Teoria dos jogos e o radicalismo na política

A Economist torce o nariz para os candidatos conservador e trabalhista, anunciando seu apoio aos liberais-democratas. É um pouco como se a imprensa liberal local (o Estadão, por exemplo) anunciasse seu voto em Geraldo Alckmin contra Bolsonaro e Haddad. Tem pouco efeito prático, como se viu nas eleições de 2018.

É até certo ponto um enigma a falta de votos do chamado “centro razoável”. É lugar-comum o raciocínio de que a maior parte do eleitorado não é radical e estaria, portanto, pronta a votar em um candidato “de centro”. Há uma “avenida a ser explorada”, dizem.

Uma pista do porquê do fracasso das alternativas de centro pode ser intuída da própria matéria da Economist. A revista acha “razoável” um aumento “razoável” de gastos públicos com um aumento “razoável” de impostos. O candidato liberal-democrata seria esta alternativa “razoável”.

Ocorre que uma parcela crescente da população não aguenta mais “pagar imposto pra sustentar vagabundo”, enquanto outra parcela quer “que os ricos distribuam sua renda para os pobres”. E esta clivagem, por incrível que pareça, tem pouco a ver com a renda: tem muito pobre muito cioso do seu mérito em ter conseguido o pouco que conseguiu, e tem muito rico com peso em sua consciência social. Se fosse somente uma questão de renda, não precisaria de eleição, bastaria um censo econômico.

Assim, estes dois grupos, ainda que minoritários, põem-se firmemente ao lado de candidatos com ideias radicais. O que acontece com o centro, que de fato é majoritário se comparado aos extremos? Aqui entra um pouco de Teoria dos Jogos: o eleitor de centro, apesar de ser de centro, tem um certo viés para um dos dois lados mais radicais. A sua primeira opção seria o centro, mas uma segunda forte opção é evitar que o “outro lado” vença. Como votar no candidato de centro é assumir o risco de que o outro lado vença, o voto vai para o segundo ótimo, que é o candidato radical do lado “menos ruim”. O eleitor centrista serve então como o fiel da balança entre dois candidatos radicais, mas sem poder para eleger um candidato centrista. Está aí John Nash explicando a polarização atual.

Eleição é emoção. Difícil imaginar um candidato de centro defendendo apaixonadamente um programa de “um pouco mais de impostos para um pouco mais de benefícios sociais”. Somente candidatos radicais conseguem despertar paixões. Alckmin foi o símbolo máximo dessa falta de emoção. O povo, a essa altura do campeonato, quer ver o circo pegar fogo. E os bombeiros do centro vão continuar votando no incendiário menos deletério.

O peso do setor financeiro

Em seu primeiro dia de negociação na Nasdaq, a XP foi cotada a US$33/ação, o que resulta em um valor de mercado de aproximadamente US$18 bi. Isso faz da XP a 12a maior empresa brasileira de capital aberto, empatada com a Magazine Luiza. O ranking das 20 maiores empresas de capital brasileiro aberto é o seguinte (valores em dólares):

  • 1. Petrobras: 99 bi
  • 2. Itaú: 79 bi
  • 3. Ambev: 70 bi
  • 4. Bradesco: 64 bi
  • 5. Vale: 63 bi
  • 6. Banco do Brasil: 32 bi
  • 7. Itaúsa: 28 bi
  • 8. B3: 23 bi
  • 9. Vivo: 22 bi
  • 10. BTG Pactual: 19 bi
  • 11. Magazine Luiza: 18 bi
  • 12. XP: 18 bi
  • 13. BB Seguridade: 17 bi
  • 14. JBS: 17 bi
  • 15. Weg: 16 bi
  • 16. Suzano: 12 bi
  • 17. Eletrobrás: 12 bi
  • 18. Lojas Renner: 10 bi
  • 19. Sabesp: 10 bi
  • 20. Hapvida: 10 bi

Note que, dos 12 primeiros lugares, 7 são do mercado financeiro, sendo 4 bancos . Isso porque a Caixa não tem capital aberto, senão certamente figuraria entre as maiores 12 empresas.

Dentre as 12 maiores empresas americanas, 4 são do mercado financeiro, sendo 2 bancos. E 5 são de tecnologia.

A XP surge como um disruptor do modelo centrado nos bancos. Atrás dela outras startups certamente surgirão. Mas o peso do setor financeiro no Brasil continuará o mesmo durante ainda muito tempo.

Personalidade do Ano

Fosse Bolsonaro o escolhido como Personalidade do Ano, a quantidade de gente lembrando que a Time tem Adolf Hitler em seu curriculum seria uma enormidade. Portanto, colocar o bigodinho para desqualificar as escolhas da Time pode servir para qualquer um, a depender do lado de quem faz a comparação.

Os editores da Time já esclareceram várias vezes que suas escolhas para a “Personalidade do Ano” não tem nada a ver com as ideias da pessoa escolhida, mas com sua influência e destaque naquele ano. Neste sentido, a escolha de Greta Thunberg é coerente com os critérios adotados. Acho que eu mesmo já escrevi mais sobre Greta aqui do que sobre qualquer outra personalidade internacional. O ambientalismo encontrou em Greta Thunberg o seu rosto. De fato, não tem nada que representa melhor o catastrofismo ambientalista do que as caras e bocas de Greta. E, sem dúvida, o ambientalismo é um tema onipresente hoje, concorde-se com isso ou não.

Pode-se afirmar que Greta não passa de um produto bem acabado de marketing, criado por interessados no tema. Ou seja, não teria mérito próprio para conseguir a indicação. Mas isso é não entender a natureza da escolha. Não se trata do Prêmio Nobel da Paz, que exige alguma iniciativa pessoal para ser obtido. A revista já escolheu como Personalidade do Ano o computador pessoal, o americano médio e o próprio planeta Terra. Trata-se, portanto, de uma indicação antes de tudo midiática. E, gostemos ou não, Greta é midiática, um símbolo do fast food em que se tornou o debate de qualquer assunto atualmente.

Qual o centro da política?

Rosângela Bittar, nova colunista do Estadão, defende a tese de que não há polarização na política brasileira. Para provar a sua tese, Rosângela afirma que há pelo menos três “anti-Lulas” na praça, o que indicaria um quadro mais multifacetado. A tese é discutível, mas o que me chamou a atenção foi a classificação que a experiente colunista faz dos “anti-Lula”: Bolsonaro seria “extrema-direita”, Doria seria “direita” e Ciro Gomes seria “centro”!

Ok, classificar Bolsonaro como “extrema-direita” é uma necessidade atávica da imprensa brasileira, o que puxa todos os seus adversários para a órbita da direita. Mas classificar Ciro como “centro” é só a demonstração de como essa classificação é capenga. A classificação mais óbvia seria Bolsonaro à direita, Doria como “centro” e Ciro como “esquerda”. Mas aí teríamos que assumir que Lula é “extrema-esquerda”, o que obviamente não confere com a narrativa.

Imagine o inverso: o “anti-Bolsonaro” da extrema-esquerda seria Lula, da esquerda seria Ciro e do centro seria Doria. É absolutamente simétrico com a classificação anterior, mas seria um Deus-nos-acuda.

Essa classificação entre “direita” e “esquerda” é sempre sujeita a muita discussão. Mas tem coisas que são indiscutíveis. Uma delas é afirmar que Ciro Gomes é uma alternativa de centro. Simplesmente não dá.

Inspiração

O vigia noturno aqui da empresa disse que vai se inspirar no novo presidente da Argentina: só vai pagar sua dívida com o Bradesco quando tiver um aumento de salário.

Negócio imperdível

O BNDES não quis emprestar R$2 bilhões para o seu CAOA comprar a fábrica da Ford.

Haveria outras alternativas. Por exemplo, há outros bancos na praça que poderiam emprestar o dinheiro. Ou, o seu CAOA poderia emitir debêntures no mercado e captar o dinheiro diretamente do grande público.

O problema dessas outras alternativas provavelmente estaria na taxa de juros / prazos compatíveis com o risco de crédito do grupo CAOA. Taxas altas e prazos não muito longos. O BNDES é aquela mãe que empresta dinheiro para o filho a juros e prazos camaradas. Parece que acabou o dinheiro da mãe.

Fosse um negócio realmente imperdível, não faltaria financiamento em um mundo de taxas de juro zero e excesso de liquidez. Talvez a compra da fábrica da Ford não seja um negócio imperdível. Talvez por isso a Ford tenha fechado a fábrica. São só conjecturas.

As mentiras convenientes dos políticos

A Economist traz um artigo (traduzido pelo Estadão) criticando as “mentiras” contadas pelos políticos de todas as colorações. Quando você vai ler, as “mentiras” não passam do que conhecemos como “promessas de campanha”.

Em uma campanha política, cabe aos candidatos inculcar nos eleitores “ideias de esperança” em relação a si próprios e “ideias de medo” em relação aos seus adversários. Quando o PT prometia pleno emprego, ou quando dizia que seus adversários iriam acabar com o bolsa-família, estava obviamente mentindo. Mas eram mentiras dentro do contexto de uma eleição. Cabe aos eleitores discernirem o que é factível daquilo que não passa de promessas delirantes.

Aí é que mora o problema. As pessoas querem ouvir notícias boas e rejeitam ouvir as más notícias, mesmo sendo verdadeiras. Muitas vezes não estão preparadas para a verdade nua e crua dos fatos. No mundo dos investimentos, por exemplo, as pessoas tendem a não gostar quando ouvem que “não tem como gerar esse nível de retorno que você quer”. Essa é a mensagem verdadeira, mas que é rejeitada por muitos investidores, que acabam caindo em arapucas que prometem “muita rentabilidade sem risco”.

Vão longe os tempos em que um Churchill não prometia nada além de “sangue, suor e lágrimas”. Hoje todos os políticos mentem. A sociedade assim o quer.

Paul Volcker e a política monetária raíz

Você consegue imaginar a inflação nos EUA em 12% e a taxa básica de juros (a Selic deles) em 20%? Pois é, isso aconteceu nos selvagens inícios dos anos 80.

Com o 2o choque do petróleo em 1979, a inflação subiu de maneira descontrolada no mundo desenvolvido. Paul Volcker era então o presidente do Federal Reserve, o equivalente ao Banco Central norte-americano, responsável por manter o poder de compra da moeda. O instrumento para isso, assim como hoje, eram as taxas de juros básicas, determinadas pelo board do Fed.

Paul Volcker não teve dúvida: para uma inflação que já estava em dois dígitos, não se deixou levar pela cantilena do “esse é um choque de oferta, não um problema de demanda em excesso”, argumento preferido dos adeptos do “um pouco mais de inflação para um pouco mais de crescimento”. Para Volcker, inflação era inflação, não tinha raça nem cor.

A política monetária de Volcker jogou os EUA em uma grande recessão, além de quebrar os países mais endividados, como México e Brasil. Mas controlou a inflação, que era o seu objetivo. E os EUA, para não variar, saíram melhores do que entraram. Tudo porque o presidente do Banco Central, que cumpriu seu mandato sob presidentes democratas e republicanos, teve a ousadia e a autonomia para cumprir o que prescrevia o livro-texto.

RIP, Paul Volcker.