Confraternização

A coluna de Sonia Racy nos informa que ontem houve um jantar de desagravo ao STF no Figueira Rubayat, restaurante para poucos em São Paulo.

Dias Toffoli e Gilmar Mendes confraternizaram com advogados com interesses em processos que correm no STF, como Dora Cavalcanti e Roberto Podval.

Somente no Brasil isso poderia estar em uma coluna social.

O STF que elege Bolsonaro

Ontem, a trinca Gilmar, Toffoli e Lewandovsky fatiou mais um pouco as delações da Odebrecht contra Lula, tirando de Moro as menções, por exemplo, ao “departamento de operações estruturadas” da empreiteira. A coisa foi tão descarada, que fez renascer a esperança do advogado do presidiário de Curitiba.

Depois não sabem porque Bolsonaro não derrete nas pesquisas.

Mudaram por que?

Não só Dias Toffoli, mas também Gilmar Mendes “refletiram melhor” e agora defendem a execução penal após o julgamento do STJ (3a instância).

De todos os posicionamentos no STF, este é o mais cínico, pela conveniente mudança de posicionamento em um assunto que é, por si, arbitrário.

Celso de Mello, pelo menos, é fiel a um princípio: o trânsito em julgado. Saiu do trânsito em julgado, qualquer outro posicionamento é arbitrário. Por que 3a instância e não 2a? Por que 2a instância e não 1a? A prisão após a 2a instância é tão legítima quanto após a 1a ou a 3a. A diferença está somente no grau de convicção da justiça com relação àquele crime. Como ensina Tofolli, nas duas primeiras estabelecem-se os fatos, e nas duas outras averiguam-se questões de legalidade, se o processo em si não teve nenhuma ilegalidade. Ou seja, a culpa já está estabelecida após a 2a instância, o que o STJ faz é apenas julgar se aquela culpa foi provada de maneira legal. Se não tiver sido, o processo é anulado, mas o culpado não deixa de ter cometido o crime. Por isso, parece razoável colocar o início da execução da pena após condenação em 2a instância, posição desde sempre de Gilmar Mendes e Dias Tofolli.

Por que mudaram? Mudaram porque?

Um voto histórico

Eu seu voto, Gilmar Mendes:

  • Colocou a questão da repercussão geral em clara afronta ao determinado pela presidente da Corte
  • Meteu a boca no PT, para não correr o risco de parecer que deu o HC a Lula por simpatia
  • Usou a situação de presos pobres em detenção provisória para justificar a liberdade de presos ricos condenados em 2a instância
  • Atuou como ombundsman da imprensa, dando lições de como esta deve se comportar
  • Comparou a pressão da imprensa e da opinião pública com o que acontecia na Alemanha nazista
  • Inventou a tese do transitado em julgado na 3a instância, uma típica jabuticaba brasileira

Um voto histórico.

Cheiro de falcatrua

Gilmar Mendes afirmou ontem que o Brasil, a exemplo dos 200 milhões de técnicos de futebol, tem hoje 200 milhões de juízes. Segundo o excelentíssimo, todo mundo virou especialista em HC.

Longe de mim querer substituir a competência técnica dos luminares que ocupam as 11 cátedras do Supremo (em que pese que um deles tomou bomba duas vezes em concurso para juiz, mas quem se apega a esse tipo de detalhe, não é mesmo?).

No entanto, apesar de não ter treinamento técnico para saber o que é um HC, o brasileiro é treinado desde o berço para sacar o que é um jeitinho, um bem-bolado, uma chicana para driblar a lei.

E o cheiro de arranjo que sai do STF é inconfundível para os 200 milhões de doutores em detectar falcatruas. Por mais que esteja revestida das tecnicalidades que os doutos magistrados dominam com maestria.

Proteção de quem, cara-pálida?

“[…] se concede um HC para alguém […] irrita muitas pessoas, mas a gente está protegendo aquele que está irritado, porque o desmando do poder vai atingir também aquelas pessoas que antes torciam para a prisão de A, mas depois vem o B, o C”.

Este é Gilmar Mendes, dizendo que o cidadão comum estará mais protegido se o STF soltar Lula hoje. Excelentíssimo Ministro Gilmar Mendes: B e C são Aécio Neves e Michel Temer, não sou eu, nem qualquer outro cidadão que busca cumprir a lei. Se Sua Excelência quer proteger B ou C, não nos meta em sua equação.

Na verdade, o cidadão honesto fica mais desprotegido quando A, B, C e todo o resto do alfabeto não cumprem pena pelos seus crimes.