Nome aos bois

O senado argentino legalizou o aborto até as 14 semanas de gestação.

A deputada Sâmia Bomfim, como toda boa feminista, comemorou o resultado.

Mas a deputada errou em seu outro post, de dois dias antes, comemorando a chegada do filho. Vamos ajudá-la.

“13 semanas do feto Bomfim Braga”.

Aliás, deveria ser só “13 semanas do feto”, porque nome normalmente é dado para gente.

Efeito Orloff

Valor econômico de hoje. Leio em uma página sobre a “desconfiança” em relação ao governo argentino.

Eu pergunto: esperavam o que?

Na página seguinte, o editorial do Valor fala sobre o encaminhamento frustrante das PECs que deveriam equacionar o problema fiscal brasileiro.

Uma sensação de “efeito Orloff” toma conta da minha mente. Para os mais novos, o “efeito Orloff” se refere a uma propaganda da vodca de mesma marca, em que um sujeito, tendo vindo do futuro, conversava com ele mesmo, dizendo: “eu sou você amanhã”. A mensagem era que Orloff não causava ressaca no dia seguinte.

Será a Argentina o Brasil amanhã? Durante muito tempo foi assim. Mas, a partir do primeiro mandato do governo Lula, que espertamente manteve as políticas ortodoxas de seu antecessor, o Brasil se descolou de seu vizinho do sul. Nestor Kirshner, do outro lado do rio Iguaçu, optou por políticas heterodoxas, que levaram a Argentina ao ponto em que está hoje.

O paralelo, ou a sensação de efeito Orloff, no entanto, não está na comparação com os doidivanas dos Kishners. Este governo está cada vez mais se parecendo com o governo Macri.

Maurício Macri foi eleito na esteira do rotundo fracasso das políticas heterodoxas dos Kirhsners. Foi eleito para colocar ordem na casa. O que fez o presidente argentino? Caminhou na direção certa, mas a passo de cágado. Claro, sempre se pode dizer que caminhou na velocidade que as condições políticas lhe permitiram. Mas isso não serviu de desculpa. O fato é que fez muito pouco, muito tarde. Não ter criado as condições políticas para fazer o certo também pode ser debitado de sua conta.

É nesse sentido que o editorial do Valor lembrou-me o efeito Orloff, na medida em que escancara a falta de urgência com que o problema fiscal é tratado pelo governo e pelo Congresso. Como diz o economista para mercados emergentes da Goldman Sachs, Alberto Ramos, a respeito do governo argentino, “o mercado continua bastante desapontado com a falta de um plano de médio e longo prazo. Ou seja, muita conversa e pouco trabalho”. Poderia estar falando do governo brasileiro.

Congelamento high tech

Os congelamentos de preços no final da década de 80 não deram certo porque os consumidores não podiam contar com modernas tecnologias.

Agora não mais! O governo da Argentina está disponibilizando um app para que os fiscais do Fernandez possam efetivamente acompanhar o cumprimento do congelamento. Agora sim, não tem como dar errado!

O “mercado” é um ente curioso

O “mercado” é um ente curioso. Reagiu bem ao “pacote” de medidas do novo governo da Argentina, pela simples razão de não ter sido um pacote que aumenta irresponsavelmente gastos públicos. Se o “pacote” vai resolver os problemas da Argentina, isso é outro detalhe.

Depois de sua posse, Alberto Fernandez afirmou que não vai mais “sacrificar” os que já estão sacrificados, e que a solução para os problemas econômicos da Argentina será a mais indolor possível. Este pacote é um exemplo disso. Só tem um detalhe: não vai resolver nada. A impressão que fica é que não sabem o que fazer. Exemplo disso é o prazo de 180 dias para estudar como não reajustar as tarifas energia. Estão tentando resolver a quadratura do círculo, e nem 180 anos seriam suficientes para encontrar uma solução.

Obviamente, a paciência do povo vai terminar muito antes disso, e o governo populista de Alberto Fernandez será levado a tomar medidas de acordo com sua natureza. Quando isso ocorrer, o “mercado” será tomado de “surpresa”. O “mercado” é um ente curioso.

Inspiração

O vigia noturno aqui da empresa disse que vai se inspirar no novo presidente da Argentina: só vai pagar sua dívida com o Bradesco quando tiver um aumento de salário.

As coisas sempre podem piorar

A página Inflacionistas descobriu essa relíquia, uma matéria com a visita de Joseph Stiglitz à Venezuela nos idos de 2007. Destaquei o trecho acima, em que Stiglitz defende que o BC não pode ter “autonomia excessiva”. A Venezuela implementou os ensinamentos de Stiglitz, e hoje, como sabemos, tem a maior inflação do mundo.

Argentinos, as coisas sempre podem piorar.

O jovem economista heterodoxo

Para a nossa total não surpresa, Alberto Fernandez nomeou um “jovem ministro heterodoxo” para a Economia, discípulo de Joseph Stiglitz, um dos dois prêmios Nobel da área (o outro é o Krugman) que defende que imprimir dinheiro faz as pessoas ficarem mais ricas.

Uma das primeiras ideias do “jovem economista” é a óbvia “reestruturação” da dívida da Argentina, nome mais bonito para calote. Essa é uma medida que qualquer governo, de qualquer coloração, tomaria, dada a completa impossibilidade do país continuar pagando uma dívida impagável. O problema é o que vem depois.

Como bom discípulo de um desenvolvimentista raiz, o “jovem economista” deverá aplicar a cartilha já conhecida: gastos governamentais para “estimular” o crescimento econômico. Daí, o crescimento geraria as receitas para o governo pagar as suas dívidas. É a velha ilusão do moto-perpétuo fiscal, que só funciona, segundo os próprios proponentes da Moderna Teoria Monetária, se o governo fosse “eficiente” nos seus gastos. Aí é que mora o problema, como todos sabemos.

O “jovem economista”, no entanto, vai enfrentar um pequeno problema: convencer o FMI a continuar a financiar déficits primários. Segundo dados do FMI, o déficit primário da Argentina chegou a 4,8% do PIB em 2016! Só para comparar, o déficit primário brasileiro atingiu o pico de 2,5% do PIB no mesmo ano, e já foi um Deus-nos-acuda. Macri, com sua abordagem “vamos devagar com o andor”, reduziu o déficit para 4,2% em 2017 e, com a piora da crise e o acordo com o FMI, teve que acelerar o ajuste, fechando 2018 com um déficit de 2,2%. Para este ano, a previsão é de um déficit de 0,6% (menos negativo que o brasileiro).

Um país que gera déficits não tem capacidade de pagar suas dívidas. A matemática, neste ponto, independe de ideologia. O que os heterodoxos propõem é que se deixe a geração de superávits mais para frente, quando a economia voltar a crescer. Muito lógica essa abordagem anti-cíclica, desde que se acreditasse que governos populistas vão realmente economizar quando a economia estiver crescendo. Aliás, qual o nível de crescimento que seria o “suficiente” para começar a gerar superávits primários? São só pequenos “detalhes”.

Stiglitz sempre foi crítico aos termos desse acordo com o FMI. Para ele, essa abordagem ortodoxa não levaria a Argentina a lugar nenhum. Bem, agora teremos a oportunidade de ver o “jovem economista heterodoxo” aplicando as ideias de Stiglitz na vida real. Na minha bola de cristal, caso o FMI continue dando suporte, vejo um surto de crescimento econômico de curto prazo, seguido de nova crise da dívida, com empobrecimento geral da população. Esse é o verdadeiro moto perpétuo dos heterodoxos.

A cartilha de Peron

Três professores da FEA-USP cometem hoje o primeiro de três artigos sobre a ascensão e queda da Argentina.

Para os luminares, o peronismo (1943-1955) foi uma exceção à regra da decadência. Segundo os doutores, Peron reverteu parte da distância das economias mais desenvolvidas através de uma cartilha populista e desenvolvimentista, favorecendo as camadas mais baixas da população. O incrível na “análise” é que, apesar de reconhecer todos os erros cometidos pelo peronismo, atribuem a queda posterior da economia argentina ao “pensamento ortodoxo”. O maior mal que fez Peron teria sido reforçar o pensamento ortodoxo! É mais ou menos como o sujeito que trai a mulher e depois achar que o maior erro não foi a traição em si, mas sim a sua mulher procurar outro.

Mal posso esperar pelos próximos dois artigos.