Ontem o governo anunciou que iria enviar um projeto de lei para o Congresso com o objetivo de vender suas ações da Petrobras, de forma a perder o controle da companhia. Mais ou menos o que vai acontecer com a Eletrobrás. Obviamente, ninguém deu muita importância para o assunto. Imagine tentar privatizar a mãe de todas as estatais em ano eleitoral. Na verdade, imagine tentar privatizar a mãe de todas as estatais, independentemente do ano. Claro que se tratou de uma manobra diversionista, para distrair o distinto público dos problemas com os preços dos combustíveis. E, porque não, dar uma de governo liberal depois da lambança com o teto de gastos na semana passada.
Mas, independentemente da motivação, gostaria de chamar a atenção para um fato: Bolsonaro é o primeiro chefe de governo que toma uma iniciativa nessa direção. Na verdade, é o primeiro chefe de governo que simplesmente fala em privatizar a Petrobrás.
Dos chamados “presidenciáveis” com alguma chance, talvez os dois pré-candidatos do PSDB fossem os únicos a aventar a hipótese. Lula e Ciro, nem pensar.
No entanto, Eduardo Leite (que privatizou empresas do setor elétrico no RS), ao ser perguntado, em entrevista no Valor Econômico de ontem, sobre uma eventual privatização da Petrobras em um seu governo, respondeu: “Falar em privatização da Petrobras inteira é equivocado. Privatização de subsidiária, sim, mas ceder o controle é precipitado e difícil de fazer. Não se consegue comprador e, mais uma vez, tem um custo político alto com resultados pouco concretos”. Portanto, com Leite, a privatização nem seria tentada.
Não conheço a opinião de Doria sobre o assunto. Mas para um governador que não moveu uma única palha na direção da privatização de uma mera empresa de saneamento como a Sabesp, difícil imaginar que gastaria seu tempo com algo muito maior e mais complicado.
Ser dono da Petrobrás tem o ônus político de ter o país inteiro na sua cola quando o preço do combustível sobe e os bônus de poder “controlar” a inflação via controle dos preços dos combustíveis, apadrinhar aliados políticos em cargos na estatal e, eventualmente, saquear a empresa. Para um presidente que não está interessado em nenhum desses bônus, só resta o ônus. Talvez Bolsonaro tenha finalmente percebido isso.
No filme Inception (A Origem), um “engenheiro de sonhos” ganha a vida penetrando na mente das pessoas para inserir ideias que resultarão em atos na vida real. Este movimento de Bolsonaro não vai dar em nada agora, mas pode funcionar como um pequeno “inception” na mente da sociedade brasileira. Alguém teve a ousadia de concretamente propor o impensável, a privatização da mãe de todas as estatais. Em outros tempos, isto seria mais que um tiro no pé, seria um tiro no coração de qualquer candidato a presidente. Hoje, aparentemente, o jogo mudou.
Quem sabe não estejamos presenciando o início de um processo que nos livrará, em alguns anos, desse peso para a sociedade brasileira, que deveria estar investindo em educação e saúde, mas continua gastando suas energias e foco em furar poços de petróleo. Sonhar não custa nada.