Qual a diferença entre o PL das fake news e a PEC da reforma tributária? Ambos tiveram amplo apoio do governo, inclusive com liberação de verbas, e o trator de Arthur Lira funcionando a todo vapor. No entanto, o PL das fake news, que precisava de maioria simples para a sua aprovação (257 votos) foi engavetado, ao passo que a PEC da RT foi a votação e recebeu nada menos do que 382 votos. Qual a diferença?
A diferença é o teor da lei que estava sendo discutida. Por incrível que possa parecer, o Congresso é o lugar onde se aprova leis, e o seu conteúdo importa. No caso da PL das fake news, havia uma carga ideológica grande, envolvia valores como liberdade de expressão, e o seu conteúdo era ruim mesmo, inviabilizando o funcionamento normal das redes sociais no Brasil, como tive oportunidade de comentar aqui. Já no caso da PEC da RT, apesar de todo o esforço bolsonarista de lhe atribuir um caráter ideológico (seria a ante-sala do comunismo, nada menos que isso), trata-se de um texto técnico e político, que envolve a forma de tributar no Brasil. Assim, o texto, com todas as demasiadas exceções previstas, foi levado a votação e conseguiu convencer 382 deputados.
Por mais que se tenha uma visão do Congresso como um grande balcão de negócios (e é mesmo), ainda assim a política tem o seu papel. Há coisas inegociáveis, como demonstrou a PL das fake news. E há coisas que, com as devidas adaptações, (e haja adaptações no texto dessa PEC), é possível negociar. Só fica à margem de negociações quem quer se manter puro em seu reino de virtude. Mas esse reino não pertence a este mundo, onde as coisas são decididas, como demonstraram os 382 votos de ontem. Isso é política.