Não tive tempo de comentar essa coluna ontem, quando foi publicada no Valor Econômico. Mas merece comentário, pois foi um dos raros momentos de realismo nesse debate sobre as mudanças climáticas.
Humberto Saccomandi, editor de internacional do jornal, manda a real sobre o tema: o controle sobre a emissão de gases de efeito estufa significa “uma economia com produtos mais caros e menos consumo”. É isso.
O colunista não ataca agenda ambientalista, pelo contrário. Diz ser muito necessária. Mas coloca o problema no seu enquadramento correto, que vocês já devem ter lido por aqui nas vezes que abordei o tema: não se trata de um problema restrito a governos insensíveis e empresas malvadonas. Trata-se, antes de tudo, de um problema de demanda. Os indivíduos, eu, você e a Greta, queremos o máximo conforto pelo menor preço possível. A indústria simplesmente oferece o que nós desejamos.
Dentro do capitalismo, a forma de induzir comportamentos é através da precificação, afirma corretamente o colunista. Por isso, combustíveis fósseis deveriam ser mais caros, de forma a induzir a diminuição de seu consumo. Claro que combustível mais caro significa produtos mais caros. E mais caros para todos, ricos e pobres. Humberto cita o caso das usinas nucleares: por apresentarem um grave problema de descarte de lixo nuclear, várias normas foram editadas, tornando a produção de energia nuclear em usinas novas economicamente inviável para a iniciativa privada, o que afastou investidores. Sim, o lucro é ainda um driver importante do sistema capitalista.
Para resolver essa charada, o colunista lança mão do conceito de “economia doughnut”, ou “rosquinha”, proposta pela economista britânica Kate Raworth. Segundo esse conceito, a humanidade precisa reaprender a viver entre os limites de um mínimo de conforto e um máximo de consumo ambientalmente sustentável. Obviamente, é mais fácil falar do que fazer. Procure no discurso de Biden algum trecho dizendo que os americanos precisam se acostumar com menos conforto. Boa sorte.
E este conceito leva a outro nó, também apontado pelo colunista: o mundo é um só, mas obviamente as populações dos países pobres vivem muito abaixo do limiar mínimo de conforto aceitável. As populações dos países ricos, portanto, deveriam não só diminuir o seu nível de conforto por questões ambientais, mas, adicionalmente, para também abrir espaço de consumo para as populações dos países pobres. Como diz o colunista, “um processo de difícil aceitação”.
Aqui termina a coluna de Humberto Saccomandi e começa a minha conclusão. Paul Kruger afirma em sua coluna do New York Times, traduzida hoje no Estadão, que o custo de produção da energia solar caiu 89% desde 2009 e o da energia eólica, 70% no mesmo período. Impressionante, não é mesmo? Mas, no capitalismo, tudo é uma questão de preço. Vocês podem ter certeza de que, no dia em que as energias solar, eólica e todas as outras fontes renováveis de energia forem mais baratas que a energia derivada de combustível fóssil, não teremos mais Cúpulas do Clima. A indústria se converterá espontaneamente para essas fontes, sem necessidade de políticas governamentais. Afinal, lucro é ainda um driver importante do capitalismo.