Um grupo de 6 “notáveis”, sem ligações partidárias, propõe uma série de contribuições para o próximo presidente. O documento, apesar de se pretender apartidário, usa terminologia bem conhecida: “Contribuições para um governo democrático e progressista”. E, para ficar claro do que se trata, o documento foi apresentado a todos os candidatos, “menos para Bolsonaro”. Interessante o conceito de democracia deste grupo, que exclui um dos candidatos do jogo democrático. Mas enfim, não é este o foco do post.
E o que o grupo “democrático e progressista” propõe? Tomando o risco de ter lido somente o resumo do jornal e não o documento inteiro, a única proposta no campo fiscal prevê “gastos acima do teto em 1% do PIB sem aumento da carga tributária”.
O novo arcabouço fiscal é tratado como uma espécie de meteoro, que virá em algum momento no futuro. Mas, “enquanto o novo regime fiscal não vem”, o grupo de “notáveis” sugere que gastar acima do teto não tem problema nenhum.
Li com atenção as propostas, em busca do que seria esse “novo regime fiscal”. Saí de mãos vazias. Não há nenhuma sugestão para retomar o equilíbrio do orçamento. Há sim, sugestões de reformas administrativa e tributária, mas não há metas de resultado fiscal, nem de superávit primário, nem alguma limitação de gastos. É um pouco como prometer fazer regime mas sem nunca subir na balança para medir o progresso.
Há uma contradição insanável nessa proposta: não é possível manter indefinidamente gastos acima do teto sem aumento de carga tributária, a não ser que se queira que a dívida pública aumente explosivamente. Qualquer regime fiscal deverá limitar os gastos ou aumentar a carga tributária, ou ambos, de modo a retomar a produção de superávits primários. Não há mágica. Agora, alguém consegue imaginar programas iniciados durante o período de “licença para gastar” sendo descontinuados depois que o “novo regime fiscal chegar”? Uma proposta desse tipo somente torna mais difícil ainda a solução do problema fiscal brasileiro. Trata-se de uma proposta em linha com a parte “progressista” dessas “contribuições”, e deve soar como música para partidos “progressistas”, como PT e PDT.
Os seis “renomados notáveis” conseguiram um espaço generoso no jornal com suas “contribuições apartidárias”. A mensagem que fica, no entanto, é que não há unanimidade sobre a urgência de se alcançar um novo equilíbrio fiscal, que aponte para uma trajetória de redução da dívida pública. Talvez quando atingirmos o estágio da Argentina, essa unanimidade seja alcançada. Mas aí poderá ser tarde demais.