No campo do possível

O anúncio da privatização da Eletrobrás, além de todos os méritos óbvios, tem mais um ainda pouco percebido, mas muito importante: começa a tornar plausível, imaginável, um cenário em que a Petrobras possa ser privatizada.

Antes do anúncio da privatização da Eletrobrás, a privatização das vacas sagradas do Estado brasileiro (Petro, Eletro, Banco do Brasil e Caixa) era apenas um delírio de liberais insanos, que não tinha a mínima, a mais remota chance de acontecer.

Sem querer comparar a Eletro com a Petro (são empresas que estão em patamares diferentes no imaginário do perfeito idiota latino-americano), somente o fato de a privatização da Eletrobrás ter sido anunciada move a privatização da Petrobras do campo dos unicórnios e duendes para o campo da viagem para a Lua. Muito difícil, mas possível, afinal.

Não é nada, mas é muito, em um país ainda preso a fetiches do século XX.

Onde está o dinheiro?

As ações da Eletrobrás subiram hoje 50%.

Vejam bem, não há absolutamente nada certo. O modelo não está definido, depende ainda de uma infinidade de fatores, vai haver muita pressão dos vários atores envolvidos. Pode demorar bastante, se é que um dia vai, de fato, acontecer.

Mas bastou uma simples carta de boas intenções, e os investidores compraram ações da empresa como se não houvesse amanhã. Se o processo realmente avançar, as ações podem subir muito mais.

O valor de mercado da Eletrobrás, ontem, era de R$20 bilhões. Com a alta de hoje, a empresa passou a valer R$ 30 bilhões. Como o Tesouro mais o BNDES detém cerca de 64% da empresa, ganharam (ganhamos) R$ 6,4 bilhões da noite para o dia. Bastou uma carta de boas intenções.

Sim, meus amigos, este é o custo de se manter estatais. Quando você se perguntar onde está o dinheiro para investir em saúde e educação, já sabe onde procurar.

Mais um curral

A privatização da Eletrobrás é dessas coisas em que só acredito vendo. FHC, na época das grandes privatizações, até que tentou, mas não conseguiu. Fez privatizações localizadas, de concessionárias estaduais. Mas na vaca sagrada do setor elétrico, não tocou.

O que me chama a atenção nesse episódio é o contraponto que o governo federal está fazendo em relação a Minas Gerais. Enquanto políticos mineiros dos mais diversos partidos lutam sofregamente para manter mais essa ilha de ineficiência chamada Cemig, o governo federal vende a Eletrobrás, para aumentar a eficiência e baratear a energia para o consumidor.

Por que tamanha sofreguidão em manter a Cemig nas mãos do estado? Difícil de entender, sem lançar mão da hipótese de manter nas mãos desses mesmos políticos um instrumento de, digamos, acomodação de interesses. “Interesses estratégicos” ou “patrimônio do povo mineiro” seriam motivos cômicos se não fossem trágicos. Minas, como todos os outros Estados do Brasil, está quebrada. Mas esses políticos irresponsáveis não veem problema em tomar uma dívida de R$11bi para pagar pelas concessões que, de outro modo, seriam leiloadas. E R$11 bi do BNDES, que estaria, assim, perpetuando a ineficiência.

Aécio Neves, o político mineiro que está liderando esta patacoada, posou de moderno na campanha de 2014. Está se mostrando, na verdade, mais um coronel que quer manter o seu curral intacto.