Lógica sem lógica

Não consegui entender exatamente a lógica proposta pelo doutor.

Por um lado, ele afirma que pessoas assintomáticas não precisariam se isolar se testes massivos fossem aplicados a pessoas sintomáticas. Em seguida, diz que testes em pessoas assintomáticas são inúteis, pois essas pessoas podem estar com o vírus mesmo com o resultado negativo.

Aí pergunto: qual a diferença entre uma pessoa que não fez o teste e vai visitar o vovô, e uma pessoa que fez o teste, deu negativo, e vai visitar o vovô? Pelo visto, nenhuma. Então, por que cargas d’água as pessoas assintomáticas poderiam circular livremente, se podem ter o vírus mesmo sem ter sintomas?

Fazer testes massivos em pessoas sintomáticas não tem o dom de livrar pessoas assintomáticas do vírus. Uma coisa não tem nada a ver com a outra.

A lógica do doutor me escapa.

D. Iraci em home office

A querida D Iraci, que nos auxilia em casa há mais de 15 anos, faz hoje 69 anos de idade. Ela pega ônibus e metrô para vir até aqui em casa.

A partir de hoje, ela estará trabalhando em home office. Levaremos ingredientes até a casa dela, e lá ela fará seus pratos deliciosos. Será um trabalho adicional para nós, mas D Iraci faz parte do grupo de risco, e andar em transporte público não é o mais indicado.

Tenho consciência de que esta não é uma solução possível para todos. Mas todos que puderem fazer alguma coisa, já ajuda. D Iraci será, se Deus quiser, menos uma a sobrecarregar o sistema público de saúde.

O seguro de Schrodinger

As medidas de contenção do coronavírus estão exageradas? Pela própria natureza da coisa, nunca saberemos ao certo.

Se as medidas de contenção derem certo, ou seja, não enfrentarmos um crescimento vertiginoso do número de casos da doença a ponto de pressionar o sistema de saúde nacional (como está ocorrendo na Itália), não saberemos se foi por causa das medidas ou se seria assim mesmo, mesmo sem as medidas.

O inverso não é verdadeiro: se não forem adotadas medidas de contenção, saberemos com certeza se essas medidas eram necessárias ou não, a depender do resultado desta não-ação.

Tenho lido por aí que esta decisão funciona como um seguro. Em termos. No caso do seguro, se adquirido, sabemos com certeza, ao final do período segurado, se jogamos dinheiro fora ou não. Aconteceu o sinistro, o seguro valeu a pena. Não aconteceu, “perdemos” dinheiro.

Já no caso das medidas de contenção, se o sinistro não ocorrer, nunca saberemos com certeza se foram essas medidas as responsáveis pelo “não-sinistro”. Por um motivo simples: o próprio “seguro” interfere no resultado final. Trata-se de uma espécie de “seguro de Schrödinger”.

Tenho ouvido algumas pessoas defenderem que está tudo muito exagerado, porque, afinal, trata-se de uma gripe e, como tal, seria muito mais virulenta no inverno, como está acontecendo no hemisfério norte. Aqui, no país tropical abençoado por Deus, o coronavírus não teria a mínima chance.

Pode ser, faz até sentido. Se adotarmos medidas de contenção, discutiremos até o fim dos tempos se esta hipótese era verdadeira ou não. Por outro lado, se não adotarmos medidas de contenção, descobriremos, na prática, se a hipótese era verdadeira. Seria o Brasil servindo como um imenso laboratório científico. Vale o risco?