Confesso que fiquei encasquetado com o termo “idosa” para qualificar a mulher de 67 anos presa pela quebradeira do último dia 8. Li no Estadão, fui checar no Globo e na Folha, e o termo está lá, nos três jornais.
O curioso é que, a mesma matéria do Estadão menciona a prisão de um homem de 66 anos, mas não o qualifica de “idoso”.
Os outros presos na operação da PF nem sequer tiveram suas idades mencionadas, de onde se conclui que a idade, nestes casos, não tem importância jornalística. E qual a importância jornalística da idade da mulher? E mais: qual o “catch” desejado ao qualificá-la de “idosa”?
Tudo o que vai escrito no jornal tem um propósito. Uma manchete “homem assalta loja e mata o dono” é diferente de “homem negro assalta loja e mata o dono”, que é diferente de “homem assalta loja e mata dono trans”. Tudo o que vai escrito pode ser absolutamente fiel aos fatos, mas o uso dessas palavras tem um interesse jornalístico, senão não estariam ali.
No caso em tela, é verdade que a mulher tem 67 anos. Já o termo “idosa” é vago, ainda que não fuja completamente à realidade. Hoje em dia, se uma pessoa morre com 67 anos de idade, provavelmente diremos que “morreu jovem”. “Idoso” é um termo muitas vezes considerado pejorativo, preferindo-se “maduro” ou “melhor idade”.
Alguém consegue imaginar, por exemplo, a seguinte manchete: “Idosa de 67 anos, Dilma Rousseff começa o seu segundo mandato”. Pois é, essa era a idade da presidenta em 2015. Uma manchete desse tipo seria considerada uma grosseria sem tamanho.
Mas voltemos à questão inicial: por que a unanimidade no uso do termo “idosa” para qualificar a mulher? Meu palpite: a ideia é transmitir uma mensagem jocosa, caricata. Para isso, nada melhor do que uma autêntica “tia do zap”, alguém que deveria estar fritando bolinhos de chuva para os netos, mas está fanatizada pelo zap, e saiu vandalizando tudo. Só faltava ser evangélica para o pacote ser perfeito: idosa evangélica quebra tudo em Brasília.
A explicação acima, no entanto, peca pela falta de lógica: por que, afinal, os jornais estariam se esforçando em tornar caricato o vandalismo de Brasília, se devemos, os brasileiros, acreditar que o País esteve à beira de um golpe de Estado? Quem vai realmente acreditar que a ameaça era séria, se à frente tínhamos uma ”idosa de 67 anos”? Ou bem a coisa era séria ou era caricata. As duas coisas ao mesmo tempo não dá.
Além de tudo, chamar a atenção para a condição de “idosa” da mulher poderia ser considerado uma manifestação de etarismo. No mundo woke em que nós vivemos, a mulher poderia sim acusar essa micro agressão. Mas, como sabemos, o preconceito tem dois lados, o do bem e o do mal. Esse é do bem.