Tente vender yuans na calle Florida

Sonho: a Argentina não depende mais do dólar, agora pode usar o yuan para pagar a sua dívida.

Realidade: a Argentina vai lançar mão de um acordo de troca de moeda (swap) com a China para preservar suas reservas em dólares.

Muita festa está se fazendo entre os tuiteiros da esquerda com o fato de que o FMI está aceitando yuans para receber uma parcela do pagamento da dívida da Argentina com a instituição. Seria mais uma evidência de que o dólar está perdendo seu protagonismo e o yuan está em irreversível ascensão.

O FMI receber yuans é fácil. Difícil mesmo é um argentino receber yuans. Quando cambistas na calle Florida estiverem preferindo comprar yuans ao invés de dólares, aí poderemos dizer que a moeda chinesa ganhou curso internacional.

Negócio da China

O Estadão nos traz a tradução de uma reportagem da AP, sobre as dívidas de países pobres com a China. Não é a primeira matéria que leio sobre o assunto. O foco é no garrote chinês, que se utiliza de métodos escusos, como empresas de fachada, para esconder uma parte da dívida. Mas gostaria de chamar a atenção para o outro lado da questão, os países que tomaram a decisão de se endividarem.

Invariavelmente, as dívidas foram tomadas para a construção de infraestrutura. A reportagem cita portos, aeroportos, ferrovias. É o típico investimento que os economistas desenvolvimentistas amam de paixão, pois, em tese, formam a base para o crescimento futuro da economia. No entanto, por algum estranho motivo, o crescimento não veio, e sobraram os juros e a amortização da dívida. Com isso, alguns países tiveram, inclusive, que parar de pagar salários dos funcionários públicos e aposentadorias.

O que aconteceu? A reportagem nos dá algumas pistas. Por exemplo, um aeroporto construído em Sri Lanka, na cidade do presidente, está às moscas, com a sua pista de pousa tomada por elefantes. Este é um caso prosaico, mas longe de ser único. Representa a malversação de recursos em obras de infraestrutura sem base em lógica econômica, apenas para atender necessidades políticas. Alô refinaria Abreu e Lima, aquele abraço!

Esses países foram sequestrados por elites extrativistas, que revestem suas ambições pessoais com a capa de “investimentos para o desenvolvimento econômico”. O resultado são empreendimentos sem a mínima lógica econômica, com o objetivo de faturarem politicamente a construção de “grandes obras” e se locupletarem através de esquemas de corrupção. A matéria não chega a citar esse último aspecto, que certamente está presente.

Investimentos estatais em infraestrutura são sempre ruins? De maneira alguma. Está aí Itaipu como contraexemplo. Mas, para cada Itaipu, há dez Transamazônicas que sugam recursos sem a correspondente contribuição para o crescimento econômico. O resultado é estagnação econômica, um roteiro que conhecemos bem.

Hoje, o Brasil sofre sob o peso de sua dívida. Não há recursos para nada, a não ser para pagar aposentadorias, funcionários públicos e juros da dívida. No entanto, ao contrário dos países reféns da China, o Brasil é refém dos seus próprios “rentistas”, o que pode passar a falsa impressão de que está em uma situação melhor. Isso é uma ilusão. Credor é credor, qualquer que seja a sua cor. O fato de dever em sua própria moeda não alivia em nada, a não ser pela alternativa de poder dar calote via inflação.

A quadratura do círculo

Notinhas políticas de jornal com fontes indeterminadas são a forma de dar vestes institucionais à posição de um grupo específico. Nem vou perder meu tempo criticando o jornal que se presta a esse papel ridículo. A questão de fundo, no caso dessa notinha específica, é o seu objetivo: sugerir que certos atores, agindo dentro das leis do país, não têm o direito de se manifestarem.

Para “a Câmara” (leia-se os deputados do PT e seus satélites), e “ministros do STF” (já sabemos quem é), as Big Techs não deveriam ter voz no tal do Conselhão do Lula. Esse Conselhão, pelo seu tamanho e modus operandi, é de uma inutilidade atroz. Mas há que se conceder que Lula foi muito democrático ao escolher os nomes, contemplando tudo e quase todos (senti falta da Anitta) dentro do seu espectro ideológico. As Big Techs estão lá, provavelmente por serem atores sociais relevantes. Como diria Don Corleone, é melhor manter seus inimigos perto.

O que esses deputados e ministro do STF querem é cancelar as Big Techs do mundo dos vivos. Que coloquem suas cabeças na guilhotina, à espera da lâmina se não cumprirem sua missão de substituírem a polícia na detecção e combate ao crime, mas se mantenham caladas.

Tudo isso estaria sendo evitado se adotássemos a solução chinesa: bloqueio de toda e qualquer rede social ou serviço de mensageira no país, a não ser aqueles desenvolvidos por empresários locais, e que terceirizam ao Estado a tarefa de monitorar as redes. O Brasil (e, vale dizer, o mundo ocidental), está em busca de resolver a quadratura do círculo: como manter redes sociais em mãos privadas e, ao mesmo tempo, garantir o nível de surveillance chinês.

Obrigar que entidades privadas realizem aquilo que deveria ser de responsabilidade do Estado inviabiliza o seu modelo de negócios, e é isso o que as Big Techs estão tentando dizer. Ao impedi-las de dizer isso, o Estado brasileiro está limitando o debate democrático, no melhor estilo chinês.

A faca no pescoço

Trecho da coluna de Lourival Sant’Anna sobre a visita de Fernández a Lula (lembre-se, não foi da Argentina ao Brasil) narra as dificuldades de se chegar a uma “equação” que permita financiar os argentinos sem correr o risco Argentina. Trata-se de encontrar a quadratura do círculo. Nem a solução de sempre, a China, sempre disposta a ajudar generosamente os países vítimas do imperialismo, parece disponível no momento. Com a China, só na base do escambo.

A propósito, reportagem da Bloomberg nessa semana aborda justamente esse ponto. Em uma conferência internacional, a presidente do FMI, a búlgara Kristalina Georgieva, dá a entender que a China estaria mudando a sua postura em relação aos países que não podem pagar os seus empréstimos. Segundo Georgieva, os chineses estariam mais dispostos a “negociar”, o que pressupõe que os chineses não estão tendo a mesma boa vontade do FMI. Países como a Zâmbia, em que 75% da dívida é com os chineses, estão com a faca chinesa no pescoço.

O FMI foi criado, ente outras coisas, para ajudar na estabilização financeira de países que passam por dificuldades. A ideia é emprestar dinheiro e ajudar na implementação de medidas saneadoras. Se um país particular fizesse isso (por exemplo, EUA ou China), poderia ser acusado de ingerência sobre os assuntos internos de outro país, além das resistências políticas domésticas, em países democráticos, a iniciativas desse tipo. O FMI, representando o conjunto dos países, tem essa missão e legitimidade. Além disso, cabe destacar, o FMI não age sem um convite formal do país a ser ajudado.

A China, por razões geopolíticas, emprestou dinheiro como se não houvesse amanhã para uma série de países, principalmente na África, e agora está descobrindo que as elites desses países pegaram o dinheiro e se empirulitaram, como diria o Didi. A China não tem vocação para FMI e, portanto, não tem ânimo de negociação. O que Georgieva está dizendo, em sua linguagem diplomática, é que é bem mais fácil negociar com o FMI do que com a China. Talvez Lula pudesse bater um papo com seu novo amigo, Xi Jinping, sobre facas no pescoço.

Escolhas

O problema de fundo nessa história da taxação dos sites chineses é a enorme, brutal, diferença de carga tributária entre as empresas chinesas e brasileiras.

Brasil e China têm renda per capita semelhante. Ambos são considerados países de renda média. A carga tributária chinesa, no entanto, é muito menor que a brasileira. Segundo a OCDE, a carga tributária do Brasil é de quase 32% do PIB, enquanto a da China é de apenas 20% do PIB. Como se nivela essa diferença? Claro, com imposto sobre importação.

Em um lance de relações públicas, a Shein anunciou a “criação” de até 100 mil empregos, por meio de parcerias no setor têxtil. Ou seja, a Shein abriria mão de sua vantagem competitiva para produzir, no Brasil, as mesmas mercadorias que produz na China e vende aqui dentro sem imposto de importação. Acredite quem quiser.

Uma das poucas vantagens de ser mais velho é ter memória. Em 2011, início do governo Dilma, esse número mágico de “100 mil empregos” foi anunciado pela Foxconn, fabricante taiwanesa de iPhones e iPads.

Na época, o ministro da Ciência e Tecnologia, Aloísio Mercadante, estava radiante com a promessa, assim como Haddad hoje. Adivinha quantos empregos foram criados? Pois é. Eu conto essa história neste post.

Somos um país que fez uma escolha: alta carga tributária para bancar uma generosa previdência social (a previdência representa quase metade de todos os gastos do governo). Para um país jovem e de renda média, essa é a fórmula da baixa competitividade global. O resultado é que os brasileiros vivem reféns de um sistema que precisa taxar o consumo de maneira desproporcional, tornando nossos produtos os mais caros do mundo. Quando surge um site chinês que vende e entrega sem o imposto, o brasileiro avança como se fosse um oásis no deserto. Não deixa de ser injusto: afinal, esse mesmo brasileiro usufruirá da previdência generosa, sem pagar por ela.

A Shein vai criar 100 mil empregos assim como a Foxconn criou: só na promessa. Não tem lógica econômica em produzir no Brasil, enquanto o chinês puder exportar sem imposto.

Não se salva nada

Está se formando um consenso de que a parte geopolítica da viagem de Lula à China foi um desastre, ao confrontar, sem nenhuma necessidade, os Estados Unidos na questão do dólar, e o mundo ocidental democrático, na questão da Ucrânia. Até Eliane Cantanhêde, passadora de pano contumaz, chegou a essa conclusão.

Mas, pelo menos, a viagem serviu para aprofundar os laços comerciais, abrindo novas portas aos nossos empresários. Será?

O jornalista Lourival Sant’Anna levanta outro aspecto interessante das relações Brasil-China: a nossa dependência do gigante asiático. Em 2016, último ano do período PT no governo, o Brasil exportou US$ 35 bilhões para a China, ou 19,5% das nossas exportações. Seis anos depois, passados os governos Temer e Bolsonaro, o Brasil exportou, em 2022, US$ 89,4 bilhões, ou 26,8% das nossas exportações. A pergunta é: quanto mais nos interessa aumentar essa dependência? Do ponto de vista estratégico, não seria melhor Lula estar se dedicando a diversificar o destino de nossas exportações, ao invés de aprofundar ainda mais a nossa dependência da China?

Sob esse aspecto, a viagem de Lula também parece um equívoco. Ou seja, não se salva nada.

A janjificação do governo Lula 3

Lula visitou a China em 2004 e 2009. Dilma fez o mesmo em 2011. Essas foram as três visitas oficiais ao gigante asiático em 13 anos de governos petistas. Se passearmos um pouco pelos jornais da época, notaremos que o foco era principalmente comercial. O único aspecto geopolítico referia-se à pretensão do Brasil de ocupar uma vaga permanente em um Conselho de Segurança da ONU reformulado. Essa agenda aparece nas visitas de 2009 e 2011. A China apoiava a pretensão brasileira, ao menos de boca.

Nesta visita de 2023, a agenda comercial também aparece, mas é ofuscada por um alinhamento à China em sua guerra fria contra a ordem imperialista americana. Ops, estadunidense. Os estadunidenses querem o dólar e não querem a paz. O Brasil e a China, assim como a Rússia, não querem o dólar e querem a paz. Então, nada mais natural do que alinhar-se à China e à Rússia, nessa busca pelo substituto do dólar e pela paz.

Há quem diga tratar-se de pragmatismo. Afinal, a China é nosso maior parceiro comercial, e nada mais pragmático do que amaciar o ego de Xi Jinping (na verdade pensei em outra ação, impublicável). Mas talvez, só talvez, fosse possível fazer isso sem necessariamente confrontar uzamericanu. O discurso de Lula tem mais semelhança com o de um presidente de grêmio estudantil do que o de um chefe de Estado. Afinal, se a China é um parceiraço, os americanos e os europeus não deixam de sê-lo também. Difícil alcançar o que o Brasil ganha perdendo a confiança do Ocidente.

De qualquer forma, Lula 3 continua sendo absolutamente coerente. Seu discurso sofreu uma “janjificação”, processo em que a radicalização juvenil se sobrepõe ao pragmatismo que marcou seus dois primeiros mandatos. Talvez seja melhor assim. Pelo menos, ninguém pode dizer que foi enganado.

Explicando o mundo

Tal qual uma criança que começa a descobrir o mundo ao seu redor, nosso presidente tem muitas perguntas. Por que a taxa de juros precisa ser tão alta? Por que o preço da gasolina não pode seguir os custos de produção local? Por que não podemos ter um banco de desenvolvimento que empreste sem condicionalidades?

A última pergunta que tem atormentado o presidente, a ponto de deitar-se com ela toda noite, trata da dominância do dólar no comércio global. Afinal, por que o comércio entre os países precisa passar pelo dólar?

A função do adulto é introduzir a criança no mundo a que ela foi convidada sem pedir. No mundo da criança, tudo é possível. Trata-se de um mundo mágico, em que as coisas acontecem “como deveriam ser”. O adulto, ao responder às questões da criança, descreve o mundo “como ele é”. O problema de Lula é que os que o cercam, incluindo os economistas, costumam ter o mesmo pensamento mágico.

No caso, o adulto explicaria que o dólar é emitido pelo maior país do planeta, com um banco central independente, e em que o sistema político, com seus pesos e contrapesos, evita a dominância de um homem ou de um partido. A China é grande sim, a segunda maior economia do planeta. Mas o fluxo de capitais e o câmbio são estritamente controlados por uma autoridade monetária (o Banco Popular da China) completamente subordinada a um ditador. Você compraria um carro usado de Xi Jinping?

Faça um teste. Peça a um amigo seu que esteja na China que lhe traga alguns renminbis na mala. Faça o mesmo com um amigo que esteja nos EUA, e lhe peça para trazer alguns dólares. Tente comprar alguma coisa aqui no Brasil com os renminbis e com os dólares. Qual será a tarefa mais fácil? Pois é. As pessoas guardam dólares em casa, não renminbis, sem que ninguém as obrigue a isso.

O Banco Central do Brasil investe as reservas internacionais em várias moedas. Cerca de 80% está em dólares e apenas 5% em renminbis, apesar de a China ser, de longe, nosso maior parceiro comercial. Vendemos US$ 90 bilhões anualmente para a China, mas somente US$ 15 bilhões das reservas estão na moeda chinesa. O BC raciocina com o mesmo cuidado que as pessoas que guardam o dinheiro em dólar, não em renminbi. Se Lula souber disso, arrumará mais um motivo para encrencar com o Roberto Campos, além da taxa Selic.

Há alguns anos, estive na China a trabalho. Nas várias reuniões de que participei, não falávamos em português ou mandarim. A língua usada era o inglês. Nem todos podem contar com um tradutor oficial, como Lula e Xi Jinping têm à disposição. Então, lançamos mão da língua franca global para nos comunicar. Talvez Lula pudesse pensar nisso também antes de dormir.

Tchutchuca com os grandes sonegadores, tigrão com os pequenos

Influencers governamentais saíram em socorro do tiro no pé que foi fechar a brecha de sonegação do imposto de importação para pequenos valores entre pessoas físicas.

Haddad já tinha sido claro: sonegadores não passarão! Tem os grandes sonegadores (aquelas 500 empresas “super-lucrativas” que o ministro citou, além dos bilionários que não pagam imposto no Brasil) e tem os pequenos sonegadores, aqueles que importam da China em quantias abaixo de 50 dólares. O governo começou pelos pequenos. Mais fácil.

A mensagem governamental que os influencers estão tentando passar é que Shein e Shoppee são os grandes sonegadores que serão taxados. No entanto, trata-se de imposto de importação. E quem está importando é a pessoa física remediada que se aproveita de uma brecha da legislação. Repito: o importador é a pessoa física, não o site chinês.

De qualquer forma, trata-se de uma questão quase semântica. O fato, com o qual até Felipe Neto concorda, é que “você pode ficar puto porque os produtos que eram baratos vão ficar mais caros”. Tanto faz quem está pagando o imposto ou onde o imposto está sendo pago. O fato é que os produtos vão ficar mais caros, ponto. Quem é beneficiado? O governo e o comércio local. Quem é prejudicado? Os sites chineses e o consumidor de baixa renda. Pode contar a história que quiser, o resultado final é esse aí. Não tem combate a feiqueniús que dê jeito nisso.

O destino das nações

Vou colar, a seguir, um trecho do livro “Por que as nações fracassam”, de Daron Acemoglu. Volto em seguida.

“Antes de 1928, a maioria dos russos vivia no campo. A tecnologia usada pelos camponeses era primitiva, e havia poucos incentivos para aumentar a produtividade. […] Sendo assim, havia um imenso potencial econômico não aproveitado para a realocação dessa força de trabalho da agricultura para a indústria.

A industrialização stalinista fez um aproveitamento brutal desse potencial. Por decreto, Stálin fez com que esses recursos muito mal utilizados fossem realocados para a indústria, onde podiam ser empregados de maneira mais produtiva, ainda que a indústria em si fosse organizada de maneira pouco eficiente em relação ao que podia ser realizado. Na verdade, entre 1928 e 1960, a renda nacional cresceu 6% ao ano, provavelmente o surto de crescimento mais rápido na história até então. Esse crescimento econômico acelerado não foi propiciado por mudanças tecnológicas, e sim pela realocação de força de trabalho e pelo acúmulo de capital por meio da criação de novas ferramentas e fábricas.

O crescimento foi tão rápido que enganou gerações de ocidentais, não apenas Lincoln Steffens. Enganou a CIA, nos Estados Unidos. Enganou os próprios líderes soviéticos, como Nikita Kruschev, que numa célebre frase, num discurso para diplomatas ocidentais em 1956, se gabou de que “nós vamos enterrar vocês [o Ocidente]”. Ainda em 1977, um livro didático acadêmico importante, escrito por um economista inglês, afirmava que as economias de estilo soviético eram superiores às capitalistas em termos de crescimento econômico, oferecendo pleno emprego e estabilidade de preços e até mesmo produzindo pessoas com motivações altruístas. O pobre e velho capitalismo ocidental só era melhor quando se tratava de oferecer liberdade política. Na verdade, o livro didático mais utilizado para ensinar economia nas universidades, escrito por Paul Samuelson, vencedor do Nobel, trazia múltiplas previsões sobre o domínio econômico iminente da União Soviética. Na edição de 1961, Samuelson previu que a renda nacional soviética poderia já ultrapassar a dos Estados Unidos em 1984, mas que havia grandes chances de isso ocorrer até no máximo 1997. Na edição de 1980, houve pouca mudança na análise, embora as duas datas tenham sido adiadas para 2002 e 2012.”

Lincoln Steffens, citado por Acemoglu, era um jornalista crítico ao capitalismo, que participou de uma missão diplomática norte-americana à recém criada União Soviética. De volta de seu encontro com Lênin, criou a frase que o marcaria: “eu vi o futuro, e ele funciona”.

Muitos, hoje, apontam a China como modelo de crescimento econômico, sério candidato a potência hegemônica. Não consigo deixar de lembrar do trecho acima. Ainda mais quando leio notícias como essa de hoje, em que o governo chinês vai usar “inteligência artificial” para melhor planejar a economia. Claro, os dados virão compulsoriamente de seus cidadãos. Algoritmos tomarão o lugar de milhões de seres humanos nas decisões econômicas. Qual o risco de dar certo?

Quando Deng Xiao Ping iniciou a revolução capitalista chinesa, no final da década de 70, cunhou a célebre frase: “não me importa a cor do gato, desde que cace o rato”. Com isso, deu certa liberdade de empreendimento, o que, ao lado da migração de milhões do campo para as indústrias, alavancou a economia chinesa. Há já algum tempo, Xi Jiping vem dando meia-volta nessa política, ao centralizar cada vez mais o processo decisório. Pode levar alguns anos, ou algumas décadas ainda, mas a China terá o mesmo destino da União Soviética. Quem viver, verá.