No Valor de hoje, pela primeira vez leio um relato completo do que ocorreu no jantar de Lula com a nata do empresariado brasileiro. Vem pela mão da competente jornalista Claudia Safatle, uma das melhores cronistas do desastre do governo Dilma.
De todo o artigo, o único pecadilho é o título, que não faz jus ao que rolou no tal jantar, a tomar a valor de face a narrativa. O BNDES ser usado como indutor do crescimento, além de não ser novidade no discurso de Lula, consegue ser o menor dos males de tudo o que Lula disse no jantar. Vejamos:
– Lula afirmou que ”o BC tem que conversar conosco sobre geração de empregos, não pode ser um BC bitolado em juros e inflação”. Claro, essa afirmação veio depois de criticar a independência formal do BC. O curioso é que, em seus dois mandatos, o então presidente do BC, Henrique Meirelles, teve liberdade para fazer política monetária. Há uma contradição entre o que foi o seu governo e o discurso atual, como se Lula tivesse rasgado uma fantasia. Fico imaginando o que seria essa “conversa” sobre geração de empregos.
– Lula repetiu que acha “um absurdo teto para gasto público”. Ao mesmo tempo, prometeu superávit primário em todos os anos de seu governo. Parece que Lula não tem noção do ajuste necessário para fazer superávit primário, ajuste este que faria o teto de gastos parecer um passeio no parque. Claro, a ideia é sair pelo aumento da arrecadação. O problema é quem vai pagar a conta. Taxar os “super-ricos” é inócuo, pois, além de insuficiente, a base tributável logo desaparece nos planejamentos tributários da vida. Vai sobrar para a classe média mesmo. E classe média, aqui, é todo mundo que ganha mais de 2 salários mínimos.
– Parece que Lula enviou “interlocutores” ao TCU para negociar um waiver sobre as contas públicas nos primeiros anos do seu governo. Imagine só o que ele tem em mente.
– Lula achou “um absurdo” a privatização da BR Distribuidora, mas não pretende reestatiza-la. Bem, se Lula acha importante ter uma empresa que distribui gasolina, imagine o resto. Também achou um absurdo, claro, a privatização da Eletrobrás. Mas, como disse Wilson Ferreira, o presidente da empresa, em outra matéria, o governo não tem dinheiro para reestatizar. Ou seja, é tudo resmungo. A questão só é levantada para deixar claro que não haverá privatizações no governo Lula. Lula prefere pegar o dinheiro dos contribuintes, não de investidores.
Neste ponto do artigo, Safatle diz que Lula começou a “delirar”. É o que afirmou um dos empresários entrevistados. Como se, até o momento, a coisa fosse toda “normal”. Vamos ao “delírio”. Segundo Lula:
– a quadrilha de Curitiba tinha interesse em quebrar as empresas brasileiras para beneficiar as americanas e espanholas.
– a Lava-Jato interrompeu a construção das refinarias pela Petrobras, o que nos daria autossuficiência em refino.
– o custo de extração do petróleo do pré-sal é menor que o custo da Arábia Saudita (na verdade, é 10 vezes maior).
– o mensalão sempre existiu, desde o início da República.
Bem, isso tudo que você leu acima não foi dito em um sindicato ou em uma reunião de artistas ou estudantes. Foram palavras ditas para empresários, um ambiente em que, supostamente, Lula deveria vestir um figurino mais ortodoxo. Como vimos, a coisa foi bem longe disso. Lula não faz questão alguma de esconder o que pretende fazer, nem para plateias menos simpáticas.
De tudo isso, entendo que Lula se dedicará, caso seja eleito, a duas coisas:
1) perseguir pessoalmente Sérgio Moro e Deltan Dalagnol até colocá-los na cadeia e
2) reeditar o “Brasil Grande” custe o custar. E custará, pode ter certeza.
Alguns no mercado estão iludidos pelos três primeiros anos do primeiro governo Lula, como se os 10 anos seguintes do governo PT não tivessem existido. Lula tem insistido em quebrar essa ilusão antes da eleição, mas está difícil.