Ranking de óbitos

Apenas para constar, segue a lista dos primeiros 20 países por total de óbitos por Covid-19, acumulados até o dia 23/01/2021, por milhão de habitantes. Considerei apenas países com mais de 5 milhões de habitantes (total de 120 países). Fonte: Worldometer.

  1. Bélgica: 1.782
  2. Reino Unido: 1.433
  3. Rep. Tcheca: 1.427
  4. Itália: 1.408
  5. Bulgária: 1.277
  6. EUA: 1.256
  7. Hungria: 1.227
  8. Peru: 1.195
  9. Espanha: 1.185
  10. México: 1.145
  11. França: 1.116
  12. Suécia: 1.091
  13. Suíça: 1.040
  14. Argentina: 1.034
  15. Brasil: 1.018
  16. Colômbia: 1.002
  17. Portugal: 999
  18. Chile: 935
  19. Polônia: 933
  20. Romênia: 923

Outros países e suas colocações:

  • 28. Alemanha: 627
  • 31. Canadá: 503
  • 32. Israel: 499
  • 41. Dinamarca: 339
  • 72. Japão: 39
  • 74. Austrália: 36
  • 77. Coreia: 26
  • 112. China: 3

Revisitando o estudo do Imperial College London

No dia 29/03 do ano passado, fiz uma análise do estudo do Imperial College London, que previa até 1 milhão de mortes no Brasil pela Covid-19 se nenhuma medida de distanciamento social fosse adotada.

Na época, os números foram considerados muito alarmistas. O Brasil, naquele dia, havia acumulado apenas 137 óbitos.

O estudo previa alguns cenários de mitigação. O segundo cenário mais otimista, o de supressão tardia, previa 206 mil óbitos, número que atingimos no último dia 13/01.

Como enfatizo no post, tratava-se de um modelo matemático que utilizava certas premissas. Várias destas podem não ter se confirmado, como por exemplo, o coeficiente de transmissão. De qualquer modo, não deixa de ser interessante observar como números que pareciam exagerados na época são, 10 meses depois, vistos como possíveis. A matemática é cruel.

Covid vs. H1N1

Fazia tempo que não pesquisava sobre a Covid. Talvez porque tenha se tornado um assunto batido, sem muita novidade. Fui olhar o site da Fiocruz, que faz o monitoramento da SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) no país. Gosto especialmente deste site porque saímos daquela discussão sobre “é Covid, não é Covid”. Aqui, a estatística é sobre SRAG, que pode ser Covid ou não. Como, ao que consta, não há outra doença respiratória grave por aí, grande parte dessa estatística deve ser Covid.

Pois bem. Comparei os números de 2009, ano da H1N1 e de 2020. 2009 havia sido o pior ano de SRAG até agora. Então, serve como parâmetro de um “ano ruim”. Duas coisas me chamaram especialmente a atenção:

1) O número de óbitos bateu o pico de 3,5/semana/100 mil habitantes, e ficou pelo menos 10 semanas na faixa de 2,5/semana/100 mil. Em 2009, o pico foi de meros 0,14/semana/100 mil, e caiu rapidamente.

2) Isso aconteceu com um número de casos não tão maior do que 2009: naquele ano, o pico foi de 6 casos/semana/100 mil, ao passo que, em 2020, foi de 10,5 casos/semana/100 mil. Podemos observar, também, que há um platô de casos em 2020, entre 9 e 10 casos/semana/100 mil que durou cerca de 15 semanas, coisa que não aconteceu com a SRAG em 2009, que atingiu um pico e logo caiu.

Observando estes dois pontos em conjunto, podemos concluir que:

1) A letalidade da SRAG em 2020 é muitas vezes maior que a letalidade em 2009. Tivemos taxa de óbitos cerca de 20 vezes maior em 2020 comparado com 2019, com um número de casos apenas 1,5 vez maior.

2) O surto de SRAG de 2020 é de natureza completamente diferente do surto de 2009: enquanto em 2009 o surto atingiu um pico e caiu rapidamente sem grandes medidas de isolamento social, o pico de 2020 persistiu durante muitas semanas, MESMO COM MEDIDAS DE ISOLAMENTO SOCIAL. Fico imaginando o que teria acontecido sem essas medidas.

Como eu disse, fazia tempo que não dava uma olhada nos números da SRAG. Olhando em retrospecto, estes números levam-me a concluir que a coisa é bem mais grave do que eu imaginava no início, quando fiz as primeiras análises com base nesses gráficos. A análise definitiva da catástrofe somente poderá ser feita quando tudo estiver terminado, usando estatísticas de causa mortis. Isso deve levar pelo menos mais um ano. De qualquer forma, parece que não é só uma “gripezinha”.

Matemágica

Esta é um pouco mais difícil do que aquela do inverno começar em agosto na Europa, mas sinceramente esperava um pouco mais do Átila.

O gráfico que ele mostra relaciona número de óbitos diários com número de óbitos totais. Do jeito que está desenhado, Brasil e EUA estão em um horror sem fim, enquanto outros países aparentam ter sido muito mais eficientes no combate à epidemia.

Só tem um probleminha: o gráfico está em números absolutos. Brasil e EUA têm populações várias vezes maiores do que os outros países do gráfico. Obviamente, o número total de mortos é maior, o que produz essa “reta que não termina nunca” quando comparado aos outros países.

Fiz o mesmo gráfico, mas agora adotando a óbvia métrica dos óbitos por habitante. Voi lá! Os gráficos de Brasil, Espanha e Reino Unido, os três países que peguei de exemplo, têm gráficos muito semelhantes. Qualquer outro país (como é o caso dos EUA e de vários outros países da Europa) que tem hoje um total acumulado de óbitos/milhão entre 600 e 700 apresentará mais ou menos o mesmo gráfico.

Coloquei também o gráfico de Brasil, Espanha e Reino Unido, somente do número de óbitos/milhão ao longo do tempo (este é o gráfico mais comum). O número total de óbitos/milhão desses 3 países é mais ou menos ou mesmo, mas na Europa este número fica concentrado no início, enquanto no Brasil “achatamos” a curva de óbitos. Em linguagem matemática, a integral das três curvas (a área debaixo das curvas) é a mesma para os três países, apesar do formato das curvas ser bem diferente. Achatar a curva não era o objetivo? Nesse sentido, fomos melhor sucedidos do que esses países.

Enfim, cada um mostra o gráfico que quer para contar a história como lhe interessa. Por isso matemática é tão importante. Estude matemática e não se deixe enganar com qualquer matemágica.

Uma doença mutante

Junto aqui uma notícia com um artigo do Fernando Reinach com os números da epidemia na Espanha.

A notícia é a seguinte: o inquérito sorológico quinzenal patrocinado pela prefeitura de São Paulo encontrou um aumento significativo de contaminados pelo novo coronavírus em bairros de IDH mais alto (centro expandido de São Paulo). No entanto, este aumento de contaminação, surpreendentemente, não resultou em maior procura pelos maiores hospitais da região.

Corta para o artigo, aliás, espetacular.

Fernando Reinach afirma que a verdade verdadeira é que esses testes rápidos usados nos inquéritos sorológicos (inclusive o paulistano), têm resultados tão verdadeiros quanto uma nota de R$3. Segundo ele, estamos descobrindo que esses testes não detectam a presença de anticorpos após algum tempo da contaminação. Ou seja, pessoas podem ter sido contaminadas, serem já imunes, e o tal teste não detectar.

Trata-se de uma descoberta recente, e que joga por terra a estratégia das pesquisas sorológicas baseadas em testes rápidos para o estabelecimento de estratégias de abertura da economia. Podemos ter uma população muito maior já contaminada a essa altura do campeonato.

Corta para a Espanha (gráfico abaixo).

Na Espanha, o pico de casos da 1a onda foi em 21/03, com 192 casos/milhão de habitantes. O pico de óbitos ocorreu 13 dias depois, no dia 03/04, com 18,4 óbitos/milhão. Agora, a 2a onda. O pico dessa 2a onda foi no dia 27/08, com 158 casos/milhão. 14 dias depois, no dia 09/09, temos o suposto pico de óbitos (ainda não sabemos se é um pico): 1,4 óbitos/milhão.

Então, temos o seguinte: o pico da 2a onda foi de 82% do pico da primeira, enquanto o pico de óbitos da 2a onda foi de 7,6% do pico da primeira. Ou, de outra forma: se o número de óbitos nesta 2a onda fosse proporcional ao número da 1a onda, teríamos hoje 8,4 vezes mais óbitos.

O que mudou da 1a para a 2a onda? Mais testes? Pessoas mais jovens sendo contaminadas? Melhores protocolos médicos? Mutação benigna do vírus? São várias as tentativas de explicação. Nada que realmente explique.

Esse conjunto de informações só faz crescer minha convicção de que estamos tratando com um alvo móvel. Certezas absolutas são substituídas por outras certezas absolutas. É preciso ter a mente aberta para receber novos conjuntos de informações e agir de acordo. Fernando Reinach tem essa capacidade, na minha opinião. Sua leitura da pandemia vem mudando com o tempo, na medida em que novas informações foram chegando. A pandemia no início era uma coisa, hoje é outra. Quem, no início, defendia que se tratava de uma gripinha, estava errado. Assim como hoje, quem defende que estamos à beira do apocalipse, está errado. Olhamos para trás e vemos 130 mil mortos. Olhamos para frente, e vemos, por tudo o que foi descrito acima, perspectivas melhores, não piores.

Números em queda?

Há alguns dias, o Estadão publicou um gráfico produzido pelo município de São Paulo, mostrando uma queda drástica do número de óbitos na cidade (abaixo).

Vi alguns comemorando o dado, mas trata-se do erro clássico de considerar o número de óbitos na data do óbito e não na data do registro. Por que um erro clássico? Porque os óbitos podem demorar até um mês para serem registrados. Então, aquele número que parece baixo no final do gráfico vai engordar nos dias seguintes.

É o que mostra o segundo gráfico que reproduzo abaixo, elaborado pelo Estadão e publicado hoje. Aquele mesmo número baixo se transformou em um número na média apenas 3 dias depois. Os óbitos “atrasados” foram contabilizados, mostrando que aquela tendência de queda tratava-se de uma miragem.

Isso significa que os números não estão em queda? Não. O site Observatório COVID Brasil faz uma estimativa do número de óbitos com base nas características da doença até hoje conhecidas e nos dados oficiais (abaixo). De fato, a tendência parece ser de queda, mas não tão intensa como sugere o site da prefeitura. Ou seja, dá até para comemorar, mas não muito.

Molecagem

O site do ministério da saúde voltou. Agora não tem mais o número total de casos/óbitos, só o número do dia. Como se as pessoas não soubessem somar. É de uma infantilidade tal, que depõe contra a inteligência dos responsáveis por esse tipo de iniciativa.

Pior: não estão mais disponibilizando o arquivo Excel que facilitava o acompanhamento. Agora precisa digitar um por um os números dos Estados, e não há mais informações dos municípios. Tudo para dificultar a vida de quem acompanha a situação mais de perto. Com que objetivo?

Se os números estão sob suspeição, então que corrijam e expliquem os critérios da correção. Dificultar o acesso é coisa de moleque pirracento. Que triste papel.

Mais uma teoria da conspiração

Os dados da Covid-19 estão sendo questionados pelo governo federal. Segundo Carlos Wizard, com futuro assento no ministério da saúde, os Estados estariam interessados em inflar as estatísticas para, assim, poderem pedir mais verbas.

A história é até bem contada, mas tem um problema: não bate com a realidade. Temos Estados com muitos casos e Estados com poucos casos. Será que esses Estados com poucos casos não estariam também interessados em mais verbas? Dentre os Estados com poucos casos, temos Rio Grande do Sul e Minas Gerais, dois dos mais endividados Estados da Federação, e que mais desesperadamente precisam de recursos federais. Por que estariam perdendo essa chance de “maquiar” os números?

Enfim, se você quiser acreditar em teorias da conspiração, não há simplesmente nada, nenhum argumento, que lhe possa convencer do contrário. Já vi gente dizendo que os números dos Estados governados pela oposição estariam mais inflados que os números dos Estados amigos de Bolsonaro. Cada um com sua teoria.

O fato é que o site do Ministério da Saúde está “em manutenção”, e não consegui extrair os dados diários por Estado e por cidade. Se tem algo que realmente não ajuda na resolução de um problema é a falta de dados. E o pior: com essa nuvem de suspeição, como confiar nos dados daqui em diante? Por que os dados “auditados” pelo governo federal seriam mais confiáveis do que os dados das secretarias estaduais? Ou seja, estamos nos esforçando ainda mais para nos colocarmos como párias internacionais: além de termos um epidemia ainda crescendo, teremos dados “tratados” pelo governo federal.- Ah, mas aí sim, os dados serão mais confiáveis!

Assim é se assim lhe parece. Como eu disse acima, se uma pessoa acredita em teoria da conspiração, nada no mundo a fará desacreditar de sua teoria.

O Ministério da Saúde se transformou no Ministério da Verdade. E a Verdade, como sabemos, nos fará livres.

PS.: conspiração por conspiração, tenho a minha teoria: Carlos Wizard controla as franquias da Pizza Hut e KFC no Brasil. O setor de restaurantes, claro, está sofrendo muito com as medidas de isolamento.

O tempo é o senhor da razão

Hoje faz exatamente um mês desse anúncio de página inteira, publicado nos principais jornais do Brasil. É da lavra do CEO da Multiplan, defendendo, com palavras menos toscas, que a Covid-19 não passava de uma “gripezinha”, e que tínhamos de voltar a trabalhar.

Cheguei a comentar na época que a comparação com outras doenças era descabida, pois feita em bases de tempo diferentes: comparava-se os mortos pela Covid-19 em pouco mais de um mês com as mortes em um ano inteiro por outras doenças. Na época, fiz uma conta simplória: se o número de óbitos pela Covid-19 crescesse no mesmo ritmo da semana anterior, teríamos 54 mil óbitos em um ano. Bem, um mês depois, temos mais de 20 mil, and counting.

Reproduzi o mesmo gráfico do anúncio, mas na mesma base de tempo: o período de 23/04 a 22/05, um mês depois dos dados apresentados no anúncio. Se as outras causas de morte permaneceram mais ou menos nos mesmos patamares de 2018 (ano desses dados), a Covid-19 deve ter sido a terceira causa de morte no Brasil nos últimos 30 dias, colada no câncer. Outra forma de ver: a Covid-19 deve ter sido responsável por cerca de 16% das mortes do Brasil no período.

Não custa lembrar que na semana anterior a esse período de 30 dias, a média de crescimento diário de óbitos era de 164/dia (média de 7 dias), enquanto hoje é de 890/dia, na mesma média. A Covid-19 caminha rapidamente para se tornar a principal causa-mortis do país.

Lição: nunca subestime o crescimento exponencial de uma doença altamente contagiosa que não tem vacina nem remédio.

Covid-19 vs Pneumonia

Já chamei a atenção aqui algumas vezes sobre a impropriedade de se comparar a Covid-19 com outras doenças. A preferida de quem gosta de comparar laranjas com bananas é a pneumonia. Como ambas as doenças atacam os pulmões, a Covid-19 virou o mesmo que pneumonia, só que matando muito menos. Afinal, a pneumonia mata 75 mil pessoas em média no Brasil por ano, enquanto a Covid-19 matou “só” 20 mil até o momento.

O problema, além da impropriedade de se comparar doenças com grau de transmissão imensamente diferentes, é a base de comparação. Compara-se dados anuais (da pneumonia) com dados de poucos meses (da Covid-19). Agora que temos praticamente dois meses de óbitos acumulados, já é possível comparar a Covid-19 com a pneumonia em bases semelhantes.

Foi o que eu fiz. Com base nos dados do Datasus, calculei a média de óbitos/milhão de habitantes por pneumonia em cada Estado e no país como um todo, mês a mês, entre os anos de 2009 e 2018 (último ano disponível na base de dados). Comparei então com os números da Covid-19 dos meses de abril e de maio (até o dia 22/05, esse número vai ainda piorar até o final do mês). Os resultados estão nos gráficos abaixo.

Podemos observar que, no país, o número de óbitos por Covid-19 em maio já é 2,6 vezes maior (71 contra 27 por milhão) do que o número médio de mortes por pneumonia nos anos 2009-18. Em abril já havia fechado no mesmo nível. Os resultados são muito diferentes de Estado para Estado, alguns com níveis horrorosos e outros onde o Covid-19 não deu as caras.

Alguns poderão dizer que não estou considerando a sazonalidade. Afinal, a pneumonia ataca mais no inverno. Verdade, mas a diferença não é significativa. O mês em que a incidência é maior é agosto, com 31 óbitos/milhão, não muito diferente dos 27 de maio.

Enfim, o problema da Covid-19 é a sua alta capacidade de transmissão e a explosão de casos em um curto período de tempo. A comparação com a pneumonia é claramente inadequada, por esta ser uma doença que incide de forma mais ou menos uniforme ao longo do ano, como podemos ver pelos números.