Esse imbróglio do ginásio do Ibirapuera me lembra o filme Aquarius. No filme, Sonia Braga faz o papel de uma viúva que se recusa a vender o seu apartamento para uma incorporadora, que quer usar o terreno para construir um prédio muito mais alto no lugar. É uma ode à resistência à especulação imobiliária.
O economista Samuel Pessoa escreveu à época um artigo antológico na Folha a respeito desse filme. Entre outras considerações, Pessoa lembra que a atitude da protagonista impediu a geração de muitos empregos na construção civil, além do desenvolvimento de atividades econômicas que gerariam mais impostos, que, no final da linha, poderiam ser usados para mitigar a situação de pessoas mais pobres. Tudo isso, em nome de uma resistência romântica ao “grande capitalismo”.
O Complexo do Ibirapuera está se deteriorando porque o poder público não tem recursos suficientes para mantê-lo. Ou melhor, tem, desde que retire de outras áreas da administração. A reportagem está cheia de aspas de ex-atletas e arquitetos, todos muito preocupados com o, digamos, ataque à nossa “memória esportiva”. Claro, os entrevistados provavelmente não dependem de um emprego na construção civil ou não usam escolas ou hospitais públicos. O projeto do governo do estado é construir uma arena esportiva nova e oferecer a área para a construção de um shopping center e um complexo de escritórios em uma das regiões mais valorizadas da cidade. A resistência vem de quem não depende dos empregos gerados pela iniciativa. Aqueles que dependem nem sabem que continuarão desempregados para que a nossa “memória esportiva” seja preservada.
A má distribuição de renda no Brasil é uma obra realizada a muitas mãos.