Além do Brasil, a OCDE convidou mais 5 países para entrarem no clube privê: Argentina e Peru na América Latina, e Bulgária, Croácia e Romênia, na Europa. Estamos bem acompanhados.
A Colômbia recebeu este mesmo convite em 2018. O Chile, em 2009. E o México, em 1994.Nós poderíamos ter sido convidados na mesma época do Chile. Com a economia em crescimento e com o selo de grau de investimento, o Brasil era o queridinho do mercado global. Mas o governo do PT esnobou o “clube dos ricos”, porque nos imporia “políticas neoliberais”. Afinal, tínhamos a nossa própria fórmula para o sucesso.
Este é apenas mais um capítulo em que o PT representou um atraso de vida para o país. No caso, um atraso de mais de 10 anos. O governo Temer tratou de recuperar o tempo perdido, mostrando, em 2017, interesse no ingresso do Brasil no clube. O governo Bolsonaro reiterou o interesse, resultando no convite formal. Algo que poderia ter acontecido em 2009.
Este é um processo que demora de 2 a 5 anos para ser concluído. Se um governo do PT for eleito, o mesmo viés que nos fez perder o bonde da história no passado pode novamente nos fazer reféns do atraso. Lembrando que foi no governo do pragmático Lula que nós esnobamos a OCDE. Será que o pragmático Lula mudou de ideia?
“O número de crianças mortas por Covid é insignificante”. Com essa frase, o presidente Jair Bolsonaro procurou diminuir a importância da vacinação de crianças contra a Covid.
Há basicamente três motivos levantados por aqueles que minimizam a importância da vacinação de crianças:
Trata-se de uma doença de velhos, não de jovens, e muito menos de crianças. É neste contexto que se encaixa a frase do presidente.
A vacina não serviria como inibidor de transmissão, e a avalanche da ômicron provaria a tese. Portanto, o argumento da imunidade de rebanho, que poderia ser usado para justificar a vacinação de crianças, não se aplicaria.
Trata-se de uma vacina “experimental”, em que pouco se conhece seus efeitos de longo prazo.
Neste post, vou me ater ao primeiro ponto. O terceiro ponto foi competentemente abordado pelo meu amigo Paulo Buchsbaum no post Histórias movem as pessoas. Já em relação ao segundo, até onde eu saiba, não há evidências nem para um lado, nem para o outro. E, como diz meu amigo e companheiro de blog Marcelo Porto, não parece ser muito ético usar as crianças como escudo protetor para uma doença que é mais letal em outras faixas etárias. Claro, se os pontos 1 e 3 não puderem ser contestados adequadamente. Se o forem, a vacinação de crianças se justifica por si mesma.
Particularmente prefiro os dados do SIM, e o gráfico abaixo mostra por quê.
O SIM disponibiliza dados desde 2009 até 2019, enquanto o Portal da Transparência começa a sua série em 2015, terminando agora em 2022. As barras representam o crescimento de ano para ano nas duas séries. Observe como o crescimento de óbitos pelo SIM é muito mais constante e próximo do crescimento populacional, que é o que se poderia esperar. Já o crescimento do número de óbitos registrados em cartório é muito mais errático e, principalmente, não guarda relação com o crescimento populacional. Em 2016, por exemplo, o número de óbitos, segundo o Portal da Transparência, aumentou cerca de 13% em relação a 2015 e, em 2018, quase 11%, números pouco confiáveis. Em 2020 e 2021 o crescimento do número de óbitos é maior por conta da Covid, mas é difícil tirar uma regra, considerando o comportamento errático anterior.
Infelizmente, os dados do SIM terminam em 2019. Portanto, não temos ainda os dados dos óbitos em 2020 e 2021 de acordo com este sistema. No entanto, há um outro sistema, específico para SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave), que tem dados mais atualizados. Trata-se da Vigilância de SRAG dentro do DataSus. São bases de dados gigantes, pois agregam informações das mais diversas sobre SRAG. Com isso, podemos conferir os dados do post abaixo, publicado pelo site Poder 360:
Explorando os dados da Vigilância de SRAG, cheguei em 279 e 270 óbitos por Covid em 2020 e 2021 respectivamente, para crianças entre 5 e 11 anos de idade. Portanto, compatível com o número apresentado no post.
Já para a média de mortes de crianças entre 5 e 11 anos de idade, precisamos lançar mão do SIM. O post diz que este cálculo foi feito entre 2016 e 2020, mas o ano de 2020 não está disponível neste site. Fiz a conta com os anos de 2016 a 2019. Além disso, a estratificação do SIM é de 5 a 9 anos e 10 a 14 anos. Não há, portanto, a estratificação de 5 a 11 anos. Assumi, então, uma regra de linearidade, e considerei que os óbitos entre 10 e 11 anos representam 2/5 dos óbitos entre 10 a 14 anos. Fazendo estes cálculos, cheguei a uma média de óbitos nessa faixa etária de 5.005 por ano. Com essa base, os óbitos por Covid em 2020 representam 5,4% da média de óbitos nessa faixa etária. Um número, portanto, menor do que os 7% do post.
Mas este não é o ponto principal do post. 7% ou 5,4% são números igualmente pequenos, não chamam muito a atenção. O que realmente chama a atenção no post é a Covid estar em 2º lugar como a principal causa mortis nessa faixa etária.
Usando a base de dados do SIM entre 2016 e 2019, e fazendo o cálculo descrito acima para inferir os óbitos na faixa de 5-11 anos, eu chego no seguinte ranking:
Para fazer esse ranking, usei como critério as CIDs (código internacional de doenças). Ou seja, o óbito precisa ter uma CID concreta. No post do Poder360, por exemplo, é incluído “doença circulatória”, que engloba vários CIDs. Por isso, não entra no meu ranking.
Agora, a interpretação.
Podemos ler este gráfico de duas maneiras: maximizando ou minimizando o problema da Covid. A leitura que maximiza o problema da Covid vai dizer que a doença já se encontra entre as principais causas de morte de crianças. Podemos dizer que é a segunda causa, estatisticamente empatada com agressões, afogamento e leucemia. A leitura que minimiza a importância da doença vai nos dizer que a Covid se perde no meio de uma série de outras causas, representando apenas 5,4% dos óbitos nessa faixa etária.
Antes de passar para a parte opinativa do post, apenas um adendo metodológico, envolvendo os dados dos cartórios. Infelizmente, o Portal da Transparência estratifica os óbitos somente em menores de 9 anos. Essa estratificação inclui a mortalidade infantil dos bebês até 1 ano de idade, que representaram, em 2019, segundo o SIM, 79,7% das mortes de crianças menores de 9 anos. Por outro lado, segundo os dados da Vigilância SRAG, os óbitos por Covid de bebês de menores de 1 ano totalizaram cerca de 11% dos óbitos nessa faixa etária nos anos de 2020 e 2021. Portanto, a estratificação do Portal da Transparência é inútil para inferir qualquer informação sobre a incidência da Covid nessa faixa etária, pois os óbitos de bebês menores de 1 ano distorcem os dados.
A ilusão da objetividade
A figura abaixo é clássica na ilusão de ótica: o que você vê, uma moça ou uma velha? O desenho é único, mas está sujeito à interpretação de quem vê.
A matemática tem uma aura de objetividade. Números são números, não há como argumentar que 2 + 2 = 5. No entanto, como vimos acima, os mesmíssimos números podem ser usados para se construir a narrativa que se queira. Afinal, a Covid é uma doença importante ou insignificante na faixa etária de 5 a 11 anos de idade? Estamos vendo uma moça ou uma velha?
Esta discussão, na verdade, somente seria relevante se a vacinação fosse obrigatória. Neste caso, haveria uma interpretação única, imposta, a de que a letalidade da Covid em crianças merece uma resposta dura das autoridades sanitárias. Mas não é o caso, pelo menos por enquanto. O que se tem, como sempre se teve, são campanhas de vacinação.
A interpretação fica a cargo dos pais. Se os pais entendem que este número é “insignificante”, podem optar por não vacinar, assumindo o mesmo risco de óbito por leucemia, por exemplo, conforme vimos no gráfico acima. Imagine que houvesse uma vacina que diminuísse a probabilidade de se desenvolver leucemia: será que esses mesmos pais jogariam com a sorte?
Por outro lado, pais que interpretam esses números de maneira alarmante, gostariam de poder contar com a vacina para os seus filhos. E é neste ponto que o governo Bolsonaro pisou na bola. Ao propositalmente postergar o início da vacinação nessa faixa etária, o governo atrasou a opção que muitos pais queriam para os seus filhos. Para um político que gosta de dizer que respeita a liberdade das pessoas, neste caso Bolsonaro não respeitou a liberdade dos pais de vacinarem seus filhos, ao adotar chicanas que atrasaram o processo.
Infelizmente não tenho mais filhos nessa faixa etária (que saudades!). Se eu tivesse, entendo que a probabilidade joga pela vacinação. Portanto, eu iria vaciná-los. Afinal, cresci em um mundo em que as vacinas, assim como os remédios de maneira geral, eram consideradas um grande avanço da humanidade, e que permitiram uma vida mais longa e saudável. Não mudei de ideia.
Fui dar uma olhada a respeito da prática de bloquear aplicativos e sites ao redor do mundo. Há alguns casos.
A China é, de longe, o país que mais bloqueia o acesso a aplicativos específicos. O motivo não poderia ser outro: segurança nacional, ameaçada por ideias subversivas.
O mesmo ocorre em Cuba, que bloqueou o acesso às redes sociais durante os últimos protestos.
O governo da Índia vem bloqueando o acesso a aplicativos chineses, como forma de se proteger de “roubo de dados”.
O mesmo fez Donald Trump no apagar das luzes de seu governo, ao emitir uma ordem executiva para bloquear oito aplicativos chineses de pagamento. O motivo: tráfego de dados sensíveis e que, supostamente, ficariam disponíveis para o governo chinês. Biden revogou essa ordem em junho último, mas seu governo continua discutindo o que fazer com essa fragilidade.
Notem a diferença entre os casos de China e Cuba e os casos de India e EUA. Enquanto nestes últimos há uma preocupação com a exposição de dados para um governo hostil, nos primeiros o que há é pura e simplesmente censura de conteúdo contra seus próprios cidadãos.
Com relação especificamente ao Telegram, a notícia é de que o aplicativo já foi bloqueado em 11 países.
Na matéria, obviamente, não há uma lista desses 11 países. O número está lá somente para passar a impressão de que não estamos sozinhos, a oposição ao Telegram está se tornando generalizada. Mas não é à toa que a lista de países não foi divulgada pela reportagem.
Dando um Google, descobrimos que essa lista de países preocupados em proteger suas democracias incluem Rússia, Irã, Ucrânia, China, Cuba, Bahrein, Belarus, Paquistão e Indonésia. A justiça brasileira, ao ameaçar bloquear o Telegram, se alinha a esses gigantes da democracia. Parabéns aos envolvidos.
Manchete principal no Estadão de hoje, a inadimplência das famílias mereceu extensa reportagem do jornal. Mesmo famílias que haviam renegociado suas dívidas voltaram a ficar inadimplentes em nível recorde.
As pessoas acumulam dívidas quando gastam mais do que ganham. Isso é o óbvio, todo mundo conhece essa regra básica. Se, como diz a advogada que serve de exemplo para a matéria, “dívida tira o sono da gente”, e todo mundo conhece essa regra básica, porque então um contingente grande de famílias fica inadimplente? Ou pior, reincide na inadimplência?
Tirando os casos mais extremos, de um acidente ou doença, ou a perda do emprego, o que acontece é que as pessoas simplesmente não sabem quanto ganham e não sabem quanto gastam. Mesmo nos casos extremos descritos acima, o efeito sobre o orçamento é tanto maior quanto maior for o descontrole ou o consumo incompatível com a renda. Quando há controle, normalmente a pessoa consegue constituir uma reserva de emergência, além de conseguir adaptar mais rapidamente o seu padrão de vida à nova situação de aperto.
A inflação alta piora a situação, mas não a cria. Para quem já estava vivendo no limite de seu orçamento, o aumento dos preços vai pressionando os gastos sem que a pessoa sinta. Quando vai ver, o orçamento já foi extrapolado e a pessoa vai notar quando começa a ter dificuldade de pagar suas dívidas.
A julgar pelo ambiente onde foi tirada a foto, não parece que a advogada que ilustra a matéria faz parte da massa de miseráveis que, infelizmente, só faz crescer no país.
Arrisco dizer, sem ter mais informações, de que se trata de um problema de controle e de abrir mão de um certo padrão de vida. Infelizmente, as pessoas só muito tarde vão entender que o seu padrão de vida acima do que a renda lhe permite, além da falta de controle, custa muito caro, pois além do custo em si do padrão de vida, os juros também precisarão ser pagos. Além das noites de falta de sono, que não voltam.
Editorial do Estadão repercute matéria do mesmo jornal, dando conta do aumento do custo da eletricidade nos últimos 7 anos, muito acima da inflação média.
A eletricidade, assim como a maior parte dos bens de consumo no país, é altamente taxada. É a escolha que fizemos: taxar o consumo ao invés de taxar a renda, como acontece nos países mais desenvolvidos. A taxação sobre o consumo é mais regressiva do que sobre a renda, pois alcança igualmente pobres e ricos. Todos pagam o mesmo imposto, pois não há diferenciação de preços por tipo de consumidor.
No caso da eletricidade, no entanto, há sim diferenciação de preços. Consumidores rurais, de energia solar e de baixíssima renda contam com subsídios, distribuídos por entre aqueles que não têm direito à tarifa diferenciada. Estes subsídios funcionam como um imposto adicional. Se estivessem no orçamento ao invés de na conta de luz, poderia significar um desconto de 9% na conta. Mas é mais fácil aprovar um subsídio que ninguém vê do que achar espaço no orçamento.
Além disso, estamos pagando a conta de populismos do passado. A MP 579, com a qual a então presidente Dilma Rousseff baixou as contas de luz em 20% em 2013, não passou de um exercício de prestidigitação: o custo da eletricidade não baixou um real, foi apenas adiado com juros e correção. Ainda estamos pagando essa conta, na forma de encargos na CDE, Conta de Desenvolvimento Energético, um nome desenvolvimentista para o cemitério aonde aportam todos os esqueletos do setor.
E a CDE já está preparando mais covas, com os jabutis aprovados pela MP da privatização da Eletrobrás. Construção de termoelétricas em lugares estapafúrdios e reserva de mercado para pequenas hidroelétricas prometem novos encargos a serem pagos pelo consumidor de eletricidade do futuro.
No Brasil, o populismo é árvore frondosa, que abriga sob sua sombra governos de todas as cores.
Já tive oportunidade de escrever sobre este assunto por ocasião da expulsão de Tabata Amaral e Felipe Rigoni do PDT e do PSB na época. Minha opinião era de que a democracia no modelo ocidental é representativa e gira em torno de partidos. Outros países até admitem candidaturas avulsas, mas estas não costumam ir muito longe. Eleições são empreendimentos grandes e custosos, e é difícil alguém sozinho ter sucesso. O caso de Bolsonaro em 2018, que foi praticamente um candidato avulso, foi uma exceção à regra.
Pois bem. Os tais “movimentos de renovação política” criaram uma jabuticaba: o parlamentar avulso dentro de um partido. O truque foi a assinatura de uma tal “carta compromisso”, que libera o congressista para ter suas próprias posições sem ser punido pelo partido. Foi esta carta compromisso que livrou Tabata Amaral e Felipe Rigoni de perderem seus mandatos ao saírem de seus partidos.
PDT e PSB são partidos ideológicos (mais o primeiro do que o segundo). Ambos fecharam questão contra a reforma da Previdência. Isso não deveria ser surpresa para ninguém, mas Tabata e Felipe se filiaram a esses partidos assim mesmo. Provavelmente procuravam partidos de esquerda (afinal, quem não é esquerda no Brasil é porque não tem coração) mas queriam manter uma visão moderna dos problemas econômicos. Uma contradição em termos.
Os caciques do PDT e do PSB avisaram que não vão mais aceitar “cartas compromisso”, no que estão muito certos. Costumamos reclamar que ao Brasil faltam partidos fortes, definidos ideologicamente. Então, PDT e PSB avisaram que não têm mais espaço para parlamentares com suas próprias ideias. Quer dizer, pode debater à vontade, mas a votação é definida pelo partido nos temas que importam.
Isso favorece os caciques? Sim. Não está satisfeito? Funde o seu próprio partido. Marina Silva, por exemplo, se indispôs com o cacique do PV e tentou fundar o seu próprio partido. A Rede hoje corre o risco de morrer de inanição. Em 2018 elegeu 14 parlamentares no Brasil inteiro, contra 31 do PV.
Há também a possibilidade de se filiar a um partido-ônibus, onde cabem todas as opiniões. PMDB, PSD e o novo União Brasil são exemplos. Felipe Rigoni entendeu a mensagem e vai se filiar ao União. Já Tabata Amaral se filiou ao PSB, o mesmo PSB que puniu Rigoni pelo mesmo motivo que ela, Tabata, foi punida pelo PDT. Pode parecer uma contradição, mas o coração tem razões que a razão desconhece.
Desde o “é proibido gastar” do discurso de inauguração do mandato de Tancredo Neves (lido pelo vice, José Sarney, dado que Tancredo encontrava-se hospitalizado), todos os governos da Nova República fazem juras de amor ao “equilíbrio fiscal”.
Destaquei abaixo três trechos de jornais antigos para ilustrar o ponto. O primeiro é do início do governo Sarney, em 1985, quando o então ministro Francisco Dornelles anuncia um pacote de “austeridade”.
O segundo, de um ano depois, mostra o então ministro Dilson Funaro prometendo “equilíbrio dos gastos públicos”.
Já o terceiro indica a expectativa com o Plano Bresser, que seria anunciado alguns dias depois, em junho de 1987: esperava-se “comprimir drasticamente as despesas públicas”.
Poderia continuar empilhando notícias, ano após ano, governo após governo, de promessas de “equilíbrio fiscal”. Talk is cheap, como dizem os americanos.
Agora, Ciro promete um tal de “equilíbrio fiscal verdadeiro”, o que pressupõe que o que estamos vivendo hoje é um falso equilíbrio fiscal. E o que nos está condenando a este “falso equilíbrio fiscal”? Claro, “essa ficção fraudulenta chamada teto de gastos”.
Equilíbrio fiscal é algo relativamente simples: o governo, em todas as suas esferas, precisa gastar menos do que arrecada. Há somente duas pontas: gastos e arrecadação. Se o teto de gastos é uma forma fraudulenta de atingir o equilíbrio fiscal, resta a ponta da arrecadação. Aqui é que entra o pensamento mágico, aquele que anima todas as propostas desse tipo: aumentar a arrecadação passa por “taxar os mais ricos” e “estimular o crescimento econômico”.
Como, cedo ou tarde, os governos descobrem que “taxar os mais ricos” é uma quimera e o “crescimento econômico” não costuma responder a grandes planos mirabolantes desenhados nos gabinetes de Brasília, o equilíbrio fiscal acaba sendo alcançado pelo truque mais manjado da história econômica brasileira: inflação.
O teto de gastos é a única forma honesta de se alcançar o “verdadeiro equilíbrio fiscal”. Fraudulento é Ciro Gomes, não o teto.
Até um relógio parado acerta a hora duas vezes ao dia. É o caso da colunista Eliane Catanhêde, que já mereceu alguns posts carinhosos nessa página, mas que desta vez acertou, ao fazer o diagnóstico de que bater em Lula é a chance de Moro (e, de resto, de qualquer candidato da chamada “3a via”) de chegar ao 2o turno.
Já tive oportunidade de escrever várias vezes aqui: bater em Bolsonaro, como insistiu Alckmin em 2018 e insistem todos os “defensores da democracia” até aqui, é inútil. Esse campo pertence à esquerda. A única chance é bater em Lula, para tirar de Bolsonaro a coroa de único antipetista de verdade da praça. E Moro tem esse figurino natural, dado que foi o juiz que colocou Lula na cadeia.
Hoje, Moro estreia uma coluna quinzenal no site O Antagonista (link nos comentários). A estratégia é a mesma já percebida por Catanhêde: bater em Lula. Não há uma mísera menção a Bolsonaro. Moro não se coloca como um típico 3a via, equidistante do demônio e de belzebu. A sua estratégia é mostrar que pode ser o antipetista que as viúvas de Bolsonaro (aqueles que votaram no capitão e se arrependeram) estão à procura.
É claro que ser antipetista não se restringe a bater em Lula. É preciso ter uma agenda antipetista, conservadora e liberal. Isso se verá ao longo da campanha. Mas esse primeiro passo parece promissor, diferente de tudo o que os chamados candidatos da 3a via estão fazendo.
Sempre haverá um núcleo duro, que vê no capitão o Messias que veio salvar o Brasil. Estes não votariam em outro candidato nem que Jesus Cristo disputasse a eleição. Mas há uma massa de simpatizantes do capitão que poderiam migrar para uma candidatura Moro se este ganhar terreno nas pesquisas ao longo dos próximos meses e mostrar que pode agregar mais contra Lula em um 2o turno.
Sergio Moro, hoje, tem a grande vantagem, sobre todos os outros candidatos da chamada “3a via”, de ter um patrimônio eleitoral inicial não desprezível, algo como 8% das intenções de voto, a depender da pesquisa. Este primeiro passo acertado lhe dá uma segunda vantagem. Vamos ver se isso se traduz em aumento das intenções de voto nas próximas pesquisas.
PS.: ainda estou longe de ter candidato. Isto que vai acima é apenas uma análise, não uma torcida.
Certamente você já tentou segurar água com as mãos em formato de concha. É questão de (pouco) tempo para a água desaparecer entre os dedos.
Essa tentativa do TSE de controlar os aplicativos de mensagem se assemelha a esse fenômeno. As mensagens chegarão ao seu destino, o que quer que o TSE faça ou deixe de fazer. Sempre foi assim ao longo da história.
Apenas para ficar nos casos mais famosos, Hitler não precisou de um aplicativo de mensagens para ganhar corações e mentes da maioria do povo alemão, assim como Stálin não precisou do WhatsApp ou do Telegram para manter toda uma sociedade sob o regime do medo durante vários anos. Claro que se essas ferramentas estivessem disponíveis eles as usariam. Mas a história mostra que não são essenciais. O que importam são as ideias, e essas se espalham como a água, por mais que se tente segurá-las.
Para não dizer que usei apenas exemplos extremos, grandes movimentos cívicos brasileiros, que tinham como objetivo a derrubada de regimes, como a marcha da família com Deus pela liberdade ou os comícios das Diretas Já, não precisaram de aplicativos de mensagens para atraírem apoio.
Claro que os aplicativos de mensagens potencializam o “problema” do compartilhamento de ideias, pois permitem um alcance maior e mais rápido. É um pouco como comparar carroças com carros, ambos servem para chegar do ponto A até o ponto B, mas o carro chega mais rápido. Mas isso não muda a natureza da coisa, como a história demonstra. Mesmo porque, as mesmas ferramentas estão disponíveis para todos. Então, o que vale, o que continua valendo, sempre, são as ideias.
E este é o ponto fundamental: grande parte das pessoas forma sua opinião e apenas DEPOIS busca informações (verdadeiras ou falsas) que confirmem o seu ponto de vista. Posso dizer que sou veterano de redes sociais. Nunca vi, em todos esses anos, uma única pessoa mudar de opinião em discussões no Facebook ou em grupos no WhatsApp. Pelo contrário, parece que as opiniões iniciais se cristalizam ainda mais depois dessas discussões. Assim, as pessoas filtram as informações que querem receber, não são a página em branco idealizada pelos ministros do TSE. Por isso, controlar os aplicativos de mensagem, além de ser uma tarefa de Sísifo, é inútil.
Por fim, não deixa de ser curioso o presidente do TSE, que é também ministro do STF, levantar o problema da falta de representante do Telegram no país apenas em relação às eleições.
O Telegram pode ser (e certamente é) usado por contraventores para planejar os seus crimes. Esse tipo de uso, no entanto, não chama a atenção do STF, que nunca levantou o problema da falta de representante do aplicativo no Brasil. O que não pode é servir de canal para feique nius durante as eleições. Pensando bem, para um STF que julga com base em mensagens hackeadas ilegalmente do próprio Telegram, está tudo muito coerente.