O estadista e o populista

Entre 1984 e 1985, Margaret Thatcher enfrentou e venceu uma greve de um ano dos trabalhadores das minas de carvão. Na época, as minas eram estatais, e o governo Thatcher anunciou uma reestruturação, com o fechamento de algumas minas, o que detonou a greve. Vale notar que o mesmo sindicato, 10 anos antes, havia derrubado o último governo conservador britânico, liderado por Edward Heath. Thatcher foi firme apesar de todas as consequências da greve, que terminou sem uma única concessão do governo.

O Brasil é um país onde este tipo de evento é inimaginável. Somos o país da contemporização. Em linguagem comum, do “jeitinho”. Nossa independência foi sem sangue, nossos golpes foram de gabinete, nossa guerras civis foram brincadeiras de crianças quando comparadas com as guerras fratricidas de outros países. Na guerra de secessão nos EUA, por exemplo, morreram 600 mil pessoas, o que equivaleria, em população de hoje, a nada menos do que 5 milhões. Foi o preço que Abraham Lincoln topou pagar para manter o país unido.

Thatcher e Lincoln eram estadistas. Enxergavam o efeito de suas ações além do seus mandatos. Atuavam pelo princípio, não pela conveniência imediata. O oposto de estadista é o populista. O populista está de olho no efeito imediato de suas ações. Mede os seus atos pela simpatia que levantam entre os seus. Sob a capa do “bom senso”, não medem as consequências do que fazem em termos de anos ou décadas, mas em termos de dias e semanas. O país, na mão de populistas, piora e nem sabemos exatamente porque, dadas todas as “coisas boas” que os populistas fazem.

Essa reflexão vem a respeito dos ataques à governança da Petrobras. Nossos liberais suspiram quando ouvem o nome de Thatcher, mas acham natural que um dos pilares do capitalismo, o respeito aos acionistas de uma empresa, seja atacado por conveniência eleitoral. A diferença entre o estadista e o populista não poderia ser mais clara neste caso. O estadista sacrificaria o curto prazo pelo princípio. Já o populista sacrifica o principio pelos supostos ganhos de curto prazo.

A mensagem desse ataque à Petrobras é muito clara: mesmo em um governo dito “liberal”, a governança de uma empresa tem pouco valor. Não se poderá, portanto, criticar um governo de esquerda que adote a mesma agenda. Este é o efeito deletério dessa ação, justificar o mesmo modus operandi daqui para frente. Aliás, nesse aspecto, mais respeitável é um governo de esquerda, pois intervirá na Petrobras de acordo com a sua visão de mundo, de acordo com aquilo que avalia ser melhor no longo prazo. Pode estar errado, mas, pelo menos, é coerente.

E o pior de tudo é que, mesmo atacando a governança da empresa, o governo Bolsonaro está longe de ter o efeito eleitoral desejado. É mais provável que colha aquilo que Churchill, outro grande estadista, vaticinou sobre Chamberlain: entre a desonra e a guerra, escolheu a desonra, e terá a guerra. Parafraseando, entre atacar os minoritários e perder a eleição, escolheu atacar os minoritários, e perderá a eleição.

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