O inferno está cheio de gente com boas intenções

Macri é um excelente exemplo de como o inferno está cheio de gente com boas intenções.

Começou como um bom governo liberal, colocando a casa em ordem depois do desastre Kirshner.

Mas optou por fazer um “ajuste gradual”, porque as “condições políticas” não permitiam administrar um “remédio amargo”.

Assim, de meia-medida em meia-medida, acabou se encalacrando, e hoje tenta desesperadamente chegar vivo às eleições do final do ano.

Que sirva de exemplo para os nossos liberais tupiniquins, enquanto ainda há tempo de fazer a coisa certa.

Só um gole

Um gole de pinga pode ser apenas uma diversão ou uma tragédia. Depende da pessoa.

Para uma pessoa que sempre teve comportamento sóbrio, um gole de pinga é apenas uma diversão inofensiva. Para um ex-alcoólatra, é uma tragédia.

O Brasil é um ex-alcoólatra da intervenção. E não foi só o governo Dilma não. Getúlio Vargas era um grande intervencionista (leiam Lanterna na Popa, de Roberto Campos). Os generais eram intervencionistas. A Nova República de Sarney era o supra-sumo do intervencionismo. Dilma foi apenas a continuidade de uma tradição.

Paulo Guedes é o rehab da nossa última aventura intervencionista, que destruiu a economia brasileira.

Mas aí, Bolsonaro resolveu tomar um gole de pinga.

Aceno

23:59: Sabemos que “articulação política” é um nome bonito para “roubalheira”. A velha política precisa entender que o “toma-lá-dá-cá” acabou, esse governo trabalha em outras bases. A reforma da Previdência foi enviada ao Congresso, agora os deputados devem votar pensando no Brasil.

00:00: Tudo faz parte da estratégia para aprovar a reforma da Previdência. Bolsonaro sabe o que está fazendo, ele é muito esperto.

A única solução viável

Já disse aqui e vou repetir: não faz sentido uma empresa ser estatal e não servir para implementar políticas de governo.

Só faz sentido o Estado ser empresário se for para suprir “falhas do mercado”. “Falhas”, bem entendido, do ponto de vista das “necessidades do povo”.

Bolsonaro (assim como Dilma) está pensando no povo, ao determinar à Petrobras que volte atrás no aumento dos preços do diesel.

Há uma falha clara do mercado, que não entende que o transporte é um gênero de primeira necessidade. E, além disso, coloca em risco o humor daquela categoria de trabalhadores que pode tomar o povo como refém num piscar de faróis.

Se manter o preço do diesel mais baixo é uma política de governo, nada melhor do que uma estatal para implementa-la. Porque esse subsídio fica lá escondidinho no balanço da empresa, não afeta as contas nacionais. No final do dia, que se danem os credores e acionistas minoritários, que pagarão a conta. Ou não.

Os credores e acionistas minoritários exigirão prêmios cada vez mais altos para financiar “políticas de governo”. Isso se reflete no custo do crédito e nos preços das ações. No limite, não haverá mais quem empreste ou quem se disponha a ser sócio do governo. Quando chega neste ponto, resta ao governo cobrir o rombo do balanço da empresa com recursos orçamentários. Nesse momento, aqueles custos escondidinhos no balanço da empresa aparecem. E não é uma visão muito bonita.

Vivemos esse processo durante o governo Dilma. Muitos acham que o quebrou a Petrobras foi a roubalheira. Apesar de monstruosa, o prejuízo devido à corrupção foi troco de pinga perto do impacto causado pelos subsídios patrocinados pela empresa nos preços dos combustíveis, com o objetivo de controlar a inflação. Mas, como afirmei acima, a existência de estatais não se justifica se não for para isso mesmo: implementar políticas de governo. A ideia de ter estatais que funcionem segundo as “regras de mercado” é uma contradição em termos. A decisão de Bolsonaro ontem foi apenas a confirmação (mais uma vez) dessa tese.

A única solução viável para a Petrobras é a privatização.

Nova-mas-chama-de-outra-coisa CPMF

Não consigo pensar em nada mais regressivo do que isentar o trabalhador formal da contribuição ao INSS e tributar o informal para pagar aposentadorias. Pois é justamente isso o que propõe Marcos Cintra, em seu projeto da nova-mas-chama-de-outra-coisa CPMF.

Na pratica é o seguinte: o trabalhador formal, que já se aposenta mais cedo e com um salário maior, vai ser subsidiado pelo informal, que se aposenta mais tarde e com um salário menor. Isso é o que significa “alargar a base de arrecadação”.

Cintra deveria conversar com o pessoal da Previdência (e com o próprio Guedes), que estão propondo o sistema de capitalização. Por este sistema, cada um é responsável pela sua própria aposentadoria. O que Cintra propõe é justamente o oposto: mais gente será responsável pela minha própria aposentadoria. E mais gente, em média, muito mais pobre.

Cintra deveria conversar também com o chamado “grupo do Leblon”, time de economistas, sob a coordenação de Paulo Guedes, que vem estudando medidas para destravar o mercado de capitais. Hoje, Cláudia Safatle publica coluna no próprio Valor Econômico sobre os projetos desse grupo.

Pois bem: a nova-mas-chama-de-outra-coisa CPMF vai na contramão desse esforço, jogando ainda mais areia na engrenagem do mercado de capitais.

Enfim, vamos ver até quando o governo vai insistir nesse balão de ensaio dos insensatos.

Um bom ministro

Muito bacana a história do ministro da infraestrutura, Tarcísio Freitas.

Foi chefe do DNIT (do DNIT!) na gestão Dilma Rousseff, liderou a PPI na gestão Temer e agora chefia um ministério-chave para o crescimento econômico brasileiro na gestão Bolsonaro.

Tarcísio Freitas é a prova acabada de que pode haver servidores públicos excelentes em qualquer governo.

A “nova” CPMF

Quando o tema “CPMF” apareceu na campanha de Bolsonaro, foi logo desmentido por Paulo Guedes, tal foi o barulho criado. Na época, antes do primeiro turno, Guedes argumentou que não se tratava de uma nova CPMF porque não seria um imposto adicional, mas um que substituiria todos os outros impostos. Ou seja, seria uma CPMF agigantada, com alíquota muito maior. Já entre o primeiro e o segundo turnos, Guedes afirmou que houvera uma grande mal entendido, que ele defendia a convergência de todos os impostos em um imposto único, não necessariamente sobre movimentações financeiras.

Eu mesmo critiquei aqui na época. Trata-se de um imposto que cria distorções nos mercados financeiro, de crédito e tem efeito cumulativo em toda a cadeia de produção. Não à toa, a União Europeia vem estudando a adoção de um imposto desse tipo há 10 anos, sem ter chegado a um desenho satisfatório.

Agora, o assunto volta, como a nos assombrar. Em boa hora a Câmara dos deputados acolheu o projeto de Bernardo Appy, alinhado com as melhores práticas internacionais. Não vamos reinventar a roda.

O mito da perda de audiência

Alguns mitos andam por aí como almas penadas.

Um deles diz que a “velha mídia” perdeu muita audiência depois do fenômeno Bolsonaro. As pessoas teriam caído na real sobre como as notícias são manipuladas (“fake news”) e estariam trocando a “velha mídia” pelas “redes sociais”.

Seria verdade se fosse verdade.

Segundo o IVC (Instituto Verificador de Circulação), o número de assinantes da Folha cresceu 2,73%, do Estadão 18,73% e do Globo 22,42%, de 2017 para 2018. Isso inclui assinaturas em papel (que caíram) com as digitais (que subiram muito). Já a Veja, essa sim, teve retração de 24% na circulação. Mas aí parece que tem a ver com concorrência: no mesmo período, a Época (que, na minha opinião, consegue ser pior que a Veja no quesito “esquerdismo”) teve crescimento de 84%. Em números, significa que a Veja perdeu cerca de 300 mil assinantes, enquanto a Época ganhou cerca de 225 mil assinantes. Ou seja, uma perda líquida de 75 mil assinantes, o que significa, para o conjunto das duas revistas, uma queda de 4,9%, o que não parece ser nenhum desastre.

Ver aqui: https://www.meioemensagem.com.br/…/circulacao-digital…

e aqui: https://www.meioemensagem.com.br/…/revistas-semanais…

E antes que coloquem em dúvida a seriedade do IVC, é com base em sua auditoria que os veículos cobram por seus anúncios. Portanto, é coisa séria, com dinheiro não se brinca.

Também acho a imprensa, de maneira geral, de um nível muito fraco, quando não tendenciosa, principalmente quando se trata da agenda de costumes. Se procurarem, certamente verão vários posts aqui criticando a cobertura da mídia em vários aspectos. Mas é preciso criticar com base em fatos, não em mitos. E a perda de audiência, pelo menos nesses casos levantados, é mito.