Incentivo para quem?
O ex-secretário da Receita Federal de FHC, Everardo Maciel, volta à carga contra a reforma tributária ora em análise no Congresso. A sua preocupação é com o aumento da carga tributária sobre os serviços e a impossibilidade da concessão de incentivos fiscais por parte dos entes da Federação.
Sobre este último ponto, Maciel conta a história de uma pequena cidade de Pernambuco, Estado que concedeu incentivo fiscal para a construção de uma usina de energia solar. Vai criar muitos empregos, movimentar a economia da região e, de quebra, fomentar energia limpa. Quer melhor uso para o dinheiro público?
Bem, o único personagem que, tenho certeza, vai ganhar, é a empresa de energia solar. Esta sim, fez contas sobre a viabilidade financeira do empreendimento, e vai embolsar o lucro proporcionado pelo incentivo fiscal. Ah, tem outro personagem que vai ganhar: o governador do Estado, que vai, sorridente e ao som de banda de música e fogos, inaugurar a usina, e ganhar os votos daquela cidade.
Já a população, precisaríamos ter mais dados para concluir alguma coisa. Qual o volume do incentivo? Quais são os outros possíveis investimentos que poderiam gerar empregos na região? Não seria melhor usar o dinheiro para investir em saneamento básico ou melhoria das escolas? Enfim, como todo incentivo fiscal dado no Brasil, faltam estudos que comprovem a sua eficácia. Quanto à externalidade positiva (energia limpa), deveria ser tratado no âmbito federal, dentro de um programa mais amplo de incentivo à energia limpa, e não ser objeto de incentivo fiscal de entes federativos.
Defender incentivo fiscal a essa altura do campeonato, com os Estados literalmente quebrados, só pode ser piada.
O poder das frases infelizes
Bolsonaro escandaliza o mundo bem-pensante. Diz o que lhe vem na telha, sem nenhuma “estratégia”, conforme confidenciou em bate-papo com uma jornalista do Globo. Bate-papo esse, aliás, que faz também parte da “falta de estratégia” do presidente: foi improvisado, simplesmente porque “a jornalista pediu”.
Das incontáveis análises que li nos últimos dias sobre o assunto, posso resumir o que se esperava de Bolsonaro ao assumir a presidência: que “descesse do palanque,” que “respeitasse a liturgia do cargo”, que “preservasse as instituições”, que “trabalhasse para a união dos brasileiros”.
Bem, sinto dizer que quem esperava isso de Bolsonaro estava no mundo da Lua, e não aqui no Brasil-sil-sil. Bolsonaro foi eleito justamente como reação a um grupo que dilapidou as instituições brasileiras, nunca desceu do palanque e trabalhou incansavelmente pela desunião dos brasileiros. Na visão do núcleo duro do Bolsonarismo, aquele que lhe deu uma base eleitoral inexpugnável e levou o capitão ao segundo turno, o PT de tal forma envenenou as instituições, que não restaria outra saída a não ser uma política de terra arrasada, para daí construir algo completamente novo. É isso o que Bolsonaro vem fazendo, e não decepciona uma vírgula o seu núcleo duro.
Há muitos (entre os quais me encontro), no entanto, que votaram em Bolsonaro simplesmente para “evitar o PT”. Estes queriam votar em Alckmin, no Meirelles ou no Amoedo, mas foram obrigados a engolir Bolsonaro por conta do núcleo duro do Bolsonarismo, que o colocou no 2o turno. Alguns destes esperavam que Bolsonaro fosse uma versão mais histriônica dos candidatos mais “instucionais”, mas que, ao fim e ao cabo, “respeitasse as instituições, trabalhasse pela união e blá blá blá”. A minha ficha particularmente caiu quando se iniciaram as negociações com o Congresso para a aprovação da reforma da Previdência. Até escrevi um post a respeito. Ali, ficou claro que Bolsonaro não fora eleito para fazer o que Alckmin faria. Falta cair a ficha de um monte de gente ainda, que espera de Bolsonaro o que esperaria de Alckmin.
Arrependimento por ter votado em Bolsonaro no 2o turno? De maneira alguma! Entre dois polos destruidores das instituições, prefiro o novo. Aliás, é bom notar: não há termos de comparação entre a meia dúzia de frases infelizes de Bolsonaro com anos e anos de rapina e implosão das instituições democráticas perpetrados pelo PT, com o feliz concurso do sistema político e sob as barbas do institucional PSDB. Aos que estão genuinamente preocupados, recomendo calma: o poder das frases infelizes ainda não chegou a tanto.