A Porta da Esperança

Os dois últimos governos correram para atender as reivindicações dos caminhoneiros: tabela para o frete, financiamento do BNDES, cartão de congelamento de preço do combustível por 30 dias.

Bem, a tabela é de impossível aplicação, o financiamento esbarra no risco de se emprestar dinheiro para os caminhoneiros e o congelamento perdeu o sentido no momento em que os preços do petróleo estão caindo.

Mas resta uma reivindicação não atendida: o refinanciamento das dívidas. Aí entra essa entidade mágica chamada Caixa Econômica Federal. Ou simplesmente, “A Caixa”.

A Caixa é uma espécie de Porta da Esperança de todos os que precisam de dinheiro de alguma forma. Desde financiamentos subsidiados até cortes nas taxas de juros, a Caixa parece um manancial de dinheiro de graça para todas as necessidades.

Agora são os caminhoneiros, que esperam purificar suas dívidas nas águas mágicas da Caixa.

E querem saber? Tá certo! Se é para a Caixa agir como um banco qualquer, qual o sentido de sua existência? A Caixa só faz sentido se for para criar dinheiro fora da aporrinhação que é aprovar despesas via Orçamento Público.

Algum chato sempre vai lembrar que esse dinheiro não existe, que em algum momento terá que ser pago, de uma forma ou de outra. Basta não dar ouvidos, e acreditar que basta “vontade política”.

A Caixa nunca será privatizada.

Subsídios à energia solar

Outro dia fiz um post aqui discutindo o custo de geração de “energias alternativas” vis a vis a geração de energia com origem em petróleo. Meu ponto havia sido que o petróleo é ainda uma fonte muito barata de geração de energia, e seu reinado não terminaria tão cedo. No Brasil ainda temos a energia hidrelétrica, que é também mais barata que as “energias alternativas”.

Alguns comentaram sobre o avanço da energia solar, de como era muito mais barata do que a energia hidrelétrica, que valia a pena a troca.

Pois bem, reportagem de hoje mostra que o subsídio à energia solar chega hoje a R$400 milhões/ano. O que, dividido por 180 mil unidades produtoras, resulta em um subsídio, em média, de R$2.222, ou R$185/mês! E adivinha de onde sai esse subsídio? Acertou: da conta de todos os que usam energias não alternativas. A Aneel estima que este custo deve subir a R$ 1 bilhão em 2 anos e chegar a R$ 4 bilhões em 2027.

Nada contra que se subsidie a geração de “energias limpas”. Mas que fique claro que isso não é barato, e que sai do bolso de alguém. No caso, do nosso.

Minhas pendências com a Receita

“A Receita Federal do Brasil informa: foi enviada uma mensagem importante para a sua Caixa Postal em 17/11/2019”.

Assim, desse jeito, veio o SMS em pleno domingão, informando-me que a Receita havia me descoberto! Seria por conta de minhas atividades de lavagem de dinheiro? Ou minha sociedade em empresa fantasma? Ou minhas atividades sem emissão de nota fiscal? Ou ainda meu patrimônio incompatível com meus rendimentos?

Coração aos saltos, fui até o site da Receita. Era uma intimação! Meu Deus!

Fui ver então no detalhe: tratava-se de uma prosaica cobrança da contribuição previdenciária sobre o salário de minha empregada doméstica. Eu acho que paguei, mas devo ter feito alguma barbeiragem no site do E-Social (um site, como todos sabem, muito fácil de usar), então não constava o pagamento. Para provar que eu havia pago seria necessário comparecer a um posto da Receita, etc, e o valor não valia a pena. Paguei, aliviado por não ter sido pego em minhas outras falcatruas.

Se bem que o Toffoli agora está cuidando pessoalmente dessa parte, então estou mais tranquilo.

O centro e os polos na política

É realmente curioso como este debate sobre a “polarização” e a busca desesperada por uma solução “de centro” surgiu.

Até o aparecimento do “fenômeno Bolsonaro”, o país encontrava-se dividido fazia 25 anos entre PT e PSDB. Foram nada menos que 6 eleições presidenciais em que os dois partidos se enfrentaram, sendo os outros partidos meros coadjuvantes.

Nestes 25 anos, ninguém falava de “polarização”. PT e PSDB eram considerados partidos “moderados”, um mais à esquerda, o outro mais centro-esquerda, mas ambos muito civilizados e coisa e tal. Tratava-se de uma rivalidade fake.

Aí então, no vácuo de uma inexistente direita conservadora, surge Bolsonaro, para se contrapor à esquerda (PT) e à centro-esquerda (PSDB). Com isso, aparece a tal da “polarização” com o PT, que, não custa lembrar, foi considerado um partido “moderado” nos últimos 25 anos.

Vou repetir então: foi necessário o surgimento do movimento bolsonarista para que ficasse claro que o PT é um partido radical, tão radical como o seu antípoda. Antes disso, o PT sentava-se à mesa dos partidos civilizados, como qualquer outro.

Interessante como tudo é uma questão de perspectiva.

A Constituição do brasileiro

Os mais jovens não devem saber, mas a Constituição de 1988 tinha um artigo que limitava os juros a 12% ao ano, dispositivo que foi revogado apenas em 1999 por meio de emenda constitucional. Os nobres deputados constituintes colocaram esse troço na Constituição mesmo depois do fragoroso fracasso do Plano Cruzado e do Plano Bresser nos dois anos anteriores, demonstrando a inutilidade de se congelar preços.

Este é apenas o exemplo mais saliente de uma Constituição que é o retrato do brasileiro médio, que espera tudo do Estado. Tudo deve estar na Constituição, de modo a que o Estado seja “obrigado” a cumprir a sua função social, qual seja, construir uma sociedade idílica, onde corre leite e mel. Um exemplo recente foi a tentativa de desconstitucionalizar as regras para a aposentadoria. Não passou. E não passou porque o brasileiro médio acha que seus “direitos” devem estar na Constituição, para que sejam “garantidos”. Mesmo que se trate de uma regra impossível de ser cumprida na vida real.

A Constituição é, portanto, a combinação de boas intenções com dispositivos bem específicos desenhados para proteger as corporações que sugam o Estado, a que chamamos genericamente de “máquina”.

Almir Pazzianoto, ex-ministro do Trabalho e ex-presidente do TST defende, em artigo de hoje no Estadão, uma nova Constituição, muito mais enxuta e focada do que a atual. Os principais pontos estão no trecho que destaquei abaixo. Muito bom, assino embaixo desses pontos, mas não de uma nova Constituinte.

Como eu disse acima, a atual Constituição é a cara do povo brasileiro. Uma nova não teria porque ser diferente. Aliás, provavelmente seria pior, porque o nível da representação congressual hoje é muito pior do que em 1988, não dá nem para começar a comparar.

Pazzianoto defende que a Constituição seja escrita por uma equipe de constitucionalistas de reputação ilibada, e seja aprovada pelo povo em referendo popular. Resta a questão de como escolher esses “constitucionalistas de reputação ilibada”, cada um com seu viés próprio sobre como deveria ser o Estado brasileiro. É a ilusão da lei tecnocraticamente perfeita, que só existe em sociedades totalitárias. Fora a ilusão de um referendo sobre assunto tão complexo.

Parece-me que a via mais segura e eficaz é a que estamos trilhando: emendar a Constituição no que ela tem de mais absurdo, como foi o caso dos 12% de taxa máxima de juros e, mais recentemente, a falta de uma idade mínima para a aposentadoria. Óbvio que seria melhor não ter esses e outros dispositivos na Constituição. Mas essa é a MINHA opinião. A opinião do brasileiro médio é outra. Quer uma Constituição mais enxuta? Mude-se para os EUA.

O período imperial brasileiro

Há uma versão da história segundo a qual D. Pedro II teria sido um grande administrador, sendo o período imperial de grande crescimento econômico. O ministro da educação, hoje, repete a versão.

O escritor Jorge Caldeira é autor de dois livros que abarcam o período. O primeiro é a biografia do Barão de Mauá (“Mauá, empresário do império”), e o segundo é a “História da Riqueza do Brasil”.

Vou copiar aqui alguns trechos do capítulo deste segundo livro, o que fecha o período imperial.

“A taxa de alfabetização passou de estimados 2% para 17,4% no fim do Império. Trata-se de um avanço, mas o fato é que, em 1890, vários países estavam próximos da alfabetização de toda a população. Do mesmo modo, o regime imperial conseguiu criar alguns cursos de ensino superior, sobretudo de direito, medicina e engenharia. Apesar de toda a cultura do imperador, não se fundou nenhuma universidade no período, prolongando o atraso multissecular do país”.

“… a renda per capita no Brasil em 1820 e 1890. Para o primeiro ano chegou ao resultado de 670 dólares anuais; para 1890, a renda foi de 704 dólares anuais. Em outras palavras, mostra claramente um período de completa estagnação, com crescimento residual de 4% num período de 70 anos. […] Nos EUA, a renda per capita mais do que triplicou entre 1820 e 1900, passando de 1,3 mil para 4 mil dólares (5,7 vezes a renda per capita brasileira)”.

“Por maiores que sejam as imprecisões e a falta de compatibilidade entre os dados, a tendência geral é clara: o século XIX como um todo, e o período imperial em particular, foi um período de estagnação da economia brasileira e, por outro lado, de aceleração da economia mundial. Foi, portanto, um período de acentuado atraso para o país na comparação com o mundo”.

O capítulo seguinte, dedicado à República Velha, tem como título “Primeira República: explosão de crescimento”. E o subtítulo: “Descentralização pesada libera o setor privado e destrava os governos locais; políticas ousadas transformam, em uma década e meia, a economia estagnada numa das que mais crescem no mundo”.

A pista para esta estagnação durante o 2o Império é dada no início deste capítulo: o imperador centralizava toda a vida do País. “…entre suas muitas capacidades, estava a de autorizar ou não o funcionamento de sociedades anônimas no país, de modo que a vida empresarial dependia do humor do imperante. […] Era ele que controlava a presidência do Banco do Brasil, por usa vez o grande controlador da poupança nacional e da política de crédito”.

O poder desta centralização fica claro no outro livro de Jorge Caldeira. Em “Mauá, empresário do Império”, o autor descreve como o primeiro grande empresário brasileiro foi destruído pela aliança de Pedro II com a oligarquia brasileira e os ingleses. Recomendo a sua leitura para entender esta época da história brasileira e tantos dos vícios que ainda hoje desgraçam a vida nacional, como o espírito anti-empresarial.

Chamou-me principalmente a atenção a diferença de PIB/capita entre EUA e Brasil em 1890: 5,7 vezes, aproximadamente o que é hoje. Ou seja, considerando que a economia de ambos os países tinha o mesmo tamanho no início do século XIX, o gap se construiu durante o Império. O período republicano não conseguiu fechar o gap, mas pelo menos não o piorou, como foi o caso, por exemplo, da Argentina.

Jorge Caldeira é um autor bastante profundo, e seu livro “História da Riqueza no Brasil” é bastante surpreendente, contando a história de um Brasil dinâmico, com uma economia interna muito movimentada e até maior que a economia da metrópole, desfazendo a versão de que a colônia era uma mera exportadora de matérias-primas. Ele chega a esta conclusão através de estudos econométricos recentes, com base em vários censos do período. Esta história é interrompida com a chegada da Família Real ao Brasil, e sua centralização administrativa. Mais Rio de Janeiro e menos Brasil, este passou a ser o lema até a proclamação da República.

Ficarei feliz em receber indicações de outros livros que deem uma visão alternativa, mais benigna em relação ao período imperial brasileiro.

Evo e as políticas “distributivistas”

Artigo de opinião traduzido do Washington Post.

O articulista, Ishaan Tharoor, compara a Bolívia com Argentina e Equador, e afirma que, ao contrário desses dois últimos, que adotaram políticas liberais e se estreparam, a Bolívia adotou políticas “distributivas” e, por isso, diminuiu a pobreza com sucesso.

Agora, eu pergunto: como um cara desses tem espaço em um jornal como o Washington Post? O sujeito se põe a escrever sobre a América do Sul e repete coisas sem nexo, que encaixam na narrativa pré-estabelecida de seu gabinete a 10 mil km de distância. Só faltou dizer que o Brasil de Lula teve sucesso com suas “políticas distributivas”, para depois sair dos trilhos com a política liberal de Temer/Bolsonaro. Certamente ele esqueceu esse exemplo, senão estaria no artigo.

O articulista convenientemente ignora que o Chile também diminuiu a pobreza extrema de 68% para 13% entre 1990 e 2016 (dados de reportagem do Estadão) adotando políticas liberais.

O articulista também convenientemente esquece que Argentina e Equador foram comandados por Cristina Kirchner e Rafael Corrêa, dois mandatários populistas bolivarianos distributivistas, até tão recentemente quanto 2016. Atribuir os problemas atuais às políticas liberais dos governos que os sucederam é, para dizer o mínimo, desinformação. E, para dizer o máximo, má fé.

A Bolívia se destaca dos outros governos bolivarianos porque, assim como Lula, Evo foi muito pragmático: manteve as bases fiscais do seu governo intactas, o que permitiu controlar a inflação e fazer políticas distributivas para inglês, quer dizer, para boliviano ver. Não à toa, Evo foi o único presidente do “eixo do mal” a prestigiar a posse de Bolsonaro. Ele foi esperto o suficiente para distinguir o discurso babaca bolivariano daquilo que realmente funciona na economia.

Se Evo estiver lendo esse artigo, certamente estará rolando no chão de rir, ao constatar que pundits imperialistas caíram na lábia de um índio boliviano.

Enchente apocalíptica

A enchente foi causada pelas “mudanças climáticas”.

Em 1966, há 53 anos portanto, a água subiu tanto quanto neste mês.

Na época, a cheia foi causada pelo excesso de chuva mesmo (fenômeno comum em novembro) e não pelas “mudanças climáticas”.

O bom de viver no século XXI é ter a sensação de estar em um filme apocalíptico mesmo diante de um fenômeno meteorológico que se repete regularmente.