No início do governo Bolsonaro, escrevi aqui alguns posts defendendo o diálogo político como forma de avançar a agenda do governo no Congresso. Em determinado momento, caiu-me a ficha ao ler o post de um bolsonarista-raiz: que raios afinal eu queria? Que o governo eleito com o discurso da anti-política, que defendia uma tal “nova política”, entrasse em conchavos típicos da “velha política”? De fato, aquilo não fazia sentido.
A “nova política” seria a política dos superiores morais: o bom, o belo e o justo se imporiam com a força do povo nas ruas. Todas as reformas, econômicas, políticas e morais, se fariam realidade pela liderança de um ser impoluto, a encarnação do bem, liderando uma verdadeira limpeza do ambiente político. O Congresso seria um mero detalhe, um coadjuvante nesse processo.
Na época concordei com esse ponto de vista, ainda que não visse muito futuro nessa linha. Afinal, por mais que a “verdade que liberta” estivesse ao lado do governante de plantão, o sistema político reflete a complexidade de um país multifacetado. Bolsonaro recebeu mais de 50 milhões de votos, mas não conseguiu sequer eleger a maior bancada do Congresso. Bancada essa que se esfacelou em poucos meses. Como ainda temos Congresso, e não parece que estejamos a ponto de fechá-lo, de alguma maneira haveria de haver uma composição.
Não acho estranho que a composição tenha acontecido. Afinal, Bolsonaro pode ser tudo, menos lunático. O que realmente me espanta é que os bolsonaristas, desde os parlamentares até os seus apoiadores aqui na rede, tenham perdoado Bolsonaro por ter “entrado no jogo” da velha política. Afinal, ficou claro que não se segue uma agenda, mas uma pessoa. Esta pessoa já abandonou a agenda anticorrupção e a agenda liberal. Falta a agenda de costumes, mas esta faz parte do núcleo anti-esquerda, então será mais difícil abandonar. E, convenhamos, ao contrário das outras duas, não é preciso abandoná-la para compor com uma parte relevante do Congresso.
A historinha da “nova política” está sepultada. E os bolsonaristas estão fazendo cara de paisagem.