O governador teve uma “excelente” ideia: vamos mover o fluxo para junto de um equipamento de assistência a drogados. Assim, quem sabe, o pessoal voluntariamente se apresente para tratamento. A ideia deve partir do pressuposto de que os drogados não buscam tratamento porque não têm dinheiro para o ônibus…
Minha mãe mora no Bom Retiro, não muito próximo mas também não muito distante desse local. Com que tranquilidade eu deixaria minha mãe, que tem quase 80 anos, morando sozinha nessa região? Eu tive uma outra ideia: que tal montar um centro de reabilitação ali no Morumbi, próximo ao Palácio dos Bandeirantes, e levar o fluxo para lá? Equipamentos de apoio a drogados são como presídios e usinas nucleares: todo mundo acha muito importante existirem, desde que não seja na sua vizinhança.
A reportagem traz a infalível entrevista com um especialista, no caso, uma antropóloga.
Claro que houve rasgados elogios ao programa do então prefeito Haddad, o “de braços abertos”, que teria sido desmontado por almas insensíveis como as de João Doria e Bruno Covas. Não lhe ocorre que, se o programa estivesse realmente funcionando, não precisaria haver ação alguma. A lógica da especialista é estranha, pois supõe que Doria e seus sucessores agiram para criar um problema para si próprios. E o mais hilário é a antropóloga pedir desculpas por usar a palavra “civilizado” para referir-se a uma cracolândia sob controle, um termo que pode ser considerado higienista. É como se tivesse usado o termo entre aspas, para dizer aquilo que todo mundo gostaria de dizer, mas que ficaria muito mal na boca de alguém tão sensível às causas sociais.
O fluxo é formado por seres humanos, que merecem ser tratados com toda a dignidade. O problema, claro, está no local escolhido para serem tratados com toda a dignidade. É muito fácil falar quando não se tem o problema na porta de casa.