo o que Bolsonaro propõe é para o bem do Brasil.

Muito legítima a pressão das ruas. Quando existe. O povo tem mais o que fazer do que ir para as ruas toda hora. Eu e milhões fomos às ruas para derrubar Dilma e o PT. Mas, para que isso aconteça, é necessária uma situação muito grave.

Filipe Martins tem a ilusão de que aqueles milhões que foram às ruas são aliados automáticos de Bolsonaro, e que sairão às ruas com um simples toque de Twitter. Lula e o PT tinham a mesma ilusão, e achavam que o “povo”, tão beneficiado por suas políticas, iriam às ruas para defendê-los. Deu no que deu.

Derrubar as velhas práticas políticas (entenda-se bandidagem) não significa passar por cima das legítimas instâncias políticas. É este o recado de Maia, e que deveria ser levado a sério por Bolsonaro.

A construção da base parlamentar

Quando aqui critiquei a postura de Janaína Paschoal em sua derrota acachapante para Cauê Macris pela presidência da Assembleia Legislativa de São Paulo, muitos responderam que, se era para compactuar com a “velha política”, foi melhor ter perdido mesmo.

O que precisa ser entendido de uma vez por todas é que não existe “velha política” e “nova política”. O que existe é “política” e “caso de polícia”. Quando o governo Bolsonaro se recusa a fazer política, está implicitamente chamando todos os políticos de bandidos. Pois se não é política, só pode ser caso de polícia.

É isso o que Rodrigo Maia praticamente desenha para Bolsonaro em entrevista de hoje no Estadão. Destaquei o trecho abaixo porque me parece sintetizar a ideia central, mas a entrevista toda deveria ser lida e meditada pelo presidente e sua entourage.

– Ah, mas Maia é o Botafogo da planilha da Odebrecht, é bandido também, é o número 1 na fila para achacar o governo.

Se Maia tiver contas a prestar à justiça, ele as prestará, como provam as prisões de Lula, Temer e do seu sogro Moreira Franco. Por enquanto ele é o presidente da Câmara, da qual Bolsonaro depende se não quiser que seu governo termine antes mesmo de ter começado.

Política é diálogo e compartilhamento de espaços de poder de modo a formar consensos. Há muito espaço para o diálogo antes de se entrar na seara policial. Para o bem do Brasil, é bom que Bolsonaro entenda isso antes que seja tarde demais.

Caos no aeroporto

Ontem foi minha vez de enfrentar o caos de Congonhas. O prefeito Bruno Covas conseguiu piorar algo que já era muito ruim.

Mas o culpado último pelo caos deve ser buscado lá atrás, bem mais lá atrás.

Congonhas é um aeroporto acanhado, que está longe de poder suportar o 2o maior tráfego aéreo do Brasil, perdendo somente para Cumbica. Simplesmente não há espaço para todos os passageiros que embarcam e desembarcam todos os dias. Somente um transporte de massas bem estruturado poderia resolver o problema.

Chegamos então no culpado-mor pelo caos, um outro tucano de alta plumagem, que prometeu o monotrilho da linha ouro para a Copa do Mundo. Não de 2018, a de 2014. Este monotrilho um dia ligará Congonhas ao sistema de metrô. Um dia.

Se o autointitulado “gestor” tivesse atrasado a obra em “somente” 4 anos, hoje não estaríamos imprecando contra seu filhote político. Prefeito Bruno Covas, quando você perder a próxima eleição, já sabe de quem é parte da culpa.

Uma hipótese de probabilidade zero

A pergunta abaixo foi feita para o economista Hélio Zylberstajn, professor da FEA e especialista em previdência.

A resposta quer dizer mais ou menos a seguinte: a hipótese de não aprovação da reforma é tão catastrófica que não pode acontecer. Não vou ficar aqui discutindo um evento de probabilidade zero.

O mercado financeiro hoje tem como favas contadas a aprovação da reforma. A discussão se trava no nível da desidratação. As múltiplas trapalhadas do governo (entre as quais a reforma dos militares foi apenas mais uma) e a queda abrupta de sua popularidade são tratadas no melhor estilo “self-denial”.

Reformar o sistema previdenciário, que representa 45% de todos os gastos do governo, requer um fôlego e tirocínio político que é para poucos. FHC não conseguiu aprovar a idade mínima, Lula mexeu apenas na previdência do funcionalismo, Temer não conseguiu levar a reforma à votação. Isso para citar os últimos três políticos de verdade que ocuparam a cadeira presidencial.

Hoje temos Bolsonaro. E a reforma mais ambiciosa da história será aprovada por gravidade. Assim é se assim lhe parece.

Patetice

Talvez a genialidade política de Bolsonaro seja tão genial, que os pobres mortais não a estejamos alcançando.

Ou talvez Bolsonaro seja apenas um pateta.

Saberemos dentro de poucos meses.

Os militares e as abelhas

No desenho animado “Bee Movie”, um grande momento na vida das abelhas acontece quando elas ficam conhecendo a atividade a que se dedicarão pelo resto de suas vidas. O filme é engraçadinho, com o protagonista se rebelando contra seu destino de abelha-operária e metendo-se a ser abelha coletora de pólen.

Os seres humanos não somos abelhas. Não nascemos com uma ocupação predestinada. Temos o livre-arbítrio para escolhermos o que queremos ser, dentro de nossas circunstâncias históricas e pessoais. Não significa que possamos ser qualquer coisa, mas dentro de um campo de escolhas, temos várias possibilidades.

Lembrei-me deste filme a respeito da reforma da previdência dos militares. A classe defende que é “diferente”, que não possui uma série de “privilégios” de outras categorias e que, portanto, teria direito a privilégios em suas aposentadorias.

Ora, não somos abelhas. Ninguém obriga ninguém a ser militar. A pessoa decide ser militar por sua livre e espontânea vontade. Com tudo o que significa a carreira militar, incluindo “não ter FGTS” e “ficar 100% do tempo disponível”.

Não vou aqui entrar no mérito de que o FGTS é um seguro para quem pode ser demitido e ficar 100% do tempo disponível não é uma exclusividade dos militares (médicos, advogados e executivos de empresas que o digam). Meu ponto é outro.

Se os militares argumentassem com uma eventual dificuldade de atrair novos soldados para a carreira militar, aí sim estaríamos tratando de um problema econômico. Neste caso, a carreira militar estaria precisando ficar mais atraente para equilibrar demanda e oferta. Mas não parece ser este o caso. Há, pelo que tudo indica, excesso de contingente. A carreira militar precisaria ser MENOS atraente e não MAIS. O Estado brasileiro poderia gastar menos com seus militares e mais, por exemplo, com equipamentos militares.

Ao tratar a reestruturação da carreira e a sua reforma mais branda de suas aposentadorias como uma questão de “justiça”, os militares entram em um terreno pantanoso. O que é “justiça” neste caso? Quantas outras categorias poderiam (e efetivamente deverão) alegar “injustiças” para requerer a manutenção ou aumento de seus privilégios? Cada categoria tem as suas peculiaridades, e saberão explora-las no trâmite da reforma. A única abelha que não consegue defender seus “privilégios” é a operária. Por sinal, é a abelha que produz o mel para toda a colmeia.

Inquérito fake

O juiz Marcelo Bretas, em sua decisão de ontem, critica a iniciativa de Toffoli de instaurar inquérito por conta própria.

Em tempo: Bretas passou no concurso público para juiz.