O caminhoneiro quer frete

O governo anunciou ontem uma série de medidas que, em tese, atendem às reivindicações dos caminhoneiros. Hoje, matéria do Estadão descreve a reação dos caminhoneiros. Se eu pudesse resumir em uma frase, seria “o governo só pode estar de brincadeira”.

Em determinado momento, algum sindicalista diz: “há um excesso de 300 mil caminhões. O que o pessoal quer é frete”. Aqui está o ponto central do imbróglio.

O Brasil tem 12 milhões de desempregados. O caminhoneiro com seu caminhão não se considera um desempregado. Mas deveria. É o mesmo fenômeno: não há trabalho.

Pra que serve financiamento, tabela de frete, área de descanso etc, se não há frete?

Os caminhoneiros entenderam a série de medidas como uma cortina de fumaça para disfarçar a impotência do governo. Assim como o mercado financeiro entendeu como uma cortina de fumaça as declarações de “independência” da Petrobras, mas voltar o reajuste que é bom, nada.

Churchill, quando anunciou a guerra, não dourou a pílula nem lançou mão de cortinas de fumaça. Prometeu apenas “sangue, suor e lágrimas”.

Mas Churchill era um estadista, não um populista.

Apego

O apego a estatais de nossos governantes é algo que chega a ser tocante.

O caso em tela é a Cedae, companhia de saneamento básico do RJ, a única empresa do Estado que ainda vale alguma coisa.

A questão colocada pelo governador é até cândida: por que vou vender uma empresa que dá lucro de R$1 bilhão por apenas R$3 bilhões? O seu Zé, dono da padaria da esquina, que sabe fazer negócio, certamente concordaria.

Se a coisa se desse nesses termos.

Ocorre que não se dá. Vejamos.

Em primeiro lugar, de onde o governador do RJ tirou a ideia que a Cedae será vendida por “R$3-4 bilhões”? Já foi feito o leilão? Onde estão os lances? Este pode até ser o preço mínimo (dado que a empresa foi dada em garantia de um empréstimo de R$2,9 bilhões da União para o Estado), mas daí a concluir que este será o preço de venda vai uma grande distância.

Em segundo lugar, vamos olhar mais de perto esse tal de “R$1 bilhão de lucro”. Os lucros líquidos da CEDAE nos últimos anos foram os seguintes (em milhões de reais):

  • 2011: (188)
  • 2012: 163
  • 2013: 292
  • 2014: 460
  • 2015: 249
  • 2016: 379
  • 2017: 278
  • 2018: 832

Observe como o lucro saltou de uma faixa de 200-400 milhões por ano entre 2012 e 2017 para mais de 800 milhões em 2018! Esse é o “R$1 bilhão” de lucro do governador.

Qual foi a mágica, mister M? Olhando a demonstração de resultados, observamos que este “ganho” de quase R$600 milhões entre 2017 e 2018 se deu pela redução de provisões: cerca de R$350 milhões em reduções para devedores duvidosos e contingências. A outra parte do ganho no lucro veio do aumento de receitas: mais de 7% em termos nominais, sem aumentar substancialmente o número de clientes. Ou seja, aumento do preço do serviço.

A não ser que se assuma que as provisões podem continuar sendo diminuídas no mesmo ritmo e novos aumentos do preço do serviço possam ocorrer acima da inflação, esse lucro claramente não é sustentável no tempo.

Óbvio que um acionista privado poderia elevar o lucro de maneira sustentável, eliminando o cabide empregos, aumentando a eficiência e investindo no aumento da rede. Desta forma, mesmo com níveis pífios de lucro, a empresa poderia atingir valor significativo de venda, desde que o Estado abrisse mão do controle.

Por fim, um terceiro ponto, que para mim é o principal. O índice de cobertura da rede de esgoto era de 38,9% em 2011 e foi de 36,8% em 2018 (dados dos balanços da empresa). Ou seja, depois de quase uma década, houve recuo no índice de cobertura do serviço de esgoto, que já é, em si, um patamar vergonhoso. A empresa não tem fôlego financeiro para atender a população em coisas básicas.

Vender a Cedae não é uma questão simplesmente financeira. Não é saber quanto ela vale, se o Estado do RJ vai perder ou ganhar dinheiro com isso. Vender a Cedae é uma questão ética, é dar oportunidade para que a população do RJ tenha serviço de esgoto em suas casas. Não consigo pensar em argumento melhor.

A nova PDVSA?

Muitos não entendem porque a Petrobras precisa praticar preços internacionais, quando somos autossuficientes em petróleo e o nosso custo de extração é menor do que a média mundial.

Digamos que essas premissas sejam verdadeiras (autossuficiência e preços de extração menores). Mesmo assim, os preços praticados deveriam ser os internacionais. Vejamos.

Em primeiro lugar, não consumimos petróleo, mas sim, derivados de petróleo. E nossas refinarias não são capazes de produzir todo o diesel que consumimos. Sendo assim, precisamos importar diesel. Hoje, com um prejuízo de R$0,14 por litro, conforme a associação dos pequenos importadores. Esse prejuízo está sendo bancado pela Petrobras.

Ah, então seria o caso de construir capacidade de refino, para poder atender o mercado interno sem precisar recorrer a importações.

Só que não. Aqui entra o conceito de “commodity”. Digamos que o Brasil praticasse consistentemente preços de diesel abaixo da paridade internacional. Parece óbvio que tradings iriam se aproveitar dessa distorção, exportando diesel para o mercado global. O Brasil se tornaria o maior exportador de diesel do mundo, enquanto faltaria diesel para o mercado interno. Claro que se poderia proibir a exportação de diesel, mas aí estaríamos empilhando uma intervenção sobre a outra, aumentando a ineficiência do sistema.

A Venezuela fez isso durante anos. O estado lastimável da PDVSA, hoje, é fruto desse tipo de política. Um país que produzia 3,5 milhões de barris/dia, hoje produz menos de 1 milhão. Os venezuelanos também acham que “o petróleo é nosso”. Só que as maiores reservas de petróleo do mundo continuarão debaixo da terra enquanto não se respeitar regras básicas da teoria econômica. Queremos ser uma nova Venezuela?

Quiz político

“Maia tem 330 votos, Bolsonaro tem, no máximo, 100 votos”

“O governo não tem base, falta articulação política”.

“Quando ele criou as expressões “velha e nova política” ele criminalizou o parlamento, colocou todo mundo no mesmo saco”

“Ninguém vai votar com o governo porque Bolsonaro tem olhos azuis”

Quem disse as frases acima e as pérolas que vão abaixo?

a) o líder espiritual dos kombistas, Carlos Andreazza

b) a mocreia da Vera Magalhães

c) Rodrigo Maia, o líder da gangue

d) Delegado Waldir, líder do PSL na Câmara