Popularidade nas redes

10 milhões no Facebook e 6 milhões no Twitter é bastante gente. Mas é natural: afinal, trata-se de um presidente da república, e não de um presidente qualquer, mas de um com alta popularidade e que construiu sua campanha eleitoral (e vem governando) através das redes sociais.

Mas esses números são colocados em contexto quando comparados aos de Dilma Rousseff, uma ex-presidente que saiu escorraçada do Palácio do Planalto, com popularidade no nível das Fossas Marianas, fora do poder há mais de 3 anos, que obteve um vexaminoso 4o lugar para a eleição do Senado em MG, e sem relevância alguma no cenário político atual.

Com esse curriulum, Dilma tem 3 milhões de seguidores no Facebook e 6 milhões de seguidores no Twitter.

Ou seja, se o presidente quer mostrar seus números nas redes sociais como uma demonstração de sua popularidade, precisará pensar em outro argumento.

A queda dos juros do cheque especial

E a sensação de deja vu continua. Na época dos pacotes de congelamento de preços, as manchetes do primeiro mês após o início do congelamento eram mais ou menos desse tipo: inflação cai depois do congelamento.

Claro que cai! Afinal, os bancos são regulados pelo Bacen, e obsedem suas determinações. Manchete seria se os juros do cheque especial não tivessem caído. Teríamos um caso claro de desobediência civil.

Mas este é apenas o primeiro momento, em que existe um estoque de cheque especial que não vai sumir da noite para o dia. Para este estoque, os juros caem mesmo, não tem como ser diferente. O problema não é com o estoque, o problema é com a oferta adicional do produto. A lei de oferta e demanda não foi revogada. Então, com um preço forçadamente mais baixo, o produto vai sumir das prateleiras para os devedores contumazes. Era o que sempre acontecia com os produtos que eram alvo dos pacotes de congelamento de preços, e não tem porque ser diferente agora.

Aguarde. Dentro de alguns meses, a reportagem será sobre a dificuldade de renovação do cheque especial. Muitas pessoas terão que dar um jeito nas suas finanças, ou encontrar um outro agiota que as financie. Porque o produto dos agiotas oficiais terá sumido das prateleiras.

Democracia popular

Nem tudo o que é popular é democrático. Aliás, o paradoxo é que, na maior parte das vezes, não é.

A revolução francesa foi popular. Terminou no Terror.

A revolução bolchevique foi popular. Terminou no mais sanguinário regime da história.

A ascensão nazista foi popular. Terminou no maior regime genocida da história.

A revolução cubana foi popular. Terminou na mais longeva ditadura da história.

A ascensão chavista foi popular. Terminou na destruição de um dos países mais ricos da América Latina.

A democracia, pelo contrário, não é popular. Os pais da democracia moderna são os founding fathers da democracia americana, a mais longeva de todas as democracias, que permitiu o desenvolvimento da maior potência econômica e militar da história. A coisa é tão não popular, que o presidente pode ser eleito mesmo se não tiver a maioria dos votos. A representação política é levada a sério.

Quando ouço que manifestações, por serem populares, são democráticas, é preciso qualificar isso a que chamam de “democráticas”. Uma manifestação que tem como objetivo claro submeter o Congresso à discricionariedade do Executivo, pode ser popular, mas certamente não é democrática. O Congresso certamente tem muitos defeitos, assim como os tem o presidente e os membros do judiciário. Isso é uma coisa. Outra coisa é fazer “competição de popularidade”, como se o apoio das ruas representasse a palavra final em um regime democrático. Não é, como fica claro nos exemplos acima.

Enquanto a ditadura é um sistema que agrada alguns e cala outros (e, na maior parte dos casos, é chamada de “democracia popular”), a democracia representativa é esse sistema que desagrada a todos. Mas é o sistema que permite chegar a um mínimo denominador comum na sociedade. Não é pouca coisa.

Checks and balances

O ano é 2004.

O Congresso está parado, sentado em cima de projetos importantes para o país, como a reestatização da Vale, o controle dos meios de comunicação social, a capitalização de 1 trilhão de reais do BNDES e o congelamento de preços de tarifas públicas no país inteiro.

Os petistas, diante desse estado de coisas, convocam manifestação popular para pressionar o Congresso. O filho do presidente Lula diz que, se caísse uma bomba H sobre o Congresso, o povo iria comemorar. O tom dos petistas nas redes sociais (Orkut, no caso) é claramente golpista: o Congresso precisa obedecer o povo. Povo este que, no caso, se confunde com os petistas e aqueles que amam Lula de paixão, que são muitos.

Não, isso não aconteceu. Se tivesse acontecido, Lula teria sido derrubado bem antes de encerrar seu mandato. Por isso, ele optou pelo Mensalão.

Bem, de minha parte, entre uma ditadura sem Congresso ou o Mensalão, prefiro um regime em que o Congresso faz oposição ao presidente. Faz parte dos checks and balances de qualquer democracia madura.

A importância da independência do BC

José Serra é um político que normalmente tem boas ideias no campo microeconômico. Já no macro, sua formação cepalina cobra o seu preço. Hoje, Serra publica artigo atacando a proposta de independência formal (“política”, ele chama) do Banco Central.

Segundo o senador, o BC toma decisões muito importantes para ficar independente. A mais importante delas é o nível da taxa de juros, que tem efeitos fiscais e distributivos. Ele não diz isso, mas é o que se conclui do seu raciocínio, o BC deveria decidir sobre o nível das taxas de juros com um olho no déficit fiscal. E, por isso, não deveria ser independente, subordinando suas decisões ao ente que é responsável pelo déficit, que é o governo.

O que dizer? Bem, no momento que o BC subordinar a política monetária à questão fiscal, a política monetária morre, com tudo o que isso significa para a inflação. Imagine o BC tendo que perguntar ao governante de plantão ou ao Congresso se ele pode aumentar a taxa de juros. Não precisa ser gênio para adivinhar a resposta.

Serra cita o socorro que supostamente os BCs dos países desenvolvidos deram para os bancos e “super-ricos” na crise de 2008 e, por isso, a independência desses bancos estaria em discussão. Bem, não sei de onde ele tirou essa ideia de que há essa discussão nos EUA, na Europa ou no Japão. Só se ele leu alguma coisa a respeito na plataforma do Bernie Sanders. Mesmo porque, não foi o Fed que “salvou” os bancos, foi o Tesouro americano. Foi Obama que deu dinheiro do contribuinte para que a GM, por exemplo, não quebrasse. Os BCs fizeram somente o que está em seu escopo, que é afrouxar a política monetária como nunca antes na história do planeta.

Não custa lembrar que Serra foi candidato à presidência da república duas vezes. Este seu artigo serve mais uma vez de alerta para a importância do projeto de independência do BC. Imagine um governo Serra sem essa independência. Estaríamos competindo com a Argentina pelo título de segunda maior inflação do mundo, atrás da Venezuela.

Mundo à parte

Estava eu pesquisando um restaurante em Quioto, Japão, quando me deparei com um finíssimo, em que o menu começa na bagatela de 600 dólares a cabeça. Não é 600 Bolsos, é 600 Trumps. A 4,50 cada, faça a conta…

Mas, por incrível que pareça, não foi isso que me chamou mais a atenção.

Na página em que o site explica formas de acesso ao restaurante, há várias explicações de como se chega de… trem! Se você está em Tóquio, pegue tal e qual trem, se você está em Osaka, tal e qual trem, se você está na estação de Quioto, pegue tal trem, desça em tal estação e ande 5 minutos, etc.

Ou seja, o sujeito vai gastar quase 3.000 por cabeça em um jantar, e o pessoal acha a coisa mais natural do mundo que essa pessoa vá de trem até o restaurante.

O Japão é mesmo um mundo à parte.

Desemprego de qualidade

Um filme sobre o “mundo do delivery” causa comoção em Cannes. Corto meu dedo mindinho em solidariedade ao Lula Livre se encontrarmos alguém na plateia ou no júri de Cannes que nunca tenha pedido comida em casa ou um produto na Amazon.

Parece que o filme é comovente porque mostra cruamente o esgarçamento das relações familiares causado pela nova economia comandada por algoritmos. O protagonista, coitado, precisa fazer xixi em uma garrafa por pressão de tempo! Ok, bem-vindo ao mundo dos empreendedores! Ou o cineasta acha que aquele emprego estável, com todos os seus “benefícios sociais”, não foi fruto do trabalho insano de um empreendedor, que, muitas vezes, a maioria, sacrificou a própria família?

Sempre que leio esse tipo de reportagem fico me perguntando se esse pessoal realmente acha que “empregos estáveis, com horário definido e benefícios sociais” caem do céu ou são fruto da benevolência do Estado ou dos patrões. E que estes, recentemente, teriam decidido ficar maus como pica-paus e eliminado esses “empregos justos”, precarizando-os, para usar a palavra da moda, sob o olhar complacente de um Estado neoliberal.

Já disse isso aqui: nenhum entregador está obrigado a se filiar a nenhum aplicativo. Pode exercer a sua função de maneira independente, batalhando sozinho pelos seus clientes. Fica, assim, livre do “algoritmo opressor”. Se vai ter sucesso na empreitada, isso é outro problema.

Esse pessoal acha que essa “nova economia” surgiu porque o capitalismo é mau e está sempre procurando um modo de ferrar os trabalhadores. Não lhes ocorre que, se as empresas de entrega fossem obrigadas a equiparar os entregadores a funcionários estáveis, com limites de horas de trabalho e todos os benefícios do trabalho em carteira, o custo da entrega de uma pizza ultrapassaria o custo da própria pizza, inviabilizando o negócio. Teríamos o que vemos hoje em vários outros setores da economia: desemprego de qualidade, ou seja, pessoas com todos os direitos garantidos, mas desempregadas.

Com esse tipo de mentalidade predominando no campo democrata nos EUA e trabalhista no Reino Unido, não é à toa que Bernie Sanders lidere as prévias democratas e Jeremy Corbyn seja o líder dos trabalhistas britânicos. Desse jeito, brucutus como Donald Trump e Boris Johnson terão longa vida, pelo simples fato de não brigarem com a realidade.

Recalque

A tese desse procurador é simples: temos ódio dos funcionários públicos porque somos recalcados, já que sentimos falta dos tempos em que podíamos ser funcionários públicos sem concurso.

1. Não tenho ódio dos funcionários públicos. Só quero que eles caibam no orçamento público, que, não custa lembrar, sou eu que financio. É pedir demais?

2. Esse discurso de recalque nem sequer é novo. Um ex-presidiário de Curitiba usava-o com muito mais maestria, ao dizer que a classe média não gostava dele porque pobre agora podia andar de avião. Um exemplo, convenhamos, muito mais verosímil.

E o mais espantoso é que o procurador deve estar se sentindo o gênio por ter sacado essa do recalque. É cada coisa que aparece…

Manifestações para quê?

Soube que há uma convocação para uma manifestação de apoio ao governo, para pressionar o Congresso a votar pautas importantes para o País.

No ano passado, manifestações também foram convocadas. Tinham como objetivo pressionar o Congresso a votar a Reforma da Previdência, recém enviada pelo governo, e o pacote anti-crime do Moro. Duas pautas importantíssimas para o futuro do País.

Este ano, as manifestações servirão para pressionar o Congresso a votar a Reforma Administrativa, de modo a controlar o segundo maior item de gasto da União. Não, acho que não é isso, o governo não enviou nenhuma proposta de reforma administrativa até o momento.

Então, as manifestações servirão para pressionar o Congresso a votar a Reforma Tributária, diminuindo o pesadelo de empresas e cidadãos diante de um sistema tributário dantesco. Não, não é isso, o governo também não enviou nenhuma proposta de reforma tributária para o Congresso até agora.

Então, devem ser manifestações para pressionar o Congresso a votar a Reforma Política, que finalmente vai fazer do Congresso uma Casa do Povo, representando fielmente a vontade popular. Não, o governo nem sequer está pensando em uma reforma política.

Ah, então devem ser manifestações para pressionar o Congresso a autorizar a venda de grandes estatais, abrindo caminho para um aumento brutal de produtividade da economia. Não, o governo não enviou ao Congresso nenhum pedido de autorização para privatizar uma estatalzinha sequer. (A Eletrobras está no Congresso, mas quem enviou foi o Temer).

Parece que essas manifestações têm algo a ver com emendas parlamentares ou algo do gênero, se não estou enganado. Não sei se vale a pena sujar minha camisa amarela.