Em economia existe um negócio chamado “restrição orçamentária”, que significa mais ou menos o seguinte: você só pode gastar o dinheiro que você tem. Qualquer outro dinheiro terá que ser tomado emprestado. Trata-se de uma lei tão concreta quanto a lei da gravidade.
A esquerda costuma se insurgir contra esse negócio. No discurso da esquerda, é comum ouvir-se que basta “vontade política” para que o dinheiro surja com em um passe de mágica. Então, tudo é prioridade: saúde, educação das crianças, universidades, aposentadorias, tem que ter dinheiro pra tudo. A restrição orçamentária seria só uma desculpa daqueles que estão se locupletando com a situação, que não querem perder seus privilégios. Alguém com verdadeira “vontade política” colocaria as coisas nos seus devidos lugares. Vimos que, quando a esquerda chegou ao poder, não houve “vontade política” que fosse capaz de revogar a restrição orçamentária.
Pois bem.
Temos um fenômeno semelhante na política. Vou chamá-lo de “restrição de poder”. A restrição de poder consiste no fato de que ninguém é capaz de exercer o poder sozinho. O poder deve sempre ser compartilhado. Em nosso arranjo constitucional, por exemplo, o poder Executivo é exercido pelo presidente e o poder Legislativo é exercido pelo Congresso, ambos legitimamente escolhidos em eleições que seguem determinadas regras. Nesse arranjo, o poder Executivo até sugere mudanças nas leis, mas quem tem a caneta para aprovas as leis é o poder Legislativo. Para que o poder Executivo consiga fazer aprovar as suas sugestões no Congresso, deve repartir o seu poder com os congressistas, os donos da caneta. É assim que funciona a “restrição de poder” no Brasil e em grande parte das democracias.
Há pessoas de muito boa vontade que se insurgem contra essa restrição. Para elas, bastaria “vontade política” para que a restrição de poder simplesmente desaparecesse. Bolsonaro encarnaria essa “vontade política”.
Não, a “restrição de poder” não vai desaparecer, assim como a “restrição orçamentária” não vai desaparecer. Existe restrição de poder inclusive em ditaduras. Que o diga Maduro, que precisa repartir o butim com os militares. Achar que “vontade política” irá isentar o Executivo de repartir o poder é uma ilusão. A mesma que acomete a esquerda quando ignora a “restrição orçamentária”.
O Centrão é o atual demônio da política brasileira, o conjunto de deputados que impede o governo de governar para o bem do Brasil. O curioso é que o Centrão não é oposição. Oposição é aquela parcela de deputados que não está disposta a negociar pedaços de poder em troca de apoio. Se o Centrão fosse oposição, não estaríamos perdendo nosso tempo discutindo. Não vejo ninguém protestando contra os 140 deputados do PT, PDT, PSOL. O alvo dos protestos é o Centrão. E por que?
Porque, por algum motivo, exige-se do Centrão apoio sem compartilhamento de poder. Mas isso vai contra a lei da “restrição de poder”. Não tem porque o Centrão votar com o governo se não é sócio do governo. Essa é a restrição. E não tem “vontade política” que dê jeito nisso.