Duas notinhas, uma em seguida da outra, definem o que será a eleição para o governo de SP.
Na primeira, enterra-se a possibilidade de impugnação da candidatura do carioca Tarcísio de Freitas. Ao contrário do paranaense Sérgio Moro, Tarcísio alugou imóvel em uma cidade do estado. Portanto, tinha endereço fixo, suficiente para provar seu “vínculo” com o estado. Como se vê, não era muita coisa o que precisaria ser feito para conseguir provar o domicílio eleitoral. Mas, em uma carreira política marcada pelo improviso, Moro nem sequer isso conseguiu.
Na segunda nota, fica claro que o próximo governador será um desses três nomes: Tarcísio de Freitas, Márcio França ou Rodrigo Garcia. Qualquer um dos três se beneficiará do voto antipetista no 2o turno. É provável que Haddad possa atrair o voto anti-bolsonarista se o seu adversário for Tarcísio de Freitas, mas não creio que esse contingente seja suficiente para lhe dar a vitória. Para tanto, seria preciso que chegasse ao 2o turno com mais de 40% dos votos, o que parece bem improvável. Contra Márcio França ou Rodrigo Garcia, a derrota de Haddad seria ainda mais acachapante, pois não contaria com o voto anti-bolsonarista.
Enfim, treino é treino, jogo é jogo, eleição é uma caixinha de surpresas, mas acho que o quadro eleitoral paulista está bem delineado.
Ouve-se um farfalhar nervoso de asas no ninho tucano. Tuíte na página oficial do partido, com estrondosas 166 curtidas, afirma que Lula é “hipócrita” ao buscar líderes tucanos. Aécio xinga o candidato petista de “arrogante”.
Mas a manchete alarmista do Estadão (“… abala busca por apoios entre rivais históricos”) é desmentida na própria reportagem.
Aloysio Nunes apertou o “confirma” no 13 ainda no 1o turno, apesar do “reparo” à fala de Lula. E resta alguma dúvida de que o PSDB histórico estará ao lado de Lula no 2o turno, independentemente do que o petista fale?
Que o PSDB acabou não há dúvida. O partido quis ser uma oposição europeia no ambiente político brasileiro. Para que isso funcionasse, seria necessário que seu adversário também fosse europeu, de preferência alemão. Mas o PT é latino-americano, com toda a falta de institucionalidade que nos caracteriza. Precisou chegar um sujeito como Bolsonaro, que entende que a regra do jogo é dedo no olho e chute da medalhinha pra cima, para concorrer com o PT de igual para igual. Como cereja do bolo cuidadosamente preparado durante anos a fio, o partido, a começar por seus “líderes históricos”, sabotou o seu próprio candidato escolhido pelos filiados nas prévias. Realmente, não tinha risco de dar certo.
A prova máxima do fim do PSDB está em um tuíte do próprio perfil oficial do PSDB, 24 horas depois do tuíte anterior. Ao retuitar notícia do UOL, o perfil oficial do PSDB (convém repetir) reproduz a foto que acompanha o tuíte do UOL: Lula de mãos dadas para o alto com Alckmin, em gesto de união e vitória. É o troféu de Lula exibido na sala de estar do partido. O PSDB acabou.
A pesquisa Datafolha publicada hoje está dando o que falar. Não é à toa: Lula aparece com 48% das intenções de voto, indicando vitória já no 1o turno, 21 pontos à frente de Bolsonaro. É a maior pontuação de Lula desde o início do ano, e a maior diferença desde fevereiro, quando uma pesquisa da Genial/Quaest apontou diferença de 22 pontos.
Mas vamos analisar um pouco mais. O gráfico abaixo mostra o acompanhamento de todas as pesquisas publicadas desde o início do ano (total de 44 pesquisas até o momento). Cada ponto representa uma pesquisa, e a linha continua é a média das pesquisas feitas nos últimos 15 dias. A ideia é pegar a tendência de curto prazo.
Podemos observar que o número do Datafolha não muda a tendência para Lula de maneira relevante, que já vinha oscilando entre 40 e 45 pontos desde o início do ano, e continua lá. Seria necessário que outras pesquisas confirmassem o Datafolha para mostrar uma tendência de crescimento.
Também para Bolsonaro, que vem oscilando entre 30 e 35 pontos desde a desistência de Moro, o Datafolha não mudou de maneira relevante a tendência. Assim como para Lula, seria preciso que outras pesquisas confirmassem a tendência.
Até o momento, a única mudança relevante no quadro eleitoral foi a desistência de Moro, que fez com que Bolsonaro saltasse da faixa de 25-30 para 30-35 pontos, enquanto “Outros” (já sem Moro) recuou de 20 para 15 pontos. E é sob este prisma que gostaria de analisar essa pesquisa do Datafolha.
A última pesquisa Datafolha foi feita no dia 22/03, antes, portanto, da desistência de Moro. Até o momento, como vimos, todas as pesquisas mostraram uma migração de votos de Moro para Bolsonaro. Estranhamente, não foi o que aconteceu no Datafolha, em que “Outros” emagreceu de 21 para 13 pontos, mas esses pontos migraram para Lula, que subiu de 43 para 48 pontos. Não faz muito sentido, e vai contra todas as outras pesquisas do último mês.
Também ainda não consegui a abertura da pesquisa para ver onde Lula cresceu, assim que conseguir complemento essa análise.
De qualquer forma, valem duas observações:
1) É preciso acompanhar as pesquisas de outros institutos para ver se o Datafolha é um outlier ou uma mudança de tendência e
2) Pesquisa em maio ainda é recall, estamos longe da campanha eleitoral propriamente dita. Obviamente, significa que, se a eleição fosse hoje, Lula estaria eleito. Mas a eleição não é hoje, é daqui a 5 meses. E 5 meses são uma eternidade.
Lula afirma que o teto de gastos foi estabelecido para satisfazer “banqueiros gananciosos”, que queriam, vejam só, que o dinheiro que emprestaram para o governo fosse pago.
Como sempre, são várias as questões envolvidas nessa, digamos, fala do “candidato-que-não-vai-fazer-o-que-diz-que-vai-fazer”.
A primeira é técnica: conforme estatística do Tesouro Nacional, os “banqueiros” detém somente 29,47% da dívida pública. Tirando os 4,63% detidos pelo próprio governo, restam 65,90% nas mãos de pessoas físicas ou empresas, através de fundos de pensão e fundos de investimento.
Ou seja, não são somente os “banqueiros” que estão preocupados com que o governo pague a sua dívida. É a poupança das famílias que está em jogo. Claro que Lula sabe disso.
Em segundo lugar, essa dívida existe porque governos irresponsáveis do passado, entre os quais os governos do PT merecem o ponto mais alto do pódio, torraram dinheiro como se não houvesse amanhã. Reformas que poderiam mitigar a situação, como a da Previdência e a Administrativa, sempre foram impiedosamente bombardeadas pelo PT. Os “banqueiros” financiaram a festa petista. Claro que Lula sabe disso.
Lula afirma que “um governo sério não precisa de teto de gastos”. De fato, não precisa mesmo. Por isso, um teto para os gastos é essencial para que um novo governo do PT não signifique uma catástrofe econômica para o Brasil. Lula pode afirmar que, em seu governo, o país produzia superávits primários. Verdade. Só não vai lembrar que a semente do desastre do governo Dilma, com um descontrole total das finanças públicas e a maior recessão da história do Brasil, foi plantada em seu governo. Dilma apenas colheu o que ela e Lula plantaram no segundo governo Lula. Claro que Lula sabe disso.
Lula sabe que os banqueiros são seus parceiros, que a dívida pública não surgiu do nada e é o lastro da poupança das famílias, que Dilma não foi um desastre nascido de geração espontânea. Lula sabe de tudo isso, mas discursa como se não soubesse, com o objetivo de animar o seu próprio público. O resultado é esse discurso que transpira hipocrisia, mas que é saudado pelas esquerdas como uma esperança de redenção.
Como tudo o que Lula diz, seu governo será melhor se ele fizer o justo oposto. Claro que Lula sabe disso.
“Depois do dia de ontem, o PSDB tem o dever moral de não lhe dar a legenda para disputar a presidência”.
Escrevi a frase acima no dia 01/04, o dia do Fico de João Doria, quando ele desistiu da desistência de renunciar ao mandato de governador. Uma palhaçada, alçada à categoria de “estratégia política”. Só na cabeça perturbada do ex-governador.
Escrevo essa pequena nota com cautela, vai que amanhã o empresário e dublê de político resolve dizer que a desistência de hoje era também “uma estratégia”. De qualquer forma, o alto tucanato fez a única coisa que lhe restou fazer depois de toda essa lambança: negou-lhe a legenda, conforme eu havia previsto em 01/04. Não era difícil de prever o desfecho, dado o nível da patuscada.
Desde quando decidiu concorrer para a prefeitura de São Paulo em 2016, o único objetivo político de João Doria era tornar-se presidente do Brasil. Frustrado em seu objetivo, tal qual um executivo que foi preterido por um concorrente ao cargo de CEO, só lhe resta retirar-se da empresa. No caso, da vida pública. Vai com Deus.
Alguém já disse que a girafa é um cavalo redesenhado por um comitê multidisciplinar.
Tive essa impressão quando vi o logo da propaganda da chapa Lula-Alckmin.
O novo marqueteiro de Lula já havia afirmado que pretendia “desavermelhar” a campanha do PT. Acho até que ele talvez tivesse uma boa ideia, mas parece que o resultado final passou por um comitê.
Tem vermelho, tem verde e amarelo, tem bandeira do Brasil, tem a palavra Brasil, tem juntos com uma letra de cada cor, tem o “A” sobre o “O” como se tivesse sido feito de última hora. Faltaram somente a estrela do PT e a pomba do PSB, mas acho que deve ter esgotado o tempo da sala da reunião do comitê e não deu tempo de colocar.
Ao invés de resultar em uma peça única e harmoniosa, a coisa parece mais uma colagem caótica de muitas ideias conflitantes. Uma agressão visual.
Mas, pensando bem, essa peça representa fidedignamente a aliança Lula-Alckmin e o contorcionismo que os marqueteiros vão precisar fazer para edulcorar o velho lulopetismo. É isso aí mesmo, não está errado. A candidatura Lula e a aliança Lula-Alckmin são uma girafa com pretensão de ser um cavalo.
Reza a lenda que Rodrigo Constantino é economista. Como todo economista aprende na faculdade, existe um negócio chamado “amostragem”, em que se procura aferir as características de uma população a partir de uma amostra dessa mesma população, de modo a reproduzir as características da população como um todo.
Em pesquisas eleitorais, procura-se reproduzir na amostra as características de gênero, idade, região, renda, escolaridade, etc da população como um todo. Dessa forma, tenta-se aproximar o melhor possível as características da população como um todo. Óbvio que a amostragem sempre será imperfeita, por isso temos a chamada “margem de erro”.
Pode-se questionar o método de amostragem ou mesmo a boa fé desse ou daquele instituto de pesquisa. Mas Constantino inovou, ao declarar que enquete é muito melhor do que pesquisa por amostragem para aferir a preferência do eleitorado.
Vou procurar dar um exemplo do absurdo da ideia. Imagine que você tem dois sacos com 100 bolas cada uma. Um dos sacos só tem bolas vermelhas e o outro só tem bolas brancas, mas você não sabe disso de antemão. A única coisa que você sabe é que as bolas não foram distribuídas aleatoriamente entre os sacos. Ou seja, pode haver proporções diferentes de bolas vermelhas e brancas a depender do saco. A sua missão é tentar descobrir a proporção de bolas vermelhas e brancas que existem na soma dos dois sacos.
O método científico indica que você deveria tirar um número igual de bolas de cada um dos dois sacos, pois os dois sacos têm o mesmo número de bolas (100). A estatística mostra que, após um número relativamente reduzido de bolas retiradas de cada saco, é possível saber com razoável precisão qual a proporção de bolas vermelhas e brancas nos dois sacos.
Constantino teve uma ideia diferente. Ele propõe tirar todas as bolas de um saco só. A ideia é de que, como serão muitas bolas retiradas, o resultado será muito mais confiável. Ora, não precisa ser um gênio da estatística para sacar que, a depender do saco escolhido, a conclusão será de que existem 100% de bolas vermelhas ou 100% de bolas brancas, o que está muito longe da realidade.
Esta é a diferença entre enquete e pesquisa. Na pesquisa, toma-se o cuidado de escolher uma amostra que represente a população. Na enquete, por outro lado, qualquer um vota. Por maior que seja o número de votantes, parece óbvio que não há compromisso algum com uma amostra representativa da população. Corremos o risco de tirar todas as bolas de um mesmo saco.
No caso específico da enquete que dá ampla vantagem a Bolsonaro, quem tende a votar é quem frequenta as redes sociais. Sabemos que este é um terreno dominado por Bolsonaro, que tem mais seguidores do que todos os seus competidores somados. Ocorre que esta é uma amostra enviesada da população. Segundo todas as pesquisas com amostragem corretamente estratificada, Lula lidera com folga no estrato com renda até dois salários mínimos, que tende a ter menor presença na internet. Em resumo, a enquete tende a tirar bolas somente de um dos sacos. Portanto, por mais bolas que sejam retiradas, não representa a proporção correta de votos.
Constantino sabe disso, ele é um bom economista. Uma pena ter enterrado sua carreira de maneira tão melancólica.
PS.: no final, Bolsonaro até pode ganhar as eleições, há toda uma campanha pela frente, e pesquisa é um retrato do momento, não quer dizer nada sobre o que vai acontecer daqui a 5 meses. Isso não significa, porém, que enquete seja melhor que pesquisa por amostragem para aferir a proporção de intenção de voto da população. Não se trata de opinião, isso é matemática.
Na pesquisa anterior da CNT/MDA em fevereiro, o ex-juiz Sérgio Moro tinha 6,4% das intenções de voto. Nesta pesquisa, já sem Moro, a variação das intenções de voto dos candidatos foi a seguinte:
Lula: – 1,6 pp (pontos percentuais)
Bolsonaro: + 4,0 pp
Ciro: + 0,4 pp
Doria: + 1,3 pp
Tebet: + 1,7 pp
Janones: + 1,0 pp
Ou seja, Bolsonaro sozinho ganhou 4 pontos percentuais enquanto os candidatos da “terceira via” ganharam, juntos, 4,4 pp. Estes candidatos todos tiraram 1,6 pp de Lula, 0,4 pp dos indecisos e herdaram 6,4 pp de Moro.
A notícia boa para a “terceira via” seria se UM dos candidatos herdasse TODOS os votos. Não aconteceu. Aliás, quem herdou mais da metade dos votos de Moro foi Bolsonaro.
Não há novidade nenhuma aqui, apenas a confirmação do que já apontaram outras pesquisas. O que me chamou a atenção foi só a manchete, que deve ter sido escrita pelo estagiário da redação, com todo respeito aos estagiários.
Além do ano bissexto, sabe mais o que acontece de quatro em quatro anos? A esquerda sai em busca dos votos dos evangélicos e do mercado financeiro.
Durante três anos, evangélicos são idiotas semianalfabetos que dão o seu pouco dinheiro para pastores inescrupulosos.
Durante três anos, o mercado financeiro produz injustiças, concentrando renda e sustentando bilionários às custas do proletariado que mal consegue ter três refeições por dia. Ah, de quebra, são os responsáveis pela violência, pois marginalizam uma boa parte da população.
De quatro em quatro anos, saem feito loucos fazendo reuniões para mostrar que respeitam muito os evangélicos e os farialimers. E tem evangélico e farialimer que cai nessa.
As posições de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco deixam Bolsonaro isolado em sua batalha em torno do sistema de apuração de votos. Lembrando que os dois chefes das Casas Legislativas foram eleitos com sólido apoio do Palácio do Planalto, o que torna ainda mais significativa a posição de ambos sobre o assunto. Apesar de não representarem todos os parlamentares, os presidentes da Câmara e do Senado de alguma maneira normalmente traduzem o sentimento majoritário das casas, pois o seu comando depende do apoio de uma maioria mais ou menos estável.
Temos então a seguinte situação: de um lado, o chefe do Executivo, de outro, os chefes dos outros dois poderes. Qual a real chance de que, de alguma maneira, Bolsonaro consiga empurrar a sua “solução” para o problema? Problema, convém destacar, que somente ele, dentre os três poderes, vê.
A história pode nos ser útil aqui. A deposição de Jango foi obra de dois poderes (Legislativo e Judiciário) contra o chefe do terceiro poder. Ao lado dos dois poderes havia o que chamo de “opinião pública”, representada por uma fatia representativa da classe média e do empresariado, cujo porta-voz são os grandes jornais. E, para que houvesse o enforcement da coisa, as Forças Armadas foram chamadas a atuar.
Hoje a situação, de alguma maneira, é a mesma: de um lado, o Executivo, do outro, Legislativo, Judiciário e grande parte da opinião pública, que só quer paz para trabalhar e não vê grandes problemas no sistema de apuração. Resta saber onde estão os militares. Será que, ao contrário de 1964, irão se juntar a um chefe de executivo isolado para impor uma solução aos outros dois poderes e a uma opinião pública refratária? Parece pouco provável.
Por isso, parece-me que o máximo que pode acontecer é uma versão tupiniquim da invasão ao Capitólio. Se lá já foi ridículo, imagine aqui.