O Estadão pública reportagem em que atribui às Big Techs o fracasso na tramitação do PL das fake news. Mais do que a atuação das Big Techs, tomamos conhecimento de como os autores da matéria entendem o funcionamento das redes e do processo democrático. Vejamos.
A reportagem tem início com a informação de que as Big Techs lideraram “uma operação de pressão e lobby” e “atuaram fortemente” para a derrubada do PL. Para provar o ponto, os repórteres fizeram um levantamento do número de vezes que representantes das empresas estiveram no Congresso. Além disso, conseguiram as aspas do presidente da Frente Parlamentar de Economia e Inclusão Digital, que afirmou que havia “recebido representantes de todas as plataformas”.
Além disso, as Big Techs teriam incentivado os cidadãos a fazerem pressão nas redes. A operação teria começado em 19/04, com o batismo do projeto de “PL da censura”, sugerindo que esse apodo tivesse sido criado nos gabinetes do Google e da Meta. Expressões como “os internautas foram instigados a mandar mensagens” e “as plataformas deram voz aos internautas para pressionar deputados” mostram como os repórteres quiseram transmitir a ideia de que, por trás de tudo, estavam sempre as poderosas Big Techs.
Este último ponto me faz lembrar as teorias da conspiração que envolvem George Soros por trás de toda a agenda da esquerda. No caso, os internautas não passariam de marionetes nas mãos das Big Techs. Na ânsia de provar o quão maléficas podem ser as plataformas (“empresas estrangeiras” foi um termo usado, para sugerir que houve interferência alienígena no processo democrático brasileiro), os repórteres não sentem vergonha de abraçar uma teoria da conspiração tosca. Não lhes passa pela cabeça que os “internautas” não precisam de muito para desconfiar de um PL abraçado com tanto ardor pelo PT.
Mas é em outra expressão que, me parece, está o grande engano da matéria. Os autores se referem à atuação das Big Techs como “interferência na discussão do Congresso”. Bem, até onde eu saiba, apesar de não regulamentada, a atuação de lobbies dentro do Congresso não é proibida. Se isto se configura como uma interferência indevida, então temos interferências indevidas desde quando Cabral aportou no Brasil. Isso existe nas democracias mais maduras, onde a atividade é regulamentada, e ninguém é acusado de “interferência”. Aliás, muito provavelmente os grandes jornais também contam com seus lobistas. Afinal, a remuneração da mídia que passou a fazer parte da PL das Fake News não está ali de graça.
Enfim, a matéria exerce o jus sperneandi, procurando os “culpados de sempre” para o fracasso, no Congresso, desse PL. É mais fácil do que admitir que o projeto não conseguiu convencer a maioria dos brasileiros e de seus representantes no Congresso. O processo democrático pode ser bastante doloroso.