Democracia e distribuição de renda

Uma pesquisa coordenada por um grupo de Think Tanks sem vinculação partidária procurou medir a saúde da democracia no mundo. A pesquisa foi realizada em países da União Europeia e na América do Norte, e incluiu o Brasil.

Chamou-me a atenção os números de desconfiança, no Brasil, nas instituições que sustentam a democracia representativa. A polícia é a instituição que mais se aproxima da média de aprovação que recebe nos países desenvolvidos, mas mesmo assim fica abaixo da média. A confiança nas outras instituições é praticamente inexistente.

Instituições são a formalização do poder. Na selva, vale a lei do mais forte. Na civilização, as instituições nivelam o campo de disputa pelo poder. Não se trata mais de um poder discricionário, mas de regras estáveis governando a relação entre os homens. A democracia representativa só funciona com instituições fortes e confiáveis.

A julgar pelo resultado dessa pesquisa, o brasileiro está pronto para uma aventura autoritária. Como sabemos, todos concordam que a democracia é um bom sistema de governo, mas o melhor mesmo é uma ditadura comandada por um ditador que comungue das minhas ideias. E este é o problema do caminho autoritário: as minhas ideias são muito particulares, ainda que eu esteja convencido de que são as melhores possíveis. Em uma ditadura, as instituições se resumem ao ditador. É a lei da selva.

Na matéria que apresenta os resultados da pesquisa, o coordenador afirma que a única forma de “salvar” a democracia é distribuir melhor os resultados do crescimento econômico. Seria a única maneira de evitar que um ditador populista propusesse com sucesso fazer o mesmo. Ele cita a China como exemplo de sucesso econômico sem democracia, o que demonstraria a possibilidade. Em que pese que o gigante asiático não se destaca especialmente pela distribuição de renda.

Quer dizer, a má distribuição da renda estaria por traz da falta de credibilidade das instituições democráticas. É uma tese. Vou propor outra: a falta de instituições fortes está por traz da má distribuição de renda. A primeira tese implica uma solução econômica: distribuir renda, seja por que meio for (inclusive autoritário, que foi o caminho cubano) levaria a um aumento da democracia. A segunda tese implica uma solução política: o fortalecimento das instituições (ou seja, o fortalecimento da democracia) levaria a uma melhor distribuição de renda. A primeira solução é tecnocrática, envolve desde o reforço de programas como o bolsa-família, até grandes reformas, como a tributária. A segunda solução envolve as elites (todas elas) abrindo mão de seu poder discricionário para estabelecer meias-entradas para si próprias e respeitando as instituições, a começar da lei que beneficia a todos e não somente às próprias elites.

Solução econômica ou solução política para a má distribuição de renda? Eu tenho a minha tese de qual é a única que funciona.

Falando sério sobre distribuição de renda

Eliane Catanhêde dá a sua dose de contribuição para o debate sobre o IDH. Destaquei sua opinião porque representa a média do que se ouve falar por aí: o Brasil é um país rico, mas injusto. O problema é distribuir essa riqueza mais igualmente.

Que a distribuição de renda no Brasil é uma vergonha não se discute. Ninguém em sã consciência é contra redistribuir riquezas. O problema é a premissa anterior, a de que somos um país rico. Ouço essa afirmação muitas vezes: com tantas riquezas minerais, florestas, produção agrícola, mar, etc, o Brasil é muito rico. Só [preencha com o que preferir aqui] impede o país de deslanchar. A desigualdade é a última moda em “causas para o nosso subdesenvolvimento”.

Não, o Brasil não é um país rico. Nem no século XVI se media riqueza pelos recursos naturais, quanto mais hoje, em uma sociedade tecnológica. Somos um país remediado, que faz questão de redistribuir migalhas enquanto castas públicas e privadas sugam o orçamento público sob os mais diversos argumentos de “direitos adquiridos”. Ninguém quer ceder um milésimo de sua posição para melhorar as condições do todo.

Como jornalista, Eliane não deve ser CLT. Portanto, paga menos imposto do que minha empregada doméstica. O que ela não paga de imposto é compensado com impostos sobre bens de consumo, que minha empregada compra. Injustiça na ida e na volta. Vamos começar a falar a sério sobre redistribuição de renda?

Distribuição de renda, uma agenda liberal

Ninguém ousará duvidar das credenciais ortodoxas de Arminio Fraga. No entanto, para quem tem acompanhado suas últimas manifestações, causa estranheza sua ênfase no “combate à desigualdade” como condição sine qua non para a retomada do crescimento econômico. Parece mais o Piketti falando.

Arminio é um cara muito esperto. Ele já percebeu que esse negócio de “igualdade” é uma pauta que veio para ficar. Ao invés de lutar contra isso, ele arrumou um jeito de usá-la a favor de uma agenda para destravar a economia.

Note que ele não usa o bolsa-família como exemplo de política redistributiva, apesar de não ser necessariamente contra. Ele sabe que isso não passa de esmola que não muda a estrutura de um país. O que ele defende então?

Arminio defende a redução das transferências constitucionais para os mais ricos. Ele traz um dado espantoso: 25% da renda dos 20% mais ricos é fruto de transferências do governo. Isso inclui aposentadorias, salários de funcionários públicos, isenções fiscais das mais diversas naturezas. Ou seja, tudo aquilo que a esquerda defende a ferro e fogo.

Laura Carvalho, a musa dos desenvolvimentistas, estava no mesmo evento, e parece que ficou meio sem ter o que dizer, tendo a sua agenda espertamente roubada por Arminio para defender o contrário de tudo o que ela defende, principalmente no que se refere à reforma do Estado.

Precisamos aprender com Arminio Fraga.

Evo e as políticas “distributivistas”

Artigo de opinião traduzido do Washington Post.

O articulista, Ishaan Tharoor, compara a Bolívia com Argentina e Equador, e afirma que, ao contrário desses dois últimos, que adotaram políticas liberais e se estreparam, a Bolívia adotou políticas “distributivas” e, por isso, diminuiu a pobreza com sucesso.

Agora, eu pergunto: como um cara desses tem espaço em um jornal como o Washington Post? O sujeito se põe a escrever sobre a América do Sul e repete coisas sem nexo, que encaixam na narrativa pré-estabelecida de seu gabinete a 10 mil km de distância. Só faltou dizer que o Brasil de Lula teve sucesso com suas “políticas distributivas”, para depois sair dos trilhos com a política liberal de Temer/Bolsonaro. Certamente ele esqueceu esse exemplo, senão estaria no artigo.

O articulista convenientemente ignora que o Chile também diminuiu a pobreza extrema de 68% para 13% entre 1990 e 2016 (dados de reportagem do Estadão) adotando políticas liberais.

O articulista também convenientemente esquece que Argentina e Equador foram comandados por Cristina Kirchner e Rafael Corrêa, dois mandatários populistas bolivarianos distributivistas, até tão recentemente quanto 2016. Atribuir os problemas atuais às políticas liberais dos governos que os sucederam é, para dizer o mínimo, desinformação. E, para dizer o máximo, má fé.

A Bolívia se destaca dos outros governos bolivarianos porque, assim como Lula, Evo foi muito pragmático: manteve as bases fiscais do seu governo intactas, o que permitiu controlar a inflação e fazer políticas distributivas para inglês, quer dizer, para boliviano ver. Não à toa, Evo foi o único presidente do “eixo do mal” a prestigiar a posse de Bolsonaro. Ele foi esperto o suficiente para distinguir o discurso babaca bolivariano daquilo que realmente funciona na economia.

Se Evo estiver lendo esse artigo, certamente estará rolando no chão de rir, ao constatar que pundits imperialistas caíram na lábia de um índio boliviano.

Protestos no Chile

Estão querendo comparar os distúrbios no Chile com as manifestações brasileiras de 2013.

Há uma certa semelhança em seus inícios, com o reajuste dos preços dos transportes públicos servindo de estopim para manifestações violentas. Mas por enquanto, é só.

No Brasil de 2013, multidões foram às ruas reclamar da inépcia do governo, que iria patrocinar uma Copa do Mundo “padrão FIFA” e, ao mesmo tempo, entregava serviços “padrão CBF” para a população. Onde estão as multidões no Chile? Por enquanto, estão em casa. Em todas as fotos, o que aparece são elementos dispersos jogando bombas Molotov e quebrando tudo. Isto não é manifestação, é vandalismo.

Os problemas elencados pelos “analistas” resumem-se ao péssimo sistema de saúde pública, ao endividamento da juventude com as mensalidades dos cursos superiores e às aposentadorias muito baixas. Esse conjunto de mazelas recebe o nome genérico de “desigualdade”, o que é muito útil quando se quer demonizar o capitalismo liberal pelos problemas insolúveis da sociedade.

No final do dia, trata-se de criar mecanismos em que a sociedade como um todo subsidie a renda dos mais pobres. Fim muito nobre, mas de boas intenções o inferno está cheio. Temos montanhas de exemplos ao longo da história demonstrando que a máquina criada para “redistribuir” a renda cria vida própria, engolindo boa parte da renda da sociedade. O resultado é pobreza generalizada.

Infelizmente, a escolha se dá entre igualdade e geração de riqueza. As sociedades que buscam a igualdade a todo custo acabam na pobreza. E, adivinha, quem sofre são justamente os mais pobres.

Tenho consciência de que esse tipo de raciocínio fere os espíritos mais sensíveis, os monopolistas do bem. Só eles sabem o que é sofrer, ser pobre, e só eles têm a solução para o “problema da desigualdade”. Esse pessoal vive em um mundo utópico, onde todos têm acesso à USP, ao Einstein e à aposentadoria integral. Bastaria ter “vontade política”, e todos esses problemas se resolveriam como que em um passe de mágica. Só não fazem isso (sujeito indeterminado) porque esses capitalistas são maus como o pica-pau. São “a favor da desigualdade”, como sugere a legenda da foto abaixo.

Isso aí no Chile não vai dar em nada, por ser iniciativa de meia dúzia de “revolucionários toddynho”, como este que aparece na foto abaixo. A maioria dos chilenos sabe que, apesar das mazelas de todo país subdesenvolvido, o Chile é uma ilha de prosperidade dentro da América Latina.

Foto extraída do jornal O Estado de São Paulo

Hambre Cero

José Graziano foi o responsável por implementar o programa “Fome Zero” logo no início do governo Lula. Era a menina dos olhos do então presidente.

Não demorou muito tempo, Graziano foi defenestrado do governo. O programa “Fome Zero” foi substituído pelo “Bolsa-Familia” e o resto é história.

Agora, o candidato peronista vai patrocinar o “Hambre Cero”, versão argentina do finado programa brasileiro.

O que chama a atenção é a inconsistência da coisa toda: esse pessoal phode com a economia, joga milhões de pessoas na pobreza com alto desemprego e inflação, e depois vêm patrocinando programas para minorar os efeitos de suas próprias políticas.

Só tem um jeito de minorar a fome de maneira permanente: políticas econômicas responsáveis ao longo de muito tempo, de gerações. O resto é só “vontade política”, sinônimo de voluntarismo e populismo, que criam mais pobreza e fome no longo prazo. Até quando os latino-americanos vão se deixar enganar por esses embusteiros?

Desigualdade

Parece que é o maior índice de Gini já registrado na série histórica, se a matéria estiver correta.

Serão horas e horas de debate na Globo News hoje, com os comentaristas pontificando sobre as mazelas da desigualdade.

Não é por falta de “iniciativas governamentais” que somos um dos países mais desiguais do mundo. Há, na verdade, toneladas delas. A Constituição Cidadã desenhou o paraíso na Terra.

A reportagem também destaca as desigualdades regionais. A renda do Sudeste é mais que o dobro da renda do Nordeste. Também não é por falta de “incentivos governamentais”. Bancos e agências de desenvolvimento abundam no Nordeste.

A solução, é óbvio, passa pelo aumento da produtividade da população brasileira. A desigualdade aumentou nos últimos anos de recessão porque quem perdeu o emprego foram as classes mais baixas. O desemprego é de 11%, mas isso é só uma média. Nas classes D e E o desemprego é muito maior. Por um motivo simples: são trabalhadores menos produtivos. E, em uma recessão, você precisa fazer mais com menos. É óbvio que, nesse contexto, ocorre concentração de renda.

Não será com incentivos governamentais ou bolsas-auxílio que se resolverá o problema da desigualdade no Brasil. Pode-se até continuar com esses programas como uma forma de mitigar o sofrimento dos mais carentes. Mas erigir essas políticas (assim como o aumento da salário-mínimo na canetada) como O fator que vai resolver a desigualdade é enganar o povo. Tanto é assim, que atingimos o maior índice de desigualdade de renda da história após 30 anos da Constituição Cidadã e quase 15 anos de bolsa-família. Até quando o Brasil continuará neste auto-engano?

A única forma de diminuir a desigualdade de renda é aumentando a produtividade média da população. E isso só vai acontecer quando se investir a sério na formação de capital físico e humano. Qualquer outro “remédio” só servirá para aumentar a desigualdade no longo prazo. Essa é a experiência brasileira.

4 fatos sobre desigualdade de renda

Texto tirado da página de Sergio Almeida.


4 fatos sobre desigualdade de renda:

1. Nem toda desigualdade existente é “injusta”.

2. O papel do Estado em melhorar a distribuição de renda pode envolver (ele) agir menos, e não mais — sobretudo no caso brasileiro.

3. Aumentar salário mínimo não necessariamente melhora distribuição de renda.

4. Reduzir desigualdade não significa necessariamente reduzir pobreza.