O que deu errado no Chile

A Globo News debate os destinos da economia brasileira, agora que estamos nas mãos dos desalmados “Chicago Boys”.

Além das observações de praxe sobre as reformas impostas por Pinochet, a ditadura e blá, blá, blá, os bravos jornalistas estavam genuinamente preocupados com os efeitos negativos das reformas empreendidas pelos Chicago Boys chilenos. Parece que algumas coisas deram errado por lá.

Fui checar.

A inflação média brasileira desde 1996 foi de 6,80% ao ano, enquanto a chilena foi de 3,67% ao ano. Ou seja, se tivéssemos a inflação do Chile, os preços teriam subido praticamente metade do que subiram no Brasil nos últimos 22 anos (deixei de fora os anos da hiperinflação pra coisa não ficar mais feia para o nosso lado).

-Ah, mas inflação é uma tara dos Chicago Boys. Eles sacrificam tudo ao deus da estabilidade. Aposto que o crescimento econômico foi anêmico nesse período.

Vamos lá. O crescimento econômico médio do Brasil desde 1980 foi de 2,32% ao ano. Do Chile foi de 4,31% ao ano. Se o Brasil tivesse crescido tanto quanto o Chile nos últimos 38 anos, a renda per capita brasileira seria mais do que o dobro da atual. 108% maior, para ser mais exato.

– Ah, mas PIB não quer dizer nada. O que importa é o bem estar das pessoas.

Ok. Também o desemprego foi menor no Chile. Desde 1991 (primeiro dado disponível para o Brasil), o desemprego médio chileno foi de 7,8%, contra 10,9% de desemprego médio no Brasil. Hoje, o desemprego no Chile está em 6,9%, contra 11,8% no Brasil. Se tivéssemos hoje o desemprego do Chile, cerca de 5 milhões de brasileiros a mais estariam trabalhando.

– Ok. Mas e a desigualdade? Qual a preocupação dos Chicago Boys com a distribuição de renda? Aposto que nenhuma!

Segundo dados do Banco Mundial, o índice de Gini do Chile caiu de 54,8 em 1987 para 47,7 em 2015. Já o índice do Brasil caiu de 59,7 para 51,3 no mesmo período (quanto menor, melhor a distribuição de renda). Ou seja, além de mostrar uma distribuição de renda melhor do que a brasileira, o índice de Gini do Chile recuou só um pouco menos do que a o brasileiro nesse período de 28 anos. Parece ok para um país que adota um modelo econômico neoliberal selvagem.

Resumindo: o Chile, administrado segundo a escola de Chicago, teve metade da inflação, o dobro do crescimento, menos desemprego e melhor distribuição de renda do que o Brasil, administrado segundo a melhor escola unicampiana de preocupação social. E ainda ficamos discutindo “o que deu errado” no modelo chileno.

PS.: antes que alguém levante a questão, dá sim para usar o Chile como exemplo. Apesar de ser um país menor e com maior dependência de exportações, há muitos países ainda menores que não dão certo. E há países bem maiores que têm uma performance bem superior à brasileira por seguirem os cânones econômicos ortodoxos. Vide EUA e Alemanha, por exemplo.