A constitucionalidade do contrato intermitente de trabalho está em julgamento no STF. Para quem não lembra, o contrato intermitente permite registrar empregados sem uma jornada fixa de trabalho. O funcionário pode ser chamado a qualquer tempo, dentro de certas regras. Como todo empregado registrado, terá direito a férias, 13o e FGTS proporcionais.
Pois bem. O relator da ação, ministro Edson Fachin, votou contra, alegando que “o modelo não se coaduna com a dignidade da pessoa humana”. E o ministro específica: essa incerteza sobre se vai trabalhar ou não deixaria o trabalhador “sem as condições de gozar de direitos sociais fundamentais”, mais especificamente, “sem conseguir a renda mínima que LHE DEVERIA SER ASSEGURADA” (grifo meu).
Onde vive esse ministro do STF? Do que se alimenta? Como se reproduz? Tudo isso, no Globo Repórter.
No habitat do ministro, ali na linda Praça dos 3 Poderes, a Constituição garante trabalho para todos com uma remuneração justa assegurada. Que país feliz!
Já aqui no Brasil, a coisa é um pouco diferente. O sujeito que não é contratado de forma intermitente, tem, de fato, uma renda mínima assegurada: zero. E há certeza sobre quando vai trabalhar: nunca. Para surpresa de ninguém, a ação foi proposta por um sindicato. Assim como o ministro, o sindicato está preocupado com os peixinhos do seu aquário. Uma vez tendo o privilégio de ser registrado, o contrato deve dar ao trabalhador todas as garantias possíveis e imagináveis, para que “se coadune com a dignidade da pessoa humana”. Que se danem os peixinhos que não têm a sorte de estarem no aquário, que são a imensa maioria.
No planeta onde o ministro e o sindicato vivem, deveria ser possível colocar todos os peixinhos no aquário. Não lhes ocorre que o aquário é tão cheio de garantias de “dignidade humana”, que acaba se tornando muito pequeno para caber todo mundo, dadas as limitações econômicas. Resultado: uma minoria privilegiada com garantia de acesso a todos os “direitos sociais”, cercada de uma imensa massa largada no oceano da pobreza.
A desigualdade social no Brasil não é um acidente de percurso. É um estado de espirito.