Incentivo para quem?

O ex-secretário da Receita Federal de FHC, Everardo Maciel, volta à carga contra a reforma tributária ora em análise no Congresso. A sua preocupação é com o aumento da carga tributária sobre os serviços e a impossibilidade da concessão de incentivos fiscais por parte dos entes da Federação.

Sobre este último ponto, Maciel conta a história de uma pequena cidade de Pernambuco, Estado que concedeu incentivo fiscal para a construção de uma usina de energia solar. Vai criar muitos empregos, movimentar a economia da região e, de quebra, fomentar energia limpa. Quer melhor uso para o dinheiro público?

Bem, o único personagem que, tenho certeza, vai ganhar, é a empresa de energia solar. Esta sim, fez contas sobre a viabilidade financeira do empreendimento, e vai embolsar o lucro proporcionado pelo incentivo fiscal. Ah, tem outro personagem que vai ganhar: o governador do Estado, que vai, sorridente e ao som de banda de música e fogos, inaugurar a usina, e ganhar os votos daquela cidade.

Já a população, precisaríamos ter mais dados para concluir alguma coisa. Qual o volume do incentivo? Quais são os outros possíveis investimentos que poderiam gerar empregos na região? Não seria melhor usar o dinheiro para investir em saneamento básico ou melhoria das escolas? Enfim, como todo incentivo fiscal dado no Brasil, faltam estudos que comprovem a sua eficácia. Quanto à externalidade positiva (energia limpa), deveria ser tratado no âmbito federal, dentro de um programa mais amplo de incentivo à energia limpa, e não ser objeto de incentivo fiscal de entes federativos.

Defender incentivo fiscal a essa altura do campeonato, com os Estados literalmente quebrados, só pode ser piada.

Decepção

Quando vi o artigo “Onerar mais não é o caminho”, de crítica à PEC da reforma tributária ora em tramitação no Congresso, pensei: enfim, poderei ler uma crítica consistente ao atual projeto de reforma. Escrita por expoentes como Ives Gandra Martins e Everardo Maciel, seria a primeira crítica de peso ao projeto, oferecendo alternativa ainda melhor.

Que decepção.

O artigo crítica a atual proposta com base em dois pilares: atentaria contra o Pacto Federativo e aumentaria impostos.

Segundo o artigo, a PEC atentaria contra a Federação porque a arrecadação seria centralizada na União, fazendo com que Estados e Municípios deixassem de ter discricionariedade sobre as alíquotas. Bem, é justamente isso que a proposta almeja: acabar com o pesadelo de inúmeras formas diferentes de cobrar impostos. Além disso, se se quer uma Federação de verdade, cada Estado tendo sua própria autonomia para cobrar impostos, então que aprovemos uma PEC que proíba a União de socorrer financeiramente os Estados. Porque é muito bonito falar de Pacto Federativo, desde que, na hora do aperto, os governadores não corram para Brasília com o chapéu na mão.

Quanto ao suposto aumento de impostos (os articulistas espertamente não falam em aumento de carga tributária), fica claro que a preocupação é com a PRÓPRIA carga tributaria. Escritórios de advocacia seriam onerados com a proposta, pois deixariam de pagar apenas o imposto municipal, via de regra mais baixo, para pagar o imposto federal. Ou seja, os doutros especialistas não escondem que estão preocupados com a oneração dos próprios serviços. Muito justo, desde que admitam que o artigo faz parte de um lobby.

O artigo termina com o clássico “sou a favor da reforma, mas não essa que está aí”. No melhor estilo da esquerda, se dizem a favor de alguma reforma tributária, mas se eximem de dizer qual seria. Talvez esta tenha sido a minha maior decepção: li o artigo até o fim procurando a proposta de técnicos tão respeitados, mas só encontrei “isso aí não”. No fundo, defendem o confortável (para eles) status quo.