Muito preocupado

De minha parte, estou muito mais preocupado com um país governado de dentro de um presídio.

Nesta hora, a “paranoia” parece estar mais do lado de quem teme um golpe militar.

Aliás, se tem uma coisa que a história mostra, é que os golpes servem para tirar opositores do poder. Nesse sentido, a eleição do PT tornaria a tese de um golpe militar mais verossímil.

O único que aplicou um “auto-golpe” foi Getúlio Vargas, em 1937. Sim, Getúlio, o queridinho do Lula e das esquerdas.

A verdadeira ameaça para a democracia

Esta é a reportagem de capa do Estadão hoje. Não precisa nem de pesquisa, todo mundo sabe disso: Bolsonaro avançou na antiga seara anti-petista do PSDB. A questão é: por que?

A entrevista com Pérsio Árida, assessor econômico de Alckmin, na mesma edição, dá a dica: perguntado qual seria o candidato que representaria “o maior risco ao país”, Arida aponta Bolsonaro como um “risco à democracia”.

Note que a questão não era sobre “risco à democracia”, mas “risco ao país”. Arida poderia ter citado Bolsonaro dentro de uma tática eleitoral, na medida em que é de onde poderiam vir os eventuais votos para colocar Alckmin no 2o turno. A justificativa (dado que era “risco ao país”) teria que ser algo do tipo “Bolsonaro não conseguirá aprovar as reformas necessárias e entraremos em uma espiral a la Venezuela”.

Mas não. Arida trocou a pergunta, e cravou Bolsonaro como o maior “risco à democracia”. Para tanto, desenterrou os gritos de tortura provocados pelo general Ustra, há quase 50 anos, quando o mundo e o país eram completamente outros. Com direito, inclusive, a um “reductio ad Hitlerorum”, lembrando do Holocausto.

O jornalista deu uma colher de chá, pois poderia ter terminado a entrevista ali. Aproveitando a nova pergunta criada pelo entrevistado, questionou se Bolsonaro era, então, “o maior risco”. Acho que nem o jornalista acreditou que o PT iria ficar de fora daquela resposta.

Arida, então, desfia tudo o que Lula e o PT vêm fazendo com as instituições brasileiras nos últimos anos. Não 50 atrás, mas nos últimos 16 anos, e continua fazendo até hoje. E concede que o PT e Lula também são um risco.

Como PSDB da gema, o reflexo de Arida foi responder que um fanfarrão que cita Ustra na votação do impeachment é um elemento mais pernicioso para as instituições democráticas do que um partido que, dia e noite, chama todo o Congresso de golpista, faz pouco caso da Justiça, orquestrou a maior pilhagem da história republicana e que quer controlar a mídia.

Depois, os “estrategistas” do PSDB se perguntam porque Alckmin virou um nanico.

As duas grandes muralhas

Eugênio Bucci comete hoje um artigo no Estadão que explica muito do que vimos no Roda Viva esta semana.

Ele começa o artigo afirmando que “Dois limites comprimem a democracia brasileira. Duas muralhas móveis, cada uma de um lado, vão se aproximando uma da outra, como nestas máquinas de compactar detritos. Combinadas, as duas podem transformar o projeto democrático que se desenhou para o Brasil a partir da Constituinte federal de 1988 num pacote de lixo concentrado.”

Obviamente uma dessas “muralhas móveis” é Bolsonaro. Aliás, Bolsonaro seria apenas um sintoma de algo mais grave: “a cultura antipolítica e antidemocrática mobilizada por essa candidatura”. Como se essa “cultura antipolítica e antidemocrática” tivesse surgido de Marte, não fosse fruto do estupro coletivo da democracia comandado pelo presidiário de Curitiba.

E por que Bolsonaro seria “anti-democrático”? Simples: porque não condena a ditadura militar. A ditadura seria a referência, para o Brasil, do que não é democrático. Funcionaria como o nazismo para a Alemanha: os alemães se auto-referem ao nazismo para construir sua própria identidade pós-guerra. É curioso como a referência é a ditadura militar e não, por exemplo, a ditadura de Getúlio Vargas, ou o apoio a ditaduras como a cubana ou a venezuelana. Mas segue o jogo.

Com esse mindset, fica então claro porque a insistência, no Roda Viva, de perguntas sobre a ditadura militar. Esses jornalistas se veem como um bastião da luta pela democracia, e querem desconstruir Bolsonaro no lugar onde eles acham estar a batalha de vida ou morte. Nós, pobre mortais que precisamos pagar os boletos vencidos, ficamos sem entender muito tudo aquilo. Obrigado, Eugênio, por nos explicar.

Fui lendo o artigo, ansioso à espera da segunda “muralha móvel que vai transformar nossa democracia em lixo”. Achei que fosse falar de Lula e do PT. Afinal, é sob o comando de Lula que o PT vem desrespeitando as instituições democráticas brasileiras. São os petistas que chamam um Congresso eleito pelo povo e que segue a lei de “golpista”. É Lula e seus asseclas que desafiam diariamente o judiciário brasileiro. É o PT que quer patrocinar o “controle social da mídia”, eufemismo para censura. Foi Lula que comandou o Mensalão e o Petrolão, dois movimentos que desvirtuaram a democracia representativa como nunca antes na história desse país. Fui ingênuo. Não há uma linha sobre Lula ou o PT. A segunda “muralha móvel” seria a “privatização do espaço público promovida pelos monopólios globais da era digital”. No caso, o Facebook. E os adeptos da primeira muralha estariam se aproveitando da segunda muralha para fazer o serviço de transformar a democracia em lixo. Ele não disse, mas certamente viu com bons olhos a retirada de páginas de apoio a Bolsonaro da rede.

Bucci se mostra o que todo “democrata gramsciano” é: um autoritário. Mário Covas dizia que o povo sempre vota certo, é preciso que os políticos entendam a mensagem que o povo passa nas eleições. Essa é a essência do espírito democrático. Quem disse que o tal “projeto democrático que se desenhou para o Brasil a partir da Constituinte federal de 1988” é o único possível? Visão autoritária, que despreza o voto e sabe o que é melhor para o povo do que o próprio povo.

Bolsonaro vai disputar as eleições dentro do jogo democrático. Se ganhar, terá que governar dentro dos parâmetros democráticos. Se mijar fora do penico (como, aliás, o PT tentou), as instituições democráticas o expelirão.

Ver Bolsonaro como a única ameaça à democracia no Brasil diz muito sobre o tipo de democracia que Bucci e seus coleguinhas querem para o País.

Manja tudo

O Estadão traz uma entrevista com Steven Levitsky, cientista político de Harvard e autor do livro “Como as democracias morrem”.

Segundo Levitsky:

– O impeachment foi legal mas foi contrário à um certo “espírito da lei”, ao substituir um governo de centro-esquerda por outro completamente diferente, o que teria fraudado as eleições de 2014.

– Excluir qualquer candidato das eleições “é algo perigoso a se fazer”.

Adivinha qual o candidato, na visão deste senhor, que representaria o “perigo” para a democracia?

Segundo Levitsky, as democracias liberais não são simplesmente majoritárias. Por exemplo: mesmo que 99% da população vote pelo fim da liberdade de expressão, em uma democracia liberal o presidente não poderia fazer isso.

Será que Levitsky sabe que esse partido “de centro-esquerda” que foi apeado do poder defende a “regulação da mídia”?

Será que Levitsky sabe que esse partido “de centro-esquerda” usou os instrumentos da democracia para solapar a própria democracia, ao aparelhar os órgãos do Estado e comprar votos no Congresso?

Será que Levitsky está sugerindo que, em uma democracia liberal, um sujeito possa ser candidato à presidência mesmo preso? Ou que ele está preso somente por ser candidato, e em uma democracia liberal ele não estaria preso?

Levitsky compara Bolsonaro a Chávez, e coloca o PT ao lado das “legendas democráticas” que deveriam se unir para evitar a eleição do inominável. Manja tudo esse Levitsky.

A perseverança no caminho democrático

O que vai abaixo é um trecho do editorial do Valor de hoje.

O editorialista nem se deu conta de quão próxima está a sua posição da de Bolsonaro. O candidato do PSL investe em uma ligação direta com o povo por conta do “apodrecimento do sistema partidário”. Não por outro motivo, Bolsonaro não conseguiu se coligar a ninguém (não que não tivesse tentado). Tanto um quanto o outro menosprezam o sistema de partidos. Ou, antes, gostariam de ver partidos “limpinhos”, “puros”, que é a semente do pensamento autoritário.

O sistema de partidos é um dos pilares (ao lado da separação de poderes e de uma imprensa livre) de qualquer regime democrático. Fazer coligações com vistas a implementar programas de governo é a regra do jogo em qualquer sistema com mais de dois partidos. Basta ver as idas e vindas de Angela Merckel na Alemanha para montar um governo.

“Ah, mas aqui os deputados só querem se locupletar”. Não é verdade. Basta ver a ginástica retórica que Ciro Gomes está sendo obrigado a fazer para tentar se coligar ao Centrão. Se fossem só cargos, ele poderia continuar com seu discurso incendiário muito ao gosto das esquerdas e mesmo assim se coligar com o DEM. Não vai acontecer.

É muito fácil ficar sentado na poltrona e apontar o dedo para os políticos de um “sistema partidário apodrecido”. Esquecemos que esses mesmos políticos não sugiram de geração expontânea nem vieram de Marte. Estão lá porque os brasileiros, nós, os colocamos lá. E se, por um milagre da natureza, houvesse 100% de renovação do Congresso, os novos deputados se mostrariam tão ruins como os que foram substituídos. E pode mudar sistema, de proporcional para distrital ou mesmo sorteio: a coisa não vai mudar, porque de massa podre não sai bolo bom. O Congresso reflete o Brasil e os brasileiros, com suas ideias, defeitos e contradições.

Lula foi o último a apostar na “ligação direta com o povo”. Como tinha que lidar com o Congresso, comprou-o. Esta sensação de que “nenhum político presta” é a consequência lógica de um sistema autoritário, onde a “ligação direta com o povo” substitui os partidos. Lula e Bolsonaro têm mais em comum do que seus seguidores estão dispostos a admitir. A diferença é que Bolsonaro ainda não chegou ao poder, está ainda na fase dos “300 picaretas no Congresso”.

Mas não sou pessimista. Se perseverarmos no caminho da democracia, não cedendo à tentação da “ligação direta com o povo” (que é o caminho de todo autoritarismo), criaremos com o tempo uma cultura política no país, através dos canais regulamentares, dentre os quais se incluem os partidos. Sim, estes mesmos que estão aí, com esses políticos que estão aí. Não há atalhos.

O “erro” do PT

A “confissão” da estudante de filô não poderia ser mais clara: o PT não precisaria agir da forma que agiu se não tentasse se perpetuar no poder em um sistema capitalista, gerando “contradições”. Por “sistema capitalista” entenda-se judiciário não aparelhado e imprensa livre.

Para aqueles que, como FHC, acham Haddad um bom moço, um “quadro moderado” dentro do PT, não custa lembrar que esse partido não joga o jogo democrático. Uma vez no poder, toma conta das instituições com o objetivo de transformá-las em servidoras de seu projeto. Para quem não sabe qual é esse projeto, basta dar uma olhada na Venezuela.

Teste psicotécnico

História de bolso do Brasil pós-guerra e um teste psicotécnico:

Juscelino construiu Brasília e estourou as contas públicas. A inflação resultante desestabilizou o país e deu lugar a uma ruptura institucional, o golpe de 64.

Os militares construíram a Transamazônica e Itaipú, entre outas obras gigantescas e estouraram as contas públicas. A inflação resultante desestabilizou o país e deu lugar a uma ruptura institucional, a redemocratização.

A Constituição de 1988 criou um sem número de direitos sem a correspondente fonte de recursos, o que estourou as contas públicas. Como a inflação não pode mais ser usada para acertar as contas, começou a faltar dinheiro mesmo.

Agora, o teste psicotécnico: o que acontecerá em seguida?

Financiando a democracia

Vivemos em uma democracia representativa. Sendo assim, é através do voto que se mudam as coisas. Se perdemos a fé neste instrumento, então só nos resta mudar o regime para algo em que o voto não conta para nada. Os países que deram certo não foram por este caminho. Pelo contrário, procuraram aprimorar o voto como instrumento democrático. Isso não acontece da noite para o dia, leva gerações.

Uma forma de legitimar o voto é o financiamento de campanha. Não gostamos que nossos impostos sirvam como funding para campanha eleitoral, mas também não queremos meter a mão no bolso para financiar a campanha de ninguém. Ora, se queremos gente boa e honesta no Executivo e no Legislativo, precisamos dar os meios para que se elejam!

Esta plataforma permite a doação para a campanha de alguns candidatos. Dá uma olhada, tem vários candidatos que podem merecer a sua ajuda. Dá para doar a partir de R$ 10, e o pouco com Deus é muito rsrsrs.

Claro, sempre pode acontecer de, no futuro, aquele candidato para o qual doamos seja pego em alguma falcatrua. É o risco. O que não dá é esperar que a democracia funcione como uma mágica, sem que nos esforcemos para isso.

Nenhuma novidade

Nenhuma novidade. O PT não reconheceu nenhum presidente do período democrático, pediu o impeachment de todos.

Por coerência deveriam abrir mão de participar das eleições. Veremos.