Estamos muito pessimistas. Esta é a conclusão de um economista da IIF, uma instituição internacional que reúne bancos de todos os países, e da qual a Febraban faz parte.
Segundo o economista, o “novo teto” proposto pelo governo ainda segura bem as despesas e, em 2022, ainda estaremos gastando menos que em 2019. Parece a história do sujeito que caiu do 10o andar de um prédio e, ao passar pelo 5o andar, um morador pergunta se está tudo bem, ao que o homem responde: “tem um vento me incomodando, mas até aqui, tudo bem”. Acho que, da mesma forma, o economista não entendeu a natureza do problema criado pela mudança da regra do teto.
A regra do teto de gastos foi inscrita na Constituição brasileira. Essa foi uma novidade potente, que convenceu os agentes econômicos de que aquilo era para valer. A regra da geração de superávits primários, que era a regra anterior, foi cumprida durante 15 anos mesmo não estando escrita em lugar algum. Mas foi facilmente abandonada quando as receitas deixaram de crescer na mesma velocidade que as despesas. Agora não! Com a regra do teto, tínhamos algo oficial, que obrigava os dirigentes políticos a andarem na linha.
O mercado caiu na ilusão de que as leis modificam o comportamento dos agentes políticos. Modificam sim, mas até certo ponto. Em determinado momento, no limite, muda-se a lei. Temos um exemplo dramático na Argentina, quando se estabeleceu a paridade de 1 para 1 entre o Austral e o Dólar. Aquela paridade sobreviveria se houvesse disciplina fiscal. Entre a indisciplina e a paridade, escolheu-se a indisciplina. O resto é história.
O teto de gastos não sobreviveu à indisciplina fiscal. E não adianta dizer, como o faz o economista do IIF, que, por enquanto, tudo bem. Sabemos (o mercado sabe) que, entre a indisciplina e uma moeda estável, a escolha sempre será pela indisciplina. Mesmo que a regra esteja inscrita na Constituição. A coisa poderia funcionar se, daqui por diante, todos os brasileiros se dessem as mãos, e prometessem não pegar nem mais uma latinha de cerveja na geladeira. “Ninguém larga a mão de ninguém” não costuma ser uma regra crível.
O grande mal dessa mudança atabalhoada na regra do teto foi demonstrar que lei, no Brasil, não passa de um arranjo provisório. O que vale é a “boa intenção” do governante, do Congresso e do STF de plantão. Como as necessidades sociais em um país pobre como o Brasil serão sempre muito maiores do que a capacidade de arrecadação, a dívida pública sempre será pressionada. A única forma de conter a dívida, nesse contexto, é a inflação, como vimos neste ano: a dívida só está abaixo de 90% do PIB porque a inflação fez crescer o PIB nominal. Quem perdeu foram os detentores da dívida, como bem sabe qualquer investidor em renda fixa.
É por isso que, para se protegerem de “truques” desse tipo, os detentores da dívida estão pedindo taxas de juros muito mais altas. O problema não é a dívida hoje ou os gastos do ano que vem, como sugere o economista do IIF. O problema é que ficou claro que as regras se desmancham no ar, ao sabor das necessidades do momento. O próximo presidente terá muita dificuldade em reconquistar a confiança dos credores da dívida pública.