Prioridades

Gilberto Kassab, uma das raposas mais felpudas do cenário político brasileiro, corrobora o que escrevi aqui dias atrás: não há chance de uma “candidatura de proveta” de centro prosperar.

Mas não foi esse o ponto que me chamou a atenção na entrevista de hoje no Estadão. Destaquei as duas perguntas finais, sobre o desempenho do governo federal na pandemia.

“Se fosse presidente, estaria visitando a Fiocruz semanalmente. Essa condução não pode ser delegada. Se fosse presidente, teria transferido o meu gabinete para a Fiocruz.”

Não precisa ser uma raposa da política para entender que a vacinação é o “dia D” na guerra contra a pandemia. A névoa da ideologia cegou o presidente durante meses cruciais em relação a essa verdade tão comezinha.

Foram meses de negação, detonando o contrato da Pfizer, dizendo que eram os laboratórios que deveriam nos procurar, alimentando teorias conspiratórias a respeito dos supostos efeitos das vacinas, detonando a “vachina do Doria”, enfatizando a não obrigatoriedade da vacinação, colocando a aprovação da Anvisa como primeiro passo para o governo se movimentar. Enfim, uma longa lista de erros.

Alguns dirão que faltam vacinas no mundo e muitos países que fizeram tudo certo ainda assim não as tem. Isso é meia verdade, mas digamos que seja uma verdade inteira. Pouco importa. Política é imagem, política é narrativa. Quando Kassab diz que mudaria seu gabinete para a Fiocruz, é disso que se trata. É provável que este ato não fizesse o laboratório produzir uma dose sequer a mais de vacina. Mas o ponto não é esse. O objetivo seria mostrar que o governo está totalmente comprometido com a prioridade número 1 dos brasileiros no momento. Uma prioridade, segundo Kassab, mais importante do que uma casa ou um carro. No que ele tem razão.

“Essa condução não pode ser delegada”. Não consigo enfatizar suficientemente este ponto. Não adianta querer jogar o problema econômico no colo dos governadores. Memes, informações distorcidas e carreatas “fora Doria” servem para galvanizar os convertidos. Para a grande maioria dos brasileiros, presidente e governadores estão no mesmo saco dos efeitos perversos da pandemia.

Os governadores, pelo menos, perceberam antes que a vacina é a solução. Só o tempo dirá se será suficiente para reelegê-los. Quanto ao presidente, talvez fosse melhor mudar seu gabinete para a Fiocruz.

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