Há uma versão da história segundo a qual D. Pedro II teria sido um grande administrador, sendo o período imperial de grande crescimento econômico. O ministro da educação, hoje, repete a versão.
O escritor Jorge Caldeira é autor de dois livros que abarcam o período. O primeiro é a biografia do Barão de Mauá (“Mauá, empresário do império”), e o segundo é a “História da Riqueza do Brasil”.
Vou copiar aqui alguns trechos do capítulo deste segundo livro, o que fecha o período imperial.
“A taxa de alfabetização passou de estimados 2% para 17,4% no fim do Império. Trata-se de um avanço, mas o fato é que, em 1890, vários países estavam próximos da alfabetização de toda a população. Do mesmo modo, o regime imperial conseguiu criar alguns cursos de ensino superior, sobretudo de direito, medicina e engenharia. Apesar de toda a cultura do imperador, não se fundou nenhuma universidade no período, prolongando o atraso multissecular do país”.
“… a renda per capita no Brasil em 1820 e 1890. Para o primeiro ano chegou ao resultado de 670 dólares anuais; para 1890, a renda foi de 704 dólares anuais. Em outras palavras, mostra claramente um período de completa estagnação, com crescimento residual de 4% num período de 70 anos. […] Nos EUA, a renda per capita mais do que triplicou entre 1820 e 1900, passando de 1,3 mil para 4 mil dólares (5,7 vezes a renda per capita brasileira)”.
“Por maiores que sejam as imprecisões e a falta de compatibilidade entre os dados, a tendência geral é clara: o século XIX como um todo, e o período imperial em particular, foi um período de estagnação da economia brasileira e, por outro lado, de aceleração da economia mundial. Foi, portanto, um período de acentuado atraso para o país na comparação com o mundo”.
O capítulo seguinte, dedicado à República Velha, tem como título “Primeira República: explosão de crescimento”. E o subtítulo: “Descentralização pesada libera o setor privado e destrava os governos locais; políticas ousadas transformam, em uma década e meia, a economia estagnada numa das que mais crescem no mundo”.
A pista para esta estagnação durante o 2o Império é dada no início deste capítulo: o imperador centralizava toda a vida do País. “…entre suas muitas capacidades, estava a de autorizar ou não o funcionamento de sociedades anônimas no país, de modo que a vida empresarial dependia do humor do imperante. […] Era ele que controlava a presidência do Banco do Brasil, por usa vez o grande controlador da poupança nacional e da política de crédito”.
O poder desta centralização fica claro no outro livro de Jorge Caldeira. Em “Mauá, empresário do Império”, o autor descreve como o primeiro grande empresário brasileiro foi destruído pela aliança de Pedro II com a oligarquia brasileira e os ingleses. Recomendo a sua leitura para entender esta época da história brasileira e tantos dos vícios que ainda hoje desgraçam a vida nacional, como o espírito anti-empresarial.
Chamou-me principalmente a atenção a diferença de PIB/capita entre EUA e Brasil em 1890: 5,7 vezes, aproximadamente o que é hoje. Ou seja, considerando que a economia de ambos os países tinha o mesmo tamanho no início do século XIX, o gap se construiu durante o Império. O período republicano não conseguiu fechar o gap, mas pelo menos não o piorou, como foi o caso, por exemplo, da Argentina.
Jorge Caldeira é um autor bastante profundo, e seu livro “História da Riqueza no Brasil” é bastante surpreendente, contando a história de um Brasil dinâmico, com uma economia interna muito movimentada e até maior que a economia da metrópole, desfazendo a versão de que a colônia era uma mera exportadora de matérias-primas. Ele chega a esta conclusão através de estudos econométricos recentes, com base em vários censos do período. Esta história é interrompida com a chegada da Família Real ao Brasil, e sua centralização administrativa. Mais Rio de Janeiro e menos Brasil, este passou a ser o lema até a proclamação da República.
Ficarei feliz em receber indicações de outros livros que deem uma visão alternativa, mais benigna em relação ao período imperial brasileiro.