IGP-M vs IPCA

Hoje assinei um contrato de aluguel como fiador. A única exigência que fiz foi a troca do índice de reajuste, do IGP-M para o IPCA. Fui atendido.

O corretor, ao ouvir minha exigência, tentou explicar que aquilo era padrão, difícil de mudar, etc. Argumentei que se tratava de um índice de livre determinação entre as partes, não há nenhuma lei que obrigue a ser o IGP-M. Foi então que o corretor colocou o argumento que tenho ouvido aqui e ali: você acredita no IPCA?

Em 2020 o IPCA fechou com alta de 4,52%, enquanto o IGP-DI (que é o IGP-M medido no mesmo período de tempo do IPCA) fechou em 23,08%. A diferença é gigantesca e alimenta suspeitas de manipulação do IPCA. Agrega à desconfiança o fato de o IPCA ser calculado pelo IBGE (um órgão do governo), enquanto o IGP-M é calculado pela FGV (um instituto privado).

O que pensar?

A diferença entre os dois índices foi muito grande esse ano, sem dúvida, mas plenamente possível de ser explicada. Lembre-se, em primeiro lugar, que 2020 foi um ano de grandes distorções em diversas variáveis macroeconômicas e muita volatilidade de preços. Isso acaba se refletindo também na inflação. Vamos lá.

O IGP-DI é formado por três grandes grupos de preços: os preços no atacado (60% do índice), os preços para o consumidor (30% do índice) e os preços da construção civil (10% do índice). Por causa da intensa desvalorização do real, os preços no atacado sofreram uma alta substancial: 31,7%. Estes preços no atacado são formados pelos preços agrícolas (alta de 46,9%) e preços industriais (alta de 26,3%). Nós, consumidores, não vemos estes preços. Quem vê são as empresas, que compram no atacado e podem ou não repassar esses preços para o consumidor. Como foi um ano de grande desaceleração da atividade econômica, o espaço para repasses foi muito pequeno, o que explica que grande parte desta alta não tenha se transferido para o consumidor.

Continuando: os preços da construção civil subiram 8,8%, sendo que materiais subiram 16,3% enquanto mão-de-obra subiu meros 2,6%. Como se vê, foi uma inflação de produtos e não de salários.

Por fim, os preços ao consumidor do IGP-DI subiram 5,2%. Este é o sub-índice que deve ser comparado com o IPCA, que subiu 4,5%. Como se vê, a diferença foi mínima. Portanto, no que se refere aos preços ao consumidor, IBGE e FGV concordam, afastando a hipótese de manipulação.

Por fim, em relação ao reajuste de alugueis: por que cargas d’água o aluguel de uma residência deve ser reajustado com base no aumento da chapa de aço que a montadora compra da companhia siderúrgica? Ou com base no preço que o chinês está pagando na soja? O IGP-M está distante de refletir a cesta de consumo tanto do locador quanto do locatário. É um índice completamente inadequado para reajustar o aluguel. Já está mais do que na hora de o mercado de aluguel mudar este critério de reajuste.

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