Estou terminando de ler A Fome Vermelha, de Anne Applebaum, que descreve em detalhes o Holodomor, a Grande Fome na Ucrânia no início da década de 30 do século passado, em que estima-se que tenham morrido 4 milhões de pessoas.
O Holodomor foi o resultado da política de coletivização das fazendas nas repúblicas soviéticas, antecedida pela desapropriação das fazendas dos “kulaks”, a burguesia do campo. Com o tempo, kulak virou sinônimo de qualquer um que se opusesse às políticas de Stálin. Ou melhor, Stálin colocava a culpa de tudo o que dava de errado nos kulaks, que encarnavam o “inimigo do povo”.
Aliás, na minha opinião, essa é a parte mais chocante de toda essa história: por mais que a realidade insistisse em contradizê-lo, Stálin interpretava tudo como uma grande luta política, onde sabotadores contrarrevolucionários tinham por objetivo minar o “governo do povo”. Essa ótica levava-o a negar a realidade ou atribuí-la aos “inimigos do povo”. Nesse sentido, relatos de camponeses morrendo de fome só poderiam ter sido “forjados” com objetivos políticos obscuros. Essa interpretação da realidade fazia com que Stálin apertasse ainda mais o torniquete contra os “kulaks”, que, a certa altura, eram todos os que insistiam em mostrar a realidade.
A mente autoritária enxerga o mundo de uma maneira peculiar, onde todos os que não rendem submissão absoluta representam um perigo para a autoridade. Todos se tornam inimigos, em um visão paranoica da realidade. A realidade, inclusive, se torna refém de uma eterna luta política, em que, o que importa, é a defesa da autoridade.
Entendedores entenderão.