Putin lança o programa Mais Soldados

O governo cubano está indignado. Parece que Moscou está pescando em águas cubanas para recrutar soldados para a guerra. O que a reportagem chama de “tráfico”, na verdade, não passa de uma relação comercial: Putin mitiga o seu problema de recrutamento de cidadãos russos, enquanto os cubanos têm a oportunidade de ganhar uns trocos e, com alguma sorte, voltar para casa após o fim do contrato. Uma relação ganha-ganha. A não ser para o governo cubano.

No programa Mais Médicos do governo Dilma, o “tráfico” de cubanos era oficializado, e o governo cubano ficava com a parte do leão dos salários de seus cidadãos. Esse sim era um arranjo que interessava aos dirigentes da ilha de Fidel. Agora, Putin atravessou o intermediário, e está tratando diretamente com a mão de obra. Putin gasta menos e os cubanos recebem mais. Todo mundo sai satisfeito, menos o governo cubano, que denuncia o “tráfico de pessoas” e afirma não ter nada a ver com a guerra.

Pelo jeito, Putin terá que estabelecer o programa Mais Soldados e pagar mais caro, se quiser continuar contando com a prestimosa ajuda dos recrutas cubanos.

A inutilidade das sanções econômicas

O Estadão traz hoje artigo da ex-chanceler da Costa Rica entre 2014 e 2019, condenando as “eleições” na Nicarágua, os recorrentes ataques do regime de Daniel Ortega aos direitos humanos e à democracia e clamando por sanções internacionais.

Bem, em primeiro lugar, já vimos que sanções econômicas são absolutamente ineficazes na remoção de ditadoras de plantão, principalmente quando podem contar com amigos desinteressados, como China e Rússia. Venezuela e Cuba estão aí para provar a tese.

Mas gostaria de chamar a atenção para um segundo ponto. Em junho último, a Assembleia Geral da ONU levou à votação, pela 29a vez, uma declaração de condenação do embargo econômico norte-americano à Cuba. Como vem acontecendo nas últimas votações, apenas EUA e Israel votaram contra. Brasil, ao lado de Colômbia e Ucrânia, se absteve. 184 países votaram a favor, incluindo a Costa Rica da ex-chanceler autora do artigo.

Ou seja, temos o seguinte roteiro: uma ditadura se instala, os EUA patrocinam sanções e, depois de alguns anos, tendo o ditador se mantido firme em sua posição, os EUA são demonizados. É questão de tempo para que a Venezuela leve à votação da ONU uma resolução de condenação das sanções que está sofrendo.

Realmente não entendo porque os americanos ainda perdem tempo tentando derrubar ditadores latino-americanos por meio de sanções econômicas. Além de não funcionarem, são o álibi perfeito para explicar a miséria da população. Além, claro, de dar pasto para China e Rússia.

Entendo que levantar o embargo a Cuba, hoje, envolve mais do que questões econômicas. Trata-se de uma simbologia importante e, portanto, não é fácil voltar atrás. Mas nos casos de Venezuela e Nicarágua, ainda dá tempo de fazer ouvidos moucos a quem exige sanções, como a ex-chanceler da Costa Rica. Pois, daqui a alguns anos, estes mesmos que pedem sanções estarão condenando os EUA pelo mesmo motivo.

Auditoria da dívida: comece pelo BNDES

Ontem, durante a sabatina (melhor seria dizer briga de rua) de Paulo Guedes na CCJ, um deputado do PDT mencionou uma medida que, vira e mexe, aparece como a solução dos problemas fiscais do Brasil: a “auditoria da dívida”.

Bem, não precisa ir longe: o BNDES chegou a representar cerca de 1/6 da dívida pública, no auge da insanidade petista. Parte desse dinheiro já voltou aos cofres públicos, mas outra parte é de difícil recuperação.

Sempre que você ouvir alguém que simpatizava com o governo anterior defender uma “auditoria da dívida”, convide o sujeito a tentar cobrar a dívida de Cuba e Venezuela. Já é um bom começo.

O Ibope de Lula em Cuba

2 milhões de assinaturas em Cuba!

Isso dá mais ou menos 17% da população. Seria como se tivéssemos um abaixo-assinado de 36 milhões de assinaturas aqui no Brasil. Um portento!

Mas, pensando bem, foi pouco. 83% da população não assinou, apesar dos métodos, digamos, dissuasórios, do governo cubano.

O Ibope de Lula já foi melhor.

A revolução da classe média

No dia 07/04/1959, a Newsweek publicou matéria sobre Fidel Castro, às vésperas de sua visita aos EUA. Um resumo da matéria foi publicado na 1a página do Estadão do dia seguinte.

A revista apresentava Fidel como um sujeito “honrado”, de “boas intenções”, que havia liderado uma “revolução da classe média”. No entanto, os comunistas, liderados por Che Guevara, já estavam tomando conta da situação.

O resto é História.

A tragédia já existe, nada vai mudar

Cuba vai retirar os seus médicos do Brasil. Segundo os “especialistas” em saúde pública, isto é uma tragédia de grandes proporções que se abaterá sobre os mais pobres, que não tinham acesso a médicos e passaram a ter depois do programa patrocinado pelo PT.

Será isso mesmo? Vejamos.

O último dado no site do Programa Mais Médicos, de 2015, indicava a participação de 18.240 médicos no programa. Destes, cerca de 8.500 são cubanos, o que totaliza cerca de 45% do total do programa.

Por outro lado, no final de 2017, o Brasil contava com 451.777 médicos, segundo censo patrocinado pelo Conselho Federal de Medicina. Os médicos cubanos, portanto, representam 1,9% do total de médicos do país.

Colocando proporcionalmente em termos populacionais, que é normalmente como se mede a cobertura de médicos em um país: o Brasil conta com 2,18 médicos por 1.000 habitantes. Com os cubanos, este número vai para 2,22. Um acréscimo de apenas 0,04. A média dos países da OCDE é de 3,4. Como vimos, os médicos cubanos não fazem nem cócegas nas necessidades do país.

– Ah, mas o problema não é a quantidade, é a distribuição dos médicos pelo país.

Sem dúvida! Segundo o mesmo censo do CFM, Brasília tem 4,35 médicos por mil habitantes (mesmo índice da Suíça), enquanto o Maranhão conta com apenas 0,87 médicos por mil habitantes, um índice africano. Então, os médicos cubanos vieram para suprir esta deficiência de distribuição.

Mas, cuidado com as estatísticas! Segundo vários reportagens por aí, os médicos cubanos estariam beneficiando uma população de 65 milhões de brasileiros, supostamente aqueles com menor cobertura. Isto significa 0,13 médicos/mil habitantes adicionais. Considerando que esses 65 milhões tenham uma cobertura equivalente à do Maranhão, levantada pelo CFM, isto significaria um aumento de quase 15% no número de médicos para este público. Só que a cobertura continuaria (como continua) sendo de país africano.

Em resumo, a saída dos cubanos do Brasil não representa uma tragédia humanitária. A tragédia continua existindo, com ou sem os médicos cubanos. Claro que as reportagens vão entrevistar aquela comunidade que dependia daquele médico cubano, tão bom, tão humano. Sim, há histórias comoventes. Mas para cada história tocante, há outra dez ou vinte de comunidades que continuaram sem ver a cor de um avental branco. A tragédia da saúde pública brasileira não se resolve com golpes publicitários, como foi o desembarque dos médicos cubanos usando justamente aventais brancos. O Brasil é um país continental, e não serão 8 mil médicos que resolverão o problema.

A questão de fundo e que sequer foi arranhada pelo Mais Médicos é porque a distribuição dos médicos é tão desigual no Brasil. Se conseguíssemos que 10% dos médicos brasileiros que hoje estão em regiões mais favorecidas se deslocassem para regiões menos favorecidas, isto significaria um contingente equivalente a 5 vezes os médicos cubanos. Por que os médicos cubanos topam ir para regiões carentes e os brasileiros não?

A resposta é simples: os cubanos são funcionários do governo de Cuba e obedecem às ordens de seu chefe. Com um detalhe: não há outro emprego possível. Ou trabalha para o governo ou… bem, melhor nem pensar. Quando o Ministério do Trabalho autua empresas por condições de trabalho similares à escravidão, normalmente o que ocorre é que a empresa arma uma espécie de armadilha para o funcionário, obrigando-o a trabalhar na empresa para pagar dívidas. Não tenho dúvidas de que o Ministério do Trabalho, sob os mesmíssimos critérios, autuaria o governo de Cuba por trabalho similar à escravidão com relação aos seus médicos.

Então, somente com “contratos de trabalho” desta natureza foi possível preencher, mal e mal, as vagas do Mais Médicos. Há algo de muito errado nisso. Espanta-me que “especialistas” encarem a situação dos médicos cubanos como “normal” e até “essencial” para a saúde pública brasileira. Se as mesmas condições de trabalho fossem oferecidas aos médicos brasileiros (25% da bolsa recebida retida pelo governo, proibição de atuar em qualquer outra atividade, família presa em uma ilha) um clamor popular se levantaria. Mas como se trata da gloriosa Revolução Cubana, fica tudo por isso mesmo.

Outro ponto importante, e que merece reflexão, é a formação desses médicos. O programa Mais Médicos não exige a revalidação do diploma obtido por médico no exterior. Ou seja, o sujeito pode atuar como médico no território brasileiro sem ter sido reconhecido oficialmente como médico pelas autoridades competentes locais.

Ok, talvez essa seja uma saída para a falta de médicos: relaxar as exigências na formação. Por exemplo, formandos que não passassem no exame do Cremesp ou dos outros conselhos regionais poderiam trabalhar apenas em regiões com cobertura de até 1 médico por mil habitantes. Médicos sem exame de validação por médico sem exame de validação, prefiro dar chance aos estudantes brasileiros do que aos cubanos. Eu particularmente acho que esta seria uma alternativa interessante para prestar atenção básica a populações carentes, que não precisam de grandes especialistas.

– Ah, mas é muito arriscado deixar a saúde das pessoas nas mãos de médicos com formação fraca.

Pois é. Os médicos cubanos não são obrigados a prestar o Revalida. Quem garante a qualidade? Fidel Castro? Há uma lenda urbana que reza que os médicos cubanos estão entre os melhores do mundo. Se é assim, por que não podem prestar o Revalida?

O Mais Médicos, como tudo o que foi feito no governo do PT, foi mais uma jogada de marketing do que uma solução estrutural para o problema da saúde pública brasileira. E, de quebra, ajudou as finanças de um governo amigo. O fim dessa vergonha vai causar transtornos localizados, mas não será nem de longe a tragédia que dizem, como espero ter mostrado através das estatísticas. E, quem sabe, permitirá ao novo governo pensar em formas mais estáveis e estruturais de distribuir os médicos pelo país.