Maria Cristina Fernandes escreve hoje um artigo no Valor que, a pretexto de defender Bolsonaro daqueles que começam a namorar a ideia de um impeachment do presidente, na verdade quer mesmo voltar a dizer que o impeachment de Dilma Rousseff foi um golpe. Um golpe de republiqueta.
A tese é a mesma de sempre: não há provas. Não há “um crime de responsabilidade que tenha convencido toda a nação”, diz a colunista.
Imagine um jogo de futebol em que cada lance decidido pelo juiz tenha que convencer todos os torcedores. Não haveria jogo, por óbvio. O que Maria Cristina defende é isso: deveria haver provas que “convencessem a nação inteira”. Como se a nação fosse formada, toda ela, por juízes neutros e que pudessem concordar sem sombra de dúvida sobre a justeza das provas. Mas se nem com o VAR os torcedores chegam a um acordo, imagine em casos como o impeachment.
Não é assim que a coisa funciona. Por isso existe a figura do juiz constitucionalmente constituído. É sobre ele que recai a responsabilidade de examinar as provas e condenar ou absolver o réu. No caso de Lula, por exemplo, os seus seguidores podem gritar e esgoelar que “não há provas”. Os juízes que o julgaram (e, por enquanto, foram 9), avaliaram unanimemente que há provas sim. Não é necessário que as provas “convençam toda a nação”. Basta que convençam os juízes.
No caso do impeachment, cansei de escrever aqui, os juízes são os congressistas. São eles que definem se as provas são suficientes ou não para decretar o impeachment. Pouco importa o que a “nação” (no caso de Maria Cristina, nação é outro nome para os petistas) pensa ou não. E, por óbvio também, trata-se de um julgamento político, onde os congressistas-juízes avaliam também o conjunto da obra, além do aspecto especificamente técnico.
O interessante é que a desqualificação do instituto do impeachment por parte de certa imprensa é recente. Não se ouvia nada sobre isso quando se fez o impeachment de Collor.
O impeachment é sim uma saída democrática para um impasse político sob um regime presidencialista. Compará-lo a um golpe de republiqueta por interesse partidário é um desserviço à democracia. Bolsonaro não precisa dessa ajuda “desinteressada” dos intelectuais petistas.