Aguardando a primeira harmonização facial da nova regra fiscal

O novo “arcabouço fiscal” foi finalmente aprovado, o PT, agora, tem uma regra fiscal para chamar de sua. Quer dizer, o PT não, que nunca gostou de regra alguma, mas o ministro Fernando Haddad.

Aliás, o nome “arcabouço” vem substituir a palavra “teto”, bem em linha com o academicismo do ministro. Um nome rebuscado para a mesma regra que limita formalmente os gastos do governo. A diferença entre o arcabouço e o teto é de magnitude, não de natureza: o arcabouço representa um teto ajustável no tempo, de acordo com o crescimento de receitas. O resultado é que qualquer resultado fiscal desejado será atingido de maneira muito mais lenta com o arcabouço do que com o teto. Mas o resultado final será, em tese, o mesmo. Digo “em tese” porque, assim como o teto “não funcionou” e foi desrespeitado, a nova regra também “não funcionará” e será desrespeitada. Aqui não se trata de uma questão de “se”, mas de “quando”.

O curioso é que o único breve período da história republicana brasileira em que uma regra fiscal foi obedecida ocorreu entre os anos de 1999 e 2013. Nesse período, o país produziu sucessivos superávits primários, seguindo uma regra não escrita. Por isso Lula afirmou que não precisava de regra alguma para ser responsável fiscalmente. E ele está certo: se um governo é responsável, não são necessárias regras. E se não é, as regras são letra morta, como ficou demonstrado pelo cadáver insepulto do teto de gastos, que só agora foi dignamente enterrado pelo Congresso. O que Lula não disse é que, para produzir superávits primários durante os governos do PT, não precisava de teto e nem de arcabouço fiscal. Com o crescimento econômico chinês puxando de arrasto o Brasil, os gastos do governo podiam crescer todo ano acima de 100% do crescimento das receitas (na regra do teto não podia crescer nada, no arcabouço, existe um teto de 70% do crescimento das receitas), pois o crescimento do país dava conta de manter as contas em ordem. Como sabemos, Lula pensa que estamos ainda naquela época.

O finado teto de gastos, que tinha como premissa um ajuste profundo dos gastos do Estado brasileiro, a começar pela reforma da Previdência, possuía como objetivo a produção de superávits primários em um horizontes de cinco anos. Já o “novo arcabouço fiscal”, sem nenhuma premissa de ajuste e com regras bem menos rígidas, pretende começar a produzir superávits primários em dois anos. Só por aí já vemos em que mundo vive o ministro da Fazenda, que acha que pode levar o mercado com sua fala mansa. A coisa funciona enquanto as águas do cenário global estão calmas. Na primeira tempestade de verdade…

O novo “teto de gastos mas chama diferente” passará pelo seu primeiro teste agora, em que ficará claro que estará longe de alcançar a meta declarada pelo ministro de zerar o déficit fiscal no ano que vem. Vamos ver se isso será reconhecido ou se a nova regra já passará pela sua primeira cirurgia estética. Lembrando que a regra do teto de gastos morreu pelo excesso de harmonizações faciais a que foi submetida.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.